Igreja no Iraque

Papa no Iraque: religioso comenta realidade dos cristãos no país

Igreja no Iraque tem cerca de 590 mil católicos, o que equivale a menos de 1% da população

Denise Claro
Da redação

Igreja no Iraque

Católicos no Iraque /Foto: ACN Portugal

O Papa Francisco viaja para o Iraque nesta sexta-feira, 5. Vai ser a primeira vez de um Papa no país. De 38 milhões de habitantes no Iraque, 95% desses são muçulmanos. O país, que faz fronteira com a Síria, Jordânia, Turquia e Irã, tem atualmente cerca de 590 mil católicos, segundo a Santa Sé. O número equivale a menos de 1% da população. 

Por ocasião da visita, o noticias.cancaonova.com preparou uma série de três matérias, trazendo informações sobre o Iraque, o cristianismo no país e a expectativa pela chegada de Francisco. Nesta segunda reportagem, o assunto em destaque é um levantamento da Igreja no país. 

Cristãos no Iraque

A presença cristã na Mesopotâmia remonta às origens do cristianismo. A religião cristã se espalhou pela região no primeiro século a partir da pregação do apóstolo São Tomé e seus discípulos, que se estendeu até a Ásia oriental. O Iraque é uma terra biblicamente e historicamente importante para todos os cristãos. Sua riqueza cultural e religiosa influenciaram de forma decisiva a história.

Hoje, a comunidade cristã no país é dividida entre caldeus, siríacos, armênios, latinos, melquitas, ortodoxos e protestantes. Sua vida foi marcada, desde a chegada do Islã e também após o nascimento do Iraque independente, por perseguições e discriminações.

O assistente eclesiástico da Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre no Brasil (ACN Brasil), Frei Rogério Lima, comenta a realidade da Igreja Católica no país. 

“É uma Igreja pequena em números, mas grande em significado, afinal, o cristianismo está presente no Iraque desde o século I. Quando falamos da Igreja Católica no Iraque, representada também em seus diferentes ritos, estamos falando em apenas 134 sacerdotes e 36 religiosas que heroicamente vivem sua fé neste país onde os cristãos foram, e ainda são, duramente perseguidos.”

Os números mostram que são 19 os bispos católicos no Iraque. O país conta com 20 diáconos permanentes, 36 religiosas, 43 seminaristas, 632 catequistas e 4 missionários leigos.

Restrições 

Estima-se que, nos últimos sete anos, pelo menos dois mil cristãos tenham sido mortos. Mais de 600 mil foram obrigados a deixar suas casas, devido aos conflitos no país. “Ser cristão no Iraque implica em ser uma minoria que tem um grande peso colocado em seus ombros.”, diz o frei.

O religioso lembra das restrições que acabam por diminuir consideravelmente o número de católicos. Na lei do casamento, é ilegal homens cristãos casarem-se com mulheres muçulmanas sem se converterem ao Islã; as mulheres cristãs podem se casar com homens muçulmanos, porém, os filhos devem ser educados como muçulmanos. Pela lei da anti-blasfêmia, um muçulmano que se converte ao cristianismo pode ser processado.

“No entanto, muitas vezes acontece de a própria família — ou jihadistas — assassinar o convertido. Para dar uma ideia do que significa ser cristão no Iraque, imagine o que é ser expulso de sua casa sem poder levar nenhum pertence. Isso aconteceu na noite de 6 de agosto de 2014, mais de 100 mil cristãos foram obrigados a sair de seus lares simplesmente por serem cristãos.”

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O êxodo mais intenso ocorreu após a intervenção militar dos EUA em 2003, devido à insegurança, à violência e aos atentados, e entre 2014 e 2017, com a chegada do autoproclamado Estado Islâmico (ISIS) no norte do país.

Na véspera da segunda Guerra do Golfo, estimava-se que os cristãos no Iraque estavam entre 1 e 1,4 milhão (6% da população). Desde então, sua presença reduziu drasticamente.

A ocupação do Estado Islâmico na Planície de Nínive, o berço histórico do cristianismo mesopotâmico, literalmente esvaziou esta região da presença cristã.

Realidade das Paróquias

Religiosa e jovens em momento de evangelização no Iraque./ Foto: ACN

O Iraque conta hoje com 118 paróquias. Em cada uma acontece um trabalho de consolação daqueles que foram vítimas de perseguição.

“Os sacerdotes também relatam que seus paroquianos vivem o perdão em um grau muito elevado. Estão dispostos a rezarem por aqueles que trouxeram o terror e rezam até mesmo pela conversão dos membros do grupo Estado Islâmico. Uma menina que na época tinha 11 anos, Mariam Waleed, dizia que rezava diariamente para que um dia ‘Deus fosse a luz que guia aqueles que agora estão no grupo Estado Islâmico'”, recorda o frei.

A Igreja no país já realizava um grande trabalho social. Porém, desde os ataques do Estado Islâmico, essa ajuda ganhou um novo impulso. Hospitais, escolas primárias e universidades, distribuição de cestas básicas, remédios e tratamento psicológico são alguns exemplos desse trabalho social.

Ajuda da Igreja no Iraque

“É impressionante ver que uma Igreja tão pequena em números pode realizar um trabalho tão grande de amor ao próximo. A ACN, graças aos seus benfeitores, ajudou em muitas dessas iniciativas.”

A ACN é uma organização internacional, com sede no Vaticano. Coleta contribuições do mundo inteiro e apoia projetos e iniciativas em mais de 140 países. Tem por missão dar assistência à Igreja onde ela é mais carente ou perseguida. 

De 2014 até ao final de 2020, os benfeitores da ACN providenciaram tudo o que estava ao alcance da Fundação Pontifícia para manter a presença cristã no Iraque e, em particular, na Planície de Nínive. Foram desde projetos de reconstrução até alimentos, remédios e educação.

Logo após os ataques do grupo Estado Islâmico, a ACN ajudou de forma emergencial 12.000 famílias de deslocados, que passavam fome e frio.

“Um trabalho muito bonito foi o das religiosas que, quando retornaram para seus conventos parcialmente destruídos, o arrumavam como podiam e abriam esses espaços para receber crianças traumatizadas pela guerra. Elas realizaram, e ainda realizam, um trabalho que recupera a dignidade e ensina o perdão, necessidades essenciais para se construir uma futura geração de paz. É uma realidade que muito ainda precisa ser feito e vários projetos essenciais continuam esperando recursos. Mas sempre contamos que novos benfeitores possam surgir como braços da Divina Providência.”, salienta.

Perseguição

A perseguição aos cristãos ainda acontece por parte das leis impostas aos cristãos e outras minorias no país. Há também o temor, pois ainda existem outros grupos extremistas no Iraque.

“O grupo Estado Islâmico foi derrotado, mas muitos de seus membros ainda continuam em liberdade no país e isso gera um medo de que outro grupo, ou o mesmo grupo, possa surgir novamente.”, enfatiza o religioso.

Espera pelo Papa

Os cristãos do país estão ansiosos pela visita do Papa Francisco. Os diferentes grupos se unem na organização das paróquias e dos locais por onde o Papa passará, com feliz expectativa.

“Quando se imagina que, no meio de uma pandemia como a que vivemos, após um ano inteiro sem viagens do Papa, ele escolhe justamente um país onde os cristãos são minoria e vivem em constante risco? Isso é um grande prestígio, traz muita alegria e esperança aos cristãos.”

Tão importantes quanto a ida do Pontífice são as consequências desta visita para o povo cristão que vive no país. Frei Rogério conclui, a respeito dos frutos que a viagem do Papa pode causar.

“Existe a expectativa de que uma grande mudança para melhor ocorra no Iraque. Os cristãos serão vistos por todos no país. A esperança é que os próprios iraquianos possam descobrir o cristianismo e como ele é um bem para a nação.”

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