Artigo - Doutrina Social

Desemprego e dignidade humana à luz da Doutrina Social

Embora devamos ter sempre presente o sentido mais profundo do trabalho, as causas do desemprego são muitas e variadas

Padre Antônio Aparecido Alves*

De acordo com o IBGE, a taxa de desocupação cresceu 1,7% no primeiro trimestre de 2017 / Foto: Agência Brasil

Comemoramos nesta semana o “Dia Internacional do Trabalho”. No entanto, dados recentes apontam que o número de desempregados no Brasil aumentou consideravelmente, atingindo 14,2 milhões de pessoas.

De acordo com o IBGE, a taxa de desocupação cresceu 1,7% no primeiro trimestre de 2017 e foi de 2,8% em relação ao mesmo período de 2016, sendo esta a maior alta desde o primeiro trimestre de 2012.

Os números impressionam porque por trás deles existem pessoas, que são afrontadas em sua dignidade humana. Como canta Gonzaguinha, “sem o seu trabalho, um homem não tem honra, se morre, se mata”.

Trabalho e Emprego

Com muita facilidade associamos estas duas palavras. No entanto, como fez a Campanha da Fraternidade (CF) de 1999 sobre o tema “Sem trabalho, por que?”, precisamos distinguir uma da outra. O trabalho é entendido na sociedade industrial como uma atividade remunerada por certo número de horas, destinado à produção de bens e serviços e recebe o nome de “emprego”.

Neste sentido, pode-se afirmar que é este tipo de trabalho que está em falta em nosso tempo e aflige a muitas pessoas. No entanto, como assevera o texto-base da CF de 1999, o trabalho pode ser compreendido em um sentido mais profundo que isso, pois designa a capacidade criativa do ser humano, que é capaz de transformar as coisas e dar-lhes um sentido, desde a dona-de-casa que transforma o arroz cru em alimento, à criança que transforma o grafite do lápis em palavras e números em seu caderno.

Eles estão trabalhando, embora em geral se entenda que estas pessoas “não trabalham”, isto é, não tem um “emprego”. Pode-se dizer, então, que o “emprego” pode estar em falta, mas o trabalho, enquanto atividade humana geradora de sentido, jamais se acabará.

A questão do desemprego

O que interessa à nossa reflexão aqui é a questão do emprego, embora devamos ter sempre presente o sentido mais profundo do trabalho, inerente à dignidade da pessoa. As causas do desemprego são muitas e variadas.

Não se podem fazer afirmações simplistas, colocando a culpa na legislação trabalhista, com a falácia de que sua flexibilização geraria mais empregos. Isto foi feito em outros países, que desregulamentaram as relações de trabalho e, no entanto, continuaram com altos índices de desemprego. Não se pode, também, invocar de maneira simplista o crescimento econômico, porque tivemos no Brasil vários anos de crescimento, com recordes de vendas de automóveis e eletrodomésticos de linha branca e, no entanto, chegamos nesta situação de crise.

A CF-1999 apresenta algumas soluções alternativas, como redução da jornada de trabalho sem redução de salários, fim das horas-extras e substituição dos trabalhadores aposentados que ainda ocupam postos nas empresas, entre outras. É necessário salientar que os caminhos para o pleno emprego devem ser buscados em uma atitude de diálogo entre governo, empresas, sindicatos e sociedade civil organizada.

As reformas Trabalhista e da Previdência: gerar empregos?

É necessária uma atitude de discernimento dos Parlamentares, especialmente os que se apresentam como ligados à Igreja Católica, para resistir ao canto da sereia representado pelos projetos de reforma em andamento no Congresso nacional. Para além da orientação dos partidos ou da pressão do Governo, é preciso compromisso com os mais vulneráveis da sociedade.

A CNBB, na Mensagem aos Trabalhadores e Trabalhadoras no dia 01/05, afirma que estes projetos estão dentro da lógica perversa do mercado, “com um ataque sistemático e ostensivo a direitos conquistados” e convida a lutar por Terra, Teto e Trabalho. É preciso ouvir a orientação do Pastores, junto com a voz rouca das ruas, para votar com consciência as reformas que de fato o Brasil necessita, não aquelas que o mercado exige.

Leia também
.:Mensagem da CNBB aos trabalhadores e trabalhadoras do Brasil
.: CNBB, OAB e COFECON emitem nota conjunta sobre reforma da previdência

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*Padre Antonio Aparecido Alves é Mestre em Ciências Sociais com especialização em Doutrina Social da Igreja pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Professor na Faculdade Católica de São José dos Campos e Pároco na Paróquia São Benedito do Alto da Ponte em São José dos Campos (SP). Para conhecer mais sobre Doutrina Social visite o Blog: www.caminhosevidas.com.br

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