Em uma série de discursos na ONU, o observador permanente da Santa Sé, dom Gabriele Caccia, reafirmou a posição do Vaticano sobre o conflito na Ucrânia
Da Redação, com Vatican News
O representante do Vaticano junto às Nações Unidas, o arcebispo Gabriele Caccia, viveu um dia mais que intenso, falando nesta quarta-feira (12) em quatro circunstâncias diferentes.
Quatro discursos foram ditados pela urgência de mostrar também à assembleia da ONU o que está no coração do Papa e da Santa Sé: redescobrir uma serenidade mundial que a guerra na Ucrânia, com a sombra do dedo no detonador do conflito atômico, parece ter acabado, fomentando cenários apocalípticos em vez de pressionar para desarmá-los antes que seja tarde demais.
Silenciar as armas
Diante da 11ª sessão especial de emergência da Assembleia Geral, que tratou da questão da integridade territorial da Ucrânia, o observador permanente da Santa Sé repetiu palavra por palavra o apelo lançado por Francisco em 2 de outubro no Angelus, um convite mais que urgente, dirigido explicitamente aos presidentes dos dois países beligerantes, para silenciar as armas e buscar “condições para iniciar negociações capazes de levar a soluções que não sejam impostas pela força, mas sim acordadas, justas e estáveis”.
Condições, insistia o Papa, “baseadas no respeito ao valor sacrossanto da vida humana, bem como da soberania e da integridade territorial de cada país”. E isso “sem nos deixarmos envolver em perigosas escaladas” de uma guerra marcada novamente como “uma loucura”.
A paz não é o mesmo número de armas
Um discurso, o de dom Caccia, intimamente ligado ao àquele dirigido aos colegas na primeira Comissão da Assembleia Geral, dedicado ao desarmamento e à segurança internacional.
O representante do Vaticano começou recordando o mesmo clima de inquietação de 60 anos atrás, quando o mundo se aproximou do conflito nuclear e quando João XIII na sua Pacem in Terris observou sem rodeios que a verdadeira paz entre as nações não pode se basear “na posse de um número igual de armas, mas somente na confiança mútua”.
Entretanto, apesar do drama atual, o prelado observou que “há sinais de esperança para o desarmamento” ainda hoje, enaltecidos, sobretudo, pela ratificação de seis Estados ao Tratado de Proibição Total de Testes Nucleares (CTBT).
Pandemia e guerras, e a pobreza cresce
De um teor diferente, mas não menos significativo, foram os outros dois discursos do observador permanente: o primeiro dos quais foi dirigido à audiência da segunda Comissão da Assembleia Geral sobre a erradicação da pobreza e do desenvolvimento da agricultura, da segurança alimentar e da nutrição. Aqui o prelado enalteceu um atraso em relação à tabela pré-estabelecida. “Apenas 8 anos após o cumprimento das metas da Agenda 2030 e 5 anos após a conclusão da Terceira Conferência das Nações Unidas para a Erradicação da Pobreza”, observou ele, “a comunidade internacional deve voltar ao caminho certo e redobrar seus esforços para enfrentar os alarmantes índices de pobreza, especialmente nos países menos desenvolvidos”.
A pandemia causou um aumento de 8,3% em 2019 para 9,2% em 2020 na taxa de pobreza, uma “flutuação aparentemente pequena nos dados” que, no entanto, “corresponde,” salientou o prelado, “a uma enorme mudança, ou seja, 77 milhões a mais de pessoas vivendo com menos de US$ 1,90 por dia”, o que significa desnutrição generalizada e uma série de problemas relacionados, daqueles da saúde ao emprego. Daí o reiterado chamado para “projetar políticas que tenham a pessoa humana no centro e garantam o acesso equitativo aos bens essenciais, recursos e oportunidades que são indispensáveis para sustentar a vida e promover o desenvolvimento integral e o bem-estar de cada pessoa”.
Indígenas, o direito de contar
Finalmente, na terceira Comissão da Assembleia Geral, que se concentrou nos “Direitos dos Povos Indígenas”, dom Caccia estigmatizou como eles são “muitas vezes negligenciados, se não ignorados”, uma situação que tem repercussões para essas populações, vítimas do impacto da mudança climática e da degradação ambiental, assim como, denunciou o observador do Vaticano, “de políticas gananciosas e míopes e de práticas ilegais que podem levar à expropriação de territórios e recursos”.
Em vez disso, é necessário reconhecer os povos indígenas como detentores de direitos “envolvendo-os, quando apropriado, nos processos de tomada de decisão” dentro dos órgãos onde as políticas que os afetam são decididas.