Artigo - Doutrina Social

Especialista destaca dignidade do homem como filho de Deus

Mestre em Doutrina Social destaca dignidade essencial do ser humano e alerta para desumanização da sociedade 

Pe. Antonio Aparecido Alves*

Dignidade Humana – Filhas e filhos de Deus!

A Doutrina Social da Igreja tem um acento personalista, que se fundamenta no
princípio da dignidade inviolável de cada pessoa, ao qual o Compêndio de Doutrina
Social da Igreja dedica todo o III capítulo.

A dignidade humana é uma verdade que não está unicamente sob o domínio dos cristãos, pois também fora dos círculos de fé ela é reconhecida e ensinada. O filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) escreveu: “Age do jeito que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como um fim e não como um meio”. O fundamento da dignidade humana, para o filósofo alemão, está na autonomia que faz da pessoa um legislador universal.

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Para nós, cristãos, essa dignidade não é somente uma questão filosófica, mas também teológica, pois nas duas narrações bíblicas da criação ela aparece relacionada ao Criador. Na primeira (Gn 1, 1-2,4a) o ser humano, homem e mulher, está no vértice da criação, tendo acima de si somente o Senhor. Na segunda (Gn 2,4b-24) ele está no centro e é colocado como salvaguarda de tudo o que foi criado.

Pode-se dizer, assim, que a Bíblia democratiza a imagem de Deus, que no Oriente Antigo era prerrogativa de imperadores, reis e faraós, cultuados como imagens ou encarnação da divindade¹. Estes dois textos bíblicos ensinam que todas pessoas são imagem (tselem) e semelhança (demût) de Deus e daí a sua eminente dignidade.

Dignidade essencial

O termo forte nestas duas narrações é “imagem” (tselem). Em geral compreendemos isto como uma representação fora de nós, para a qual se dirige o nosso conhecimento. Por exemplo, quando se olha a si mesmo no espelho, vai-se do sujeito que enxerga para o objeto que é visto (imagem).

No entanto, a expressão bíblica tselem na mentalidade oriental significa que se faz o inverso, isto é, vai-se do objeto para o sujeito². Quer dizer, o que o autor sagrado evidencia é que não é o ser humano que olha para Deus e se reconhece sua imagem, mas é Ele quem o olha e a reconhece nele.

Na encíclica Centesimus Annus, comemorativa do centenário da Rerum Novarum, o então Papa João Paulo II acentua que o ser humano é dotado desta dignidade essencial que lhe é conferida pelo Criador, mas está fortemente condicionado pela estrutura social em que vive, pela educação que recebe e pelo ambiente, que podem facilitar ou serem um obstáculo ao pleno desabrochar dessa sua dignidade.

Desta verdade decorre o compromisso social cristão, que visa derrubar as estruturas sociais pecaminosas, para que todas as pessoas sejam respeitadas em sua inviolável dignidade (CA 38).

Drama dos imigrantes

Infelizmente vemos hoje essa dignidade sendo desprezada quando centenas de imigrantes, que fogem dos horrores da guerra e da fome, morrem afogados ao atravessar o mar rumo a uma nova oportunidade de vida, ou quando são barrados e impedidos de entrarem na Europa.

É lamentável ainda que, em pleno século XXI, os Estados Unidos construam um muro para separá-los do México ou endureçam as leis americanas que se referem a imigrantes. É triste, também, ver rostos de crianças e idosos desfigurados pela miséria, convivendo ao lado de ilhas de opulência e de fartura, ou ainda pessoas serem humilhadas por causa da cor da pele, do seu lugar de origem, de sua condição social ou trabalho que exercem.

Partindo deste princípio da dignidade humana, pode-se afirmar que o cristianismo será sinal de esperança para a humanidade, na medida em que sua ação contribuir para que as estruturas da sociedade passem de “menos humanas” para “mais humanas”, favorecendo o desenvolvimento do ser humano em todos os sentidos, libertando-o de todas as estruturas e condicionamentos sociais e econômicos que maculam sua eminente dignidade (Populorum Progressio 20-21).

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¹ KRAUS, Heinrich; KÜCHLER, Max. As Origens: Um estudo de Gênesis 1-11. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 44.

² TILLARD, Jean Marie R. A Teologia subjacente à Constituição Gaudium et Spes: A Igreja e os valores terrenos. In: BARAÚNA, Guilherme. A Igreja no Mundo de Hoje. Petrópolis: Editora Vozes, 1967, p. 215-252.

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padre-toninho-coluna2*Padre Antonio Aparecido Alves é Mestre em Ciências Sociais com especialização em Doutrina Social da Igreja pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Professor na Faculdade Católica de São José dos Campos e Pároco na Paróquia São Benedito do Alto da Ponte em São José dos Campos (SP). Para conhecer mais sobre Doutrina Social visite o Blog: www.caminhosevidas.com.br

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