Dom Hanna Jallouf acredita que os conflitos não são sinal do retorno, após apenas três meses, da guerra civil na Síria
Da redação, com Vatican News

Dom Hanna Jallouf/ Foto: Anadolu via Reuters
O vigário apostólico de Aleppo, Dom Hanna Jallouf, concedeu uma entrevista à mídia do Vaticano sobre os confrontos armados desencadeados na Síria desde quinta-feira passada, 6. O bispo conta que, de acordo com os fiéis e autoridades governamentais, a informação é de que milicianos leais ao presidente deposto Bashar al-Assad tentaram uma insurreição armada com o objetivo de derrubar o regime atual. “Uma iniciativa que foi duramente reprimida pelas forças pró-governo”, indica.
Segundo estas mesmas fontes, Dom Jallouf revela que a iniciativa foi planejada nos dias anteriores em uma reunião entre ex-funcionários alauítas do governo de Assad, a filial síria do Hezbollah e milícias xiitas pró-iranianas. Os confrontos foram limitados à faixa costeira do Mediterrâneo, que começou em Jableh e se estendeu ao longo da província de Latakia, até os limites da cidade de Homs.
“Durante o primeiro ataque, cerca de 20 soldados do novo governo teriam sido mortos, e outros tantos em um segundo ataque em um posto de controle comandado pelo governo. Isso foi seguido por uma reação muito dura das forças do governo que resultou em centenas de mortes”, descreve. O bispo salienta que infelizmente alguns cristãos também foram mortos: “acidentalmente, não porque são cristãos”.
Esclarecimentos
Os conflitos, opina o religioso, não são sinal do retorno, após apenas três meses, da guerra civil na Síria. Ele afirma que são episódios locais que não se espalharam para o resto do país. Em Aleppo e Damasco, o bispo comenta que a situação está “completamente calma”.
Dom Jallouf recorda que quando há uma mudança de regime tão repentina como a de 8 de dezembro – “e em um país dilacerado por anos de guerra civil” -, para que a situação política, social e militar se estabilize, é preciso haver um período de tempo, mesmo que curto, em que fortes tensões podem surgir.
Depois, o vigário apostólico de Aleppo frisa que “forças do governo”, não são um exército estruturado, mas grupos armados liderados pelo Hayat Tahir al Sham. “Como não respondem a um único comando, é possível que alguns desses grupos ajam com violência excessiva contra os insurgentes”, observa.
Pacificação nacional
Dom Jallouf destaca que o presidente pro tempore al-Sharaa disse que a resistência hostil dos nostálgicos do antigo regime era de se esperar e deve ser fortemente rejeitada. O governante também continua ressaltando que não há outro caminho para a Síria a não ser o da pacificação nacional, por meio da coexistência entre os vários grupos étnicos e credos religiosos.
Fronteira entre a Síria e Israel
Israel continua a ocupar territórios sírios além da antiga fronteira de Golã e, aparentemente, sem que isso tenha o caráter de temporariedade, conta o bispo. “Israel justifica as últimas ações militares como defesa e apoio às populações drusas. Houve formas de violência contra os drusos por milícias islâmicas autônomas em Suwayda e Jaramana, um subúrbio da capital, que o governo de Damasco não conseguiu impedir. Mas ainda não se sabe quais são as reais intenções de Israel”, aponta.
Dom Jallouf também frisa que não estão claras as verdadeiras intenções dos outros “atores que historicamente desempenham um papel nesse tabuleiro de xadrez”: Rússia, EUA e Turquia.
“Confiemos que não haverá mais interesses estrangeiros fomentando divisões internas: a Síria precisa ser unida novamente e, para ser unida, precisa ser independente”, destaca.
Papel dos cristãos
Aos cristãos, o bispo pede que mantenham a fé de que todas as minorias, sejam elas étnicas ou religiosas, serão respeitadas. “Agora também queremos ver ações concretas nesse sentido por parte do novo governo. Pelo contrário, não queremos mais ser considerados uma minoria, mas sim participantes com direitos e deveres iguais na nova Síria”, opina.
Juntamente com outros bispos de denominações cristãs, Dom Jallouf revela ter participado do congresso promovido para a elaboração da nova constituição. Segundo ele, a partir deste evento foram formuladas propostas em termos de paz, unidade, independência e multirreligiosidade. Propostas que foram verbalizadas e aceitas.
“Esperamos que a comunidade internacional também possa dar sua contribuição para a construção da paz na Síria”, deseja.