Vice-presidente do Serviço Pastoral dos Migrantes recorda mensagem do Papa para o Dia Mundial do Migrante e Refugiado, celebrado neste domingo, 26
Julia Beck
Da redação
“O apelo do Papa Francisco para o Dia Mundial do Migrante e Refugiado nos remete à sua insistência por uma ‘Igreja em saída’”. É o que afirma o missionário scalabriniano e vice-presidente do Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM), padre Alfredo J. Gonçalves.
Diante da proximidade do Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, o sacerdote recordou a mensagem divulgada pelo Papa Francisco para a data. O dia é celebrado no último domingo de setembro. Este ano ele será no dia 26.
A mensagem do Pontífice tem como tema: “Rumo a um nós cada vez maior”. O vice-presidente do SPM aponta que na medida que os migrantes e refugiados se movem, movem também as autoridades, a sociedade civil e a própria Igreja.
O simples fato de migrar por causa da fome, ou de fugir devido à violência, de acordo com padre Alfredo, questiona tanto o lugar de origem quanto o lugar de destino.
Questionamentos
Algumas perguntas são levantadas pelo sacerdote: “Por que determinados países não conseguem oferecer uma cidadania justa e digna a seus próprios cidadãos? E por que outros países se recusam a receber quem busca um futuro melhor e mais promissor?”.
Padre Alfredo continua o questionamento: “Por que tantos seres humanos se transformam em verdadeiros apátridas, ou em trabalhadores excluídos do mercado, ‘descartáveis’ para usar a expressão do Documento de Aparecida, tantas vezes retomada pelo Santo Padre?”.
Essas e outras perguntas interpelam a todos, ressalta o missionário scalabriniano. Para o presbítero, ao levar em conta as exigências da Boa Nova de Jesus, é possível perceber que elas levam homens e mulheres a saírem de si mesmos.
Acolher, proteger, promover e integrar
Sair da exclusividade do núcleo familiar, sair do comodismo da sacristia, sair de certos modelos inócuos e ineficazes – e ‘avançar para águas mais profundas’, são exortações do Evangelho, frisa o sacerdote.
Segundo vice-presidente do SPM, é preciso avançar para as ruas, para os bairros mais pobres e distantes, para os porões e as periferias das cidades. “Mas avançar sobretudo em direção àqueles que erram sem pátria pelas estradas do êxodo e do exílio”.
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Convém ter presente os quatro verbos do Papa, indica padre Alfredo. São eles: acolher, proteger, promover e integrar. “Ao procurar concretizá-los, caminhamos de fato ‘rumo a um nós cada vez maior’”, opina.
Fratelli Tutti
A Fratelli Tutti é citada no início da mensagem do Papa para o Dia Mundial do Migrante e Refugiado. O missionário scalabriniano afirma que o documento, como diz o próprio título, recorda que todos são irmãos e irmãs, filhos e filhas de Deus.
À luz desse princípio bíblico-teológico, o presbítero questiona: “Como explicar que hoje, de acordo com os dados da ONU, mais de 250 milhões de pessoas habitam fora do país em que nasceram? E que ao redor de 750 milhões se movimentam no interior da própria nação? Mais grave ainda, como explicar que cerca de 80 milhões de pessoas vivem atualmente na condição de refugiados?”.
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Refugiado, sublinha padre Alfredo, é aquele que não pode voltar atrás, sob pena de perseguição, prisão ou morte. Segundo ele, milhares vivem em “campos de refugiados”.
“As nações de maior número de refugiados são por ordem de quantidade: Síria (acima de 6 milhões fora do país), Venezuela (mais de 5 milhões), Sudão do Sul (quase 3 milhões), Mianmar (cerca de 1,5 milhão) e agora Afeganistão”, frisa.
Globalização da indiferença
Ao lembrar as palavras de Francisco, padre Alfredo alerta que esta “economia que exclui, descarta e mata” conduz àquilo que se poderia chamar de “globalização da indiferença”.
Ainda segundo o Santo Padre, recorda o vice-presidente do SPM, é grande o passo para uma “cultura do encontro, do diálogo e da solidariedade”. De acordo com o missionário, o que prevalece é o preconceito, a discriminação e a xenofobia.
“Muros em lugar de pontes. Discórdias, tensões e conflitos, por um lado, pobreza, miséria e fome, por outro, tendem a desenraizar milhões de pessoas. Isso sem falar dos novos ‘refugiados climáticos’”, ressalta.
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Daí a necessidade de estender as mãos, descruzar os braços e procurar abrir o coração e a porta ao estrangeiro, indica o sacerdote.
Para o missionário scalabriniano, acolher o diferente pavimenta o caminho para o Transcendente; receber o outro abre o horizonte.
Olhar para a mesma direção
Ainda em sua mensagem, Francisco indica que é preciso um horizonte para um caminho comum. Padre Alfredo opina que o bem-estar da pessoa e da sociedade deve ser o objetivo não apenas da economia e das políticas públicas, mas também a meta de quem diz se guiar pela Palavra de Deus.
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O vice-presidente do SPM explica que manter um horizonte comum não é falar e fazer a mesma coisa, mas é justamente a diversidade. “As etnias, culturas e valores distintos tornam os encontros mais profundos e brilhantes. É a mesmice e a rotina que apodrece e mata o entusiasmo, não a presença e a novidade do outro”, reflete.
Reconciliação: arma contra a divisão
De acordo com o Santo Padre, a reconciliação deve ser uma arma contra a divisão da humanidade. Padre Alfredo afirma que a reconciliação pressupõe o perdão, a misericórdia e a oportunidade de recomeçar.
“Deus é tão frágil e ao mesmo tempo tão forte, porque sua única arma é o amor. No alto da cruz, em meio às dores mais atrozes, pediu ao Pai o perdão para aqueles que barbaramente o torturavam. A vingança de Deus, diante da violência gratuita dos homens, consiste no amor total”, relata.
Deste modo, o sacerdote lembra que a cruz, antigo instrumento de tortura e morte reservada aos piores malfeitores, converteu-se em símbolo “do caminho, da verdade e da vida”.
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Igreja mais inclusiva
Um apelo do Papa é por uma Igreja mais inclusiva e católicos capazes de viver a comunhão na diversidade.
A falta de conhecimento sobre os migrantes (ou o conhecimento falso e distorcido) cria uma série de mal-entendidos, sublinha o vice-presidente do SPM. Disso, o presbítero destaca que decorre a necessidade de buscar informações corretas a respeito dos migrantes e refugiados.
“Veremos então que aqueles que batem à porta, em lugar de um perigo, convertem-se em uma oportunidade. Oportunidade de encontro, de comunhão, de partilha e de enriquecimento recíproco”. Uma vez mais, o missionário scalabriniano reforça que a diversidade é fonte de beleza e de crescimento”.
O Bem-aventurado João Batista Scalabrini, considerado “pai e apóstolo dos migrantes” foi lembrado por padre Alfredo. Ele dizia que a migração pode ajudar a fertilizar culturas e civilizações. “Conclui-se que os migrantes podem ser não apenas vítimas da concentração de renda e da exclusão social, mas sujeitos ativos de caminhos alternativos à injustiça e às assimetrias sociais da economia globalizada”, conclui.