Pontífice falou com diretor de um telejornal italiano e afirmou que estará presente na Conferência para o Clima, além de abordar outros temas
Da Redação, com Vatican News
O Papa Francisco afirmou que participará da 28ª Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP 28), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, que acontece entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro. A declaração foi feita durante uma entrevista ao diretor do telejornal italiano Tg1, Gianmarco Chiocci, transmitida nesta quarta-feira, 1º, pela emissora de televisão RAI.
“Eu irei para Dubai. Acho que irei de 1º a 3 de dezembro. Ficarei três dias lá”, confirmou o Pontífice. Ainda falando deste tema, ele recordou como se originou a Carta Encíclica Laudato si’, publicada em 2015, antes da COP 21 em Paris. “O encontro de Paris foi o mais bonito de todos. Depois de Paris, todo mundo andou para trás e é preciso coragem para avançar nisso”, indicou o Santo Padre.
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Guerra na Terra Santa
Ele também falou sobre outros assuntos na entrevista. Em relação ao conflito entre Israel e o grupo radical Hamas, o Santo Padre reiterou que “toda guerra é uma derrota”. Ele citou que “um tapa provoca o outro, um com força e o outro com mais força ainda, e assim por diante”, refletindo sobre as reações dos dois lados envolvidos, e pontuou que tratam-se de dois povos que deveriam viver juntos. “Dois povos, dois Estados. O acordo de Oslo: dois Estados bem delimitados e Jerusalém com um status especial”, resumiu.
Recordando a oração pela paz na sexta-feira, 27 de outubro, Francisco reforçou que o mundo está passando por um momento tenebroso, em que não se consegue refletir com clareza. Ele lembrou que, desde o final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, as guerras não pararam, apontando que “o maior problema ainda são as indústrias de armamentos”.
O Papa disse ainda seguir acompanhando de perto o desenrolar do conflito, recebendo diariamente notícias dos religiosos em Gaza por telefone. “O vice-pároco egípcio, padre Yussuf, eu ligo para ele todos os dias”, comentou, relatando ainda que, na paróquia do religioso, estão abrigadas 563 pessoas, cristãs e muçulmanas, e entre elas crianças doentes que são assistidas pelas irmãs de Madre Teresa.
“O mundo está em guerra”
Com relação a uma possível escalada da guerra, o Pontífice admitiu que esta possibilidade existe, mas diante do que seria “o fim de muitas coisas e de muitas vidas”, ele afirmou acreditar que “a sabedoria humana pode impedir essas coisas”. Ele também alertou para que os homens não se acostumem com a presença da guerra no mundo, e recordou o conflito na Ucrânia e em outros lugares. “O mundo está em guerra, mas a indústria de armas está por trás disso”, voltou a dizer.
Questionado sobre a reação ucraniana às iniciativas de paz da Santa Sé, o Papa falou que pensa no povo ucraniano, “um povo mártir”, e que “não devemos julgá-lo hoje”. “Foi um povo que sofreu muito e, agora, seja o que for que os faça reviver isso, eu os entendo. Recebi o presidente Zelensky, eu entendo, mas precisamos de paz. Parem! Parem um pouco e busquem um acordo de paz, os acordos são a verdadeira solução para isso. Para os dois”, expressou.
A temática da guerra voltou a aparecer quando Francisco foi perguntado sobre o momento mais difícil do seu pontificado. Ele respondeu que foi lidar com a guerra na Síria: “Eu não sabia o que fazer, era muito difícil. Eu não estava acostumado com algo assim e também com o medo de cometer um erro e causar danos. Foi difícil. Houve também momentos fáceis e outros não tão fáceis. Mas sempre o Senhor me ajudou a resolver, ou pelo menos a ser paciente, a esperar para resolver”.
Quanto aos seus medos, o Papa respondeu que surgem alguns pequenos temores, que uma coisa ou outra aconteça. Nos dias de hoje, ele expressou que a guerra na Terra Santa o assusta, como essa história terminará. “Mas isso se resolve diante do Senhor. Não que os temores desapareçam. Mas eles permanecem de uma forma humana, digamos assim. É bom ter medos”, partilhou.
Papel da mulher na Igreja
Abordando o papel da mulher na Igreja, o Pontífice listou diversos cargos na Santa Sé ocupados por mulheres, e ressaltou a importância delas. Ele manifestou que “as mulheres entendem coisas que nós não entendemos, as mulheres têm um talento especial para a situação, e isso é necessário, acho que elas devem ser incluídas no trabalho normal da Igreja”.
Em relação à ordenação de mulheres, o Santo Padre apontou um “problema teológico”, e não meramente administrativo. “Do ponto de vista teológico e ministerial, são coisas diferentes: o princípio petrino, que é o da jurisdição, e o princípio mariano, que é o mais importante, porque a Igreja é mulher, a Igreja é esposa, a Igreja não é masculina, é mulher. É preciso uma teologia para entender isso, e o poder da Igreja feminina e das mulheres na Igreja é mais forte e mais importante do que o dos ministros masculinos. Maria é mais importante do que Pedro, porque a Igreja é mulher. Mas se quisermos reduzir isso ao funcionalismo, perderemos”, declarou.
Resultado do Sínodo e luta contra abusos na Igreja
Outro assunto abordado na entrevista foi o Sínodo sobre a Sinodalidade, encerrado no domingo, 29 de outubro. Na visão de Francisco, o resultado dos dias de trabalho foi positivo: “Tudo foi discutido com total liberdade. E isso é uma coisa bonita e conseguimos fazer um documento final, que deve ser estudado nesta segunda parte para a próxima sessão em outubro”.
Perguntado sobre os casos de abuso na Igreja, o Santo Padre disse que deu continuidade ao trabalho de Bento XVI. “Foi feita uma grande limpeza. Todos eram casos de abuso e até mesmo alguns membros da Cúria foram mandados embora. O Papa Ratzinger foi corajoso nisso”, sublinhou.
O Pontífice também alertou que este problema continua, e que não deve ser tolerado. Independentemente do tipo de abuso, ele “é contrário ao Evangelho, o Evangelho é o serviço, não o abuso, e vemos muitos episcopados que fizeram um bom trabalho para estudar o abuso sexual, mas também outros”, declarou, admitindo que “ainda há muito a ser feito”.
Ao final da entrevista, foi perguntado a Francisco se ele já perdeu a fé. Ele respondeu que não no sentido de perdê-la, mas de “não a sentir e andar em caminhos escuros”. Por fim, em clima de descontração, o entrevistador questionou quem o Papa prefere entre os dois grandes jogadores argentinos de futebol, Diego Maradona e Lionel Messi. “Vou dizer um terceiro: Pelé”, respondeu o Santo Padre, citando o atleta brasileiro.