Análise política

Novo presidente precisará buscar a unificação do país, diz cientista político

Segregação do país e economia são apontadas pelo cientista político Felipe Rodrigues como os principais desafios do novo presidente do Brasil

Julia Beck,
Da redação

Jair Bolsonaro eleito presidente do Brasil / Foto: REUTERS/Adriano Machado

“É preciso, em primeiro lugar, mostrar que o discurso radicalizado de campanha ficou para trás e assumir postura de estadista, buscando a unificação do país”. A frase do cientista político, Felipe Rodrigues, faz referência à nova gestão presidencial do país, que será iniciada em 2019, e terá como chefe do executivo o presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro.

Para Felipe, o principal desafio da nova gestão será a economia. Segundo o cientista político, a economia já dá sinais de recuperação, mas ainda precisa de muitos ajustes, para que seja sustentável e possa gerar empregos. “Algumas medidas que devem ocupar espaço nas pautas prioritárias e emergenciais são as reformas tributária e da previdência e a diminuição de privilégios corporativistas, a fim de desafogar as contas públicas”, observou.

“O país ainda tem quase 13 milhões de desempregados, e um dos grandes desafios é a geração de empregos e o retorno de investimentos do setor produtivo na economia”, frisou Felipe. A segurança pública também foi apontada pelo cientista político como um desafio e uma das bandeiras de campanha de Bolsonaro. “O presidente, provavelmente, deve investir em pautas desse tema também no início, como a redução da maioridade penal e a revisão do Estatuto do Desarmamento, duas de suas principais plataformas”, comentou.

Governabilidade

O partido de Bolsonaro foi o que mais cresceu na Câmara ao final das Eleições 2018. O PSL é a segunda maior legenda, com 52 deputados e quatro senadores. Segundo o cientista político, o partido ainda pode crescer por conta da possível migração de candidatos eleitos por partidos que não atingiram a cláusula de barreira.

“De início, Bolsonaro deve ter uma base considerável na Câmara, com a adesão do chamado ‘centrão’, que deve apoiá-lo no começo da legislatura com 142 deputados. Sua base inicial deve comportar ainda algumas bancadas, como a ruralista, a evangélica e a da segurança pública, além de agregar alguns partidos que foram oposição ao governo PT. É importante observar que o Congresso é o mais fragmentado desde a redemocratização, com 30 partidos políticos representados, o que dificulta a negociação e a agregação da base, mas o perfil predominante é conservador, mais próximo de Bolsonaro”, frisou Felipe.

Cientista político Felipe Rodrigues / Foto: Arquivo Pessoal

No Senado, as duas maiores bancadas são do MDB e do PSDB. “É provável que o apoio dessas legendas a Bolsonaro seja temático e dependa também no espaço que o presidente abrir nos cargos do governo federal para os partidos. No entanto, sua base pode se dissolver com a ausência de sinais claros na economia e em medidas do governo federal. Por isso, Bolsonaro deverá tentar passar as medidas que considera mais importantes no início do mandato, porque a “lua de mel” entre ele e sua base pode não durar muito, uma vez que a oposição será forte e o país precisará de sinais claros logo no início”, observou o cientista político, que afirmou acreditar que Bolsonaro deve conseguir a eleição de um presidente da Câmara aliado aos seus propósitos.

Felipe apontou que a preocupação do presidente eleito deve ser com o médio e longo prazos, porque sua base é volátil e não está comprovadamente 100% fechada com sua agenda, que poderá ser impopular e despertar a mobilização de movimentos sociais. “O modus operandi da política em Brasília se baseia em troca de favores, liberação de emendas para estados e municípios, cargos em ministérios, e Bolsonaro já disse ser contrário às práticas. É preciso observar como o governo se comportará nesse aspecto, se a negativa do presidente se manterá e se isso pode comprometer a governabilidade”, salientou.

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O Brasil e a Direita

O cientista político reafirmou a necessidade de conceituação de direita e esquerda, e frisou que as denotações dependem do conceito de liberalismo e se ele se refere tanto à economia quanto à questão social. Segundo Felipe, nos Estados Unidos, o liberalismo é diferente do significado atribuído no Brasil. “Lá, ser liberal significa relativizar questões morais, como defender o aborto, a legalização das drogas, as liberdades individuais. Aqui, ser liberal significa defender menor presença do Estado na economia, menos impostos, mais liberdade tarifária”, explicou.

“O significado de direita e esquerda varia ao longo da história, mas, hoje, podemos dizer que considera-se um governo de direita aquele que tem uma agenda conservadora e mais liberal (na economia). Um governo de direita se preocupa mais com questões morais e com o papel do Estado na economia e na política. Já um governo de esquerda se preocupa mais com a proteção social, considera que o Estado deve ser maior, para proteger mais cidadãos e que os gastos públicos devem ser incentivados, porque geram desenvolvimento”, conceituou Felipe.

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O papel do cidadão

“A participação dos brasileiros não se encerra com o voto. Na verdade, esse é o passo inicial”, apontou o cientista político. Para Felipe, após as eleições e a posse, é primordial que os cidadãos participem efetivamente, cobrando, fiscalizando, acompanhando os candidatos eleitos, verificando se fazem um bom trabalho, se cumprem o que prometeram, se se envolveram em corrupção, se aplicam bem os recursos públicos e se promovem o bem comum.

Para Felipe, o amadurecimento da democracia é conquistado quando os cidadãos tomam mais consciência de seu papel enquanto seres ativos do processo político. “Para isso, existem diversos meios, como as redes sociais e os canais de comunicação dos políticos eleitos”, exemplificou.

As eleições de 2018 também tiveram fatores positivos, como apontou o cientista político. A desejada renovação da Câmara dos Deputados, que foi a maior desde a redemocratização do país pode ser considerada positiva, dependendo de como os parlamentares se comportarão durante a legislatura, e a discussão da política no dia a dia, por parte dos brasileiros, também de ser vista como um ponto positivo. “As pessoas passaram a se interessar mais e buscarem identificação com os candidatos”, caracterizou.

O cientista político também identificou a perda da relevância do poder econômico e oligárquico do parlamento federal como um ponto positivo e o uso das redes sociais quando usadas como canais de informação e ferramenta de diálogo com os cidadãos. “As redes também foram importantes para que candidatos com poucos recursos pudessem apresentar suas plataformas a uma grande quantidade de pessoas”, identificou. A maior mobilização feminina e as manifestações organizadas em favor de interesses coletivos, também foram apontadas por Felipe como boas consequências das eleições.

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