Espiritualidade nos quartéis

Conheça a atuação da Igreja Católica junto ao Exército Brasileiro

Neste Dia do Exército, que completa 375 anos, descubra como padres militares prestam assistência religiosa aos seus irmãos na força em todo o Brasil

Gabriel Fontana, com colaboração de Julia Beck
Da Redação

Militares do Exército Brasileiro em celebração da Páscoa dos Militares em Brasília (DF) / Foto: Ordinariado Militar do Brasil

Nesta quarta-feira, 19, é celebrado o dia do Exército Brasileiro. Nesta data, em 1648, aconteceu a Batalha de Guararapes, entre as tropas portuguesas (em sua maioria compostas por brasileiros) e os invasores holandeses, que foram expulsos depois. Aquela foi a base para o surgimento do Exército do país, que completa 375 anos.

Braço forte, mão amiga, o Exército Brasileiro tem como missão contribuir para a garantia da soberania nacional, dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, protegendo os interesses nacionais e cooperando com o desenvolvimento da nação e o bem-estar social. Para isso, entre as Forças Armadas, ele é o responsável por preparar a Força Terrestre, mantendo-a em permanente estado de prontidão.

Por ocasião desta data, a redação do noticias.cancaonova.com traz a história do serviço religioso prestado no âmbito do Exército aos militares e como este trabalho evangelizador se organiza por todo o Brasil.

“A paz queremos com fervor”

No contexto do Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI, na Constituição Apostólica Gaudium et Spes, reconhece e exorta: “aqueles que se dedicam ao serviço da pátria no exército, considerem-se servidores da segurança e da liberdade dos povos; na medida em que se desempenham como convém desta tarefa, contribuem verdadeiramente para o estabelecimento da paz”.

O refrão da “Canção do Exército”, composta pelo tenente coronel Alberto Augusto Martins, expressa: “a paz queremos com fervor”. Buscar manter a paz é um trabalho árduo. As tropas brasileiras contaram, quase sempre, com assistência religiosa. No Império, funcionava a Repartição Eclesiástica do Exército, que teve seus serviços paralisados por algumas décadas com a proclamação da República. Essa assistência viria a ser restabelecida, no entanto, quando, em meio à 2ª Guerra Mundial, o Brasil organizou a Força Expedicionária Brasileira (FEB) para combater na Europa.

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Depois da guerra, foi criado o Serviço de Assistência Religiosa nas Forças Armadas, em 1946, pelo Decreto-lei nº 8.921. Cada uma das Forças tem sua própria organização, e no caso do Exército, há o Serviço de Assistência Religiosa do Exército (SAREx). Ele é responsável por prestar assistência religiosa, dentro do espírito de liberdade religiosa das leis e das tradições do Brasil.

Histórico

Após o surgimento do Serviço de Assistência Religiosa no Brasil, o Papa Pio XII erigiu (termo canônico que tem sentido de instituir) o Vicariato Castrense do Brasil em 1950. Em outras palavras, o Pontífice criou uma estrutura diocesana para prestar assistência aos militares. Dessa forma, os serviços como o SAREx poderiam se valer de uma organização que os ligasse à Santa Sé.

A assistência religiosa aos militares católicos é prevista no Concílio Vaticano II, no Decreto Christus Dominus, de 1965: “a assistência espiritual aos militares exige cuidados especiais. Por isso, deve-se estabelecer um vigário castrense [termo que significa “militar”] para toda a nação. Vigário e demais capelães cooperem com os bispos diocesanos na árdua tarefa a que se dedicam. Os bispos devem ceder ao vigário castrense um número suficiente de sacerdotes aptos ao exercício dessas funções e favorecer as iniciativas em favor do bem espiritual dos militares”.

Anos depois, em 1986, por força da Constituição Apostólica Spirituali Militum Curae, passou a ser Ordinariado Militar, semelhante a uma arquidiocese, governada pelo Ordinário, equivalente a um arcebispo. Em 1989, foi celebrado um acordo entre a Santa Sé e o Brasil, dando nova estrutura ao Ordinariado, que foi homologada pelo Decreto Cum Apostolicam Sedem, de 1990, da Congregação dos Bispos, instituindo seu estatuto.

A Arquidiocese Militar

Todo esse processo levou ao surgimento de uma organização que é semelhante a uma diocese, mas com características especiais. O padre Uyrajá Lucas Mota Diniz, capelão da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), localizada em Resende (RJ), afirma que “o Ordinariado Militar do Brasil é uma circunscrição eclesiástica ‘especial’ porque ‘os Capelães militares regem-se por leis especiais’”. Assim, o Exército consegue valer-se de militares que realmente podem prestar assistência religiosa católica aos seus irmãos na força, uma vez que eles estão ligados à Igreja Católica por meio de uma estrutura própria e à qual também respondem.

Atualmente, o Arcebispo Ordinário Militar do Brasil é Dom Marcony Vinícius Ferreira, nomeado pelo Papa Francisco em 2022 . “O Ordinário Militar deve ser brasileiro nato, tem a dignidade de Arcebispo e está vinculado administrativamente ao Estado-Maior das Forças Armadas, sendo nomeado pela Santa Sé, após consulta ao Governo brasileiro”, explica o Ordinariado Militar do Brasil em seu site. A sede do Ordinariado Militar fica na Catedral Militar Rainha da Paz, em Brasília (DF), e participa do Conselho episcopal Regional Centro-Oeste da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Dom Marcony Vinícius, arcebispo militar (à esquerda), e Dom Giambattista Diquattro, Núncio Apostólico do Brasil (à direita), durante ofertório na celebração da Páscoa dos Militares em Brasília (DF) / Foto: Ordinariado Militar do Brasil

O ministério do capelão

Capelães militares como o padre Lucas são ministros encarregados de prestar assistência religiosa aos integrantes das Forças Armadas e seus familiares nas diversas situações da vida. “Sempre rezo pelos meus filhos e filhas militares, espalhados sobre o imenso território desta Terra de Santa Cruz e em outros países, certo de que a Divina Providência nos atenderá e jamais lhes deixará faltar o pão do corpo e, sobretudo, o Pão da Alma”, declara padre Lucas.

Contudo, como são, além de padres, também membros das Forças Armadas, devem arcar tanto com as responsabilidades próprias do ofício religioso quanto do militar. Assim, celebram a Missa, oferecem os sacramentos e educam na fé, mas também seguem as normas e princípios militares.

“Trata-se da assistência religiosa, a qual compreende o exercício do ministério sacerdotal relativo à religião em favor dos seus adeptos, e também a assistência espiritual, a qual compreende o ministério de feição paternal a ser exercido em benefício de todos e de cada um em particular sem distinção de credos, no sentido de criar um ambiente de cordialidade, de otimismo, de confiança, de serenidade e valores, indispensável nas organizações militares”, assinala o capelão.

Para se tornar capelão militar do Exército, é necessário, naturalmente, ser sacerdote, e prestar um concurso próprio para ingressar na Escola de Formação Complementar do Exército (EsFCEx). Depois, é preciso passar por um estágio de adaptação iniciado na Escola de Administração do Exército (EsAEx) e concluído em diversas organizações militares. Após essas etapas, o padre se torna capelão e passa a integrar o Quadro de Capelães Militares (QCM), iniciando a carreira como 2º tenente e podendo atingir até o posto de coronel.

Braço forte, mão amiga

Compartilhando com nossa reportagem algumas das experiências vividas em sua missão de capelão, padre Lucas destaca duas. A primeira foi a Operação Serrana no Rio de Janeiro, em 2011, quando o Exército prestou apoio às vítimas das enchentes e inundações. Foram “famílias e comunidades envolvidas em sofrimentos indescritíveis nas localidades atingidas pelas chuvas intensas”, recorda o sacerdote.

O padre Lucas atualmente é o capelão da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), em Resende (RJ) / Foto: Arquivo pessoal

A segunda foi a participação na Missão de Estabilização da Paz promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), no Haiti, de maio a dezembro de 2015, no 22º Contingente Brasileiro. “Constatar a extrema pobreza de perto, conhecer outra cultura e uma história nacional diferente, bem como apoiar o trabalho de centenas de militares brasileiros, dignos representantes de nossa Pátria em um serviço humanitário de primeira grandeza, não tem preço nem descrições suficientes. Sentir-se útil para tantos faz a vida ser mais fecunda e repleta de sentido”, descreve padre Lucas.

Finalizando a entrevista, o capelão ainda faz um apelo: “Contamos com as orações de todos os batizados da Santa Igreja que, invocando a intercessão de Nossa Senhora Aparecida, Generalíssima das Forças Armadas, alcancemos de Deus muitas bênçãos para nosso Brasil, suas Forças Armadas e todo o amado povo brasileiro, sempre fiel e cordialmente devotado”.

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