Falecimento

Simplicidade e silêncio marcam legado de Dom Cipriano Chagas

Durante velório na manhã desta segunda-feira, 23, amigos, admiradores, clero e membros da comunidade Emanuel se despediram do monge beneditino

Julia Beck
Enviada ao Rio de Janeiro

Dom Cipriano Chagas /Foto: Arquivo CN

“Uma vida de evangelização e de oração”. Assim o Cardeal Orani Tempesta definiu a vida de Dom Cipriano Chagas, monge beneditino falecido neste domingo, 22, no Rio de Janeiro. Seu velório, realizado na manhã desta segunda-feira, 23, no Mosteiro de São Bento, na capital carioca, reuniu amigos, admiradores, membros do clero e da comunidade Emanuel – fundada por Chagas. 

Co-fundador da comunidade, Paulo Malta emocionou-se ao recordar os ensinamentos transmitidos pelo monge. “Durante mais de 30 anos nós convivemos juntos e foi ele quem me ensinou, sem me julgar, o caminho a seguir”, comentou. Malta revelou que a comunidade passou por momentos de desesperança diante da fragilidade da saúde de Dom Cipriano, mas que foram superados com as palavras do próprio monge, eternizadas no livro de sua autoria: “E nada vos será impossível”.

“Ficamos sem saber como agir. Nesse livro, na última folha, no último parágrafo, ele nos deixou um caminho. Ele descreveu nesse livro como seria o mundo se nós obedecêssemos a Deus, e todos fôssemos verdadeiros cristãos. Ele diz: ‘eu gostaria de estar vivo para ver tudo isso acontecer, mas se eu não tiver, quero que continuem levando adiante’. Essa foi a mensagem que ele deixou para nós naquela crise em que ele ainda estava aqui. Nós vimos aquela frase e decidimos continuar com a comunidade”, recordou Malta.

Sobre a pessoa de Dom Cipriano, Paulo Malta falou sobre sua principal lembrança acerca do monge. “Dom Cipriano era um homem que aceitava a todos nós do jeito que nós somos e seguia os exemplos de Jesus, que abrigava a todos sem julgá-los”. Segundo o co-fundador da comunidade Emanuel, os missionários permanecerão sob a direção do abade do Mosteiro São Bento, Dom Felipe.

Corpo de Dom Cipriano foi velado no Mosteiro de São Bento/ Foto: Julia Beck – Canção Nova

Arcebispo da arquidiocese do Rio de Janeiro, da qual Dom Cipriano fazia parte, Dom Orani reconheceu os trabalhos prestados pelo monge à comunidade. “Como monge e como cristão ele deixa um grande legado ao Brasil, à nossa Arquidiocese, à comunidade Emanuel. (…) Também deixou legados sociais, uma escola modelo, trabalhos que são consequência de uma vida de oração. Um cristão que procurou ver em tudo a ação do Espírito Santo”, comentou.

Em nome da arquidiocese, o cardeal afirmou: “A nossa arquidiocese é muito grata a ele e a tudo que ele deixa como legado, que é exemplo, seja na vida monástica, seja na comunidade Emanuel, ou no trabalho social. Pedimos a Deus o seu repouso eterno, para que possa contemplar a face de Deus a quem ele buscou e serviu”, concluiu.

O abade do Mosteiro São Bento, Dom Felipe recordou Dom Cipriano como um homem que demonstrou, por meio da simplicidade e do silêncio, uma grande sensibilidade social. “Uma pessoa que se tornou tão pública, social e eficiente em sua missão sacerdotal e monástica deixa esse testemunho de que vale muito mais fazer o bem, sem os holofotes e a propaganda falsa”, realçou.

Ana Gabriela Malta, diretora da escola Dom Cipriano, que leva o nome do monge e contava com o acompanhamento do mesmo, lembrou da contribuição espiritual dada em vida pelo religioso: “A escola hoje traz esta espiritualidade e as crianças hoje aprendem a olhar o outro com compaixão”, pontuou.

“Quando ele chegava lá era muito carinho da parte de todos, da equipe, das crianças. Ele via nas crianças o crescimento, o desenvolvimento. O trabalho vai continuar. É uma sementinha que vai muito além. (…) Quero guardar dele a alegria que ele tinha, a paz que ele passava para as pessoas, a compaixão. Ele tinha os valores muitos certos e não abria mão desses valores”, comentou emocionada.

Amigos, admiradores, clero e membros da comunidade Emanuel durante o velório de Dom Cipriano/ Foto: Julia Beck – Canção Nova

Dom Cipriano e a história da Canção Nova

Citado pelo fundador da Comunidade Canção Nova, Monsenhor Jonas Abib, em seu livro “Canção Nova, uma obra de Deus”, Dom Cipriano é considerado um “grande amigo da Canção Nova”.

O monge beneditino foi o responsável pela doação do primeiro gravador profissional de rolo da Rádio Canção Nova. “Ele [Dom Cipriano] nos disse que recebeu aquele gravador de presente. Deixava-o na Comunidade Emanuel e, toda vez que ia usá-lo sentia: ‘Esse gravador não é para você, é para a Canção Nova’”, escreveu o monsenhor.

Além do gravador, o fundador da Canção Nova afirma que o monge foi um dos três cotistas a auxiliar na compra da rádio bandeirantes, que mais tarde, tornou-se a rádio Canção Nova. A quantia em dinheiro, levantada pelo monge, era parte das doações que o mesmo havia conseguido em campanha pela comunidade Emanuel, a qual havia fundado. Na história dos 40 anos da Comunidade Canção Nova, Dom Cipriano sempre esteve presente, auxiliando com doações financeiras e materiais, e sempre incentivava os fiéis com os quais convivia a ajudar.

Antiga Rádio Canção Nova /Foto: Arquivo CN

Quem foi Dom Cipriano

Wagner Cintra Chagas, nome de batismo de Dom Cipriano Chagas, nasceu em 13 de fevereiro de 1923. De família espírita, mas sempre convivendo com católicos, foi batizado e realizou a Primeira Comunhão.

Foi convocado pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) para a II Guerra Mundial, mas não chegou a ser enviado ao campo de batalha. Foi locutor pela BBC em Londres no período de pós-guerra. Casou-se com Rachel Ribeiro Vieira, com quem teve um filho, mas ambos faleceram precocemente. O filho faleceu logo que nasceu, enquanto Rachel faleceu três anos após o casamento.

Católica, a falecida trouxe Wagner para mais próximo da religião católica e, após tantas perdas, Chagas conheceu o Mosteiro de São Bento, local que mais tarde procurou para exercer sua vocação sacerdotal. Foi ordenado padre em 1965, quando adotou o nome de Cipriano.

Conheceu a Renovação Carismática e, em 1976, fundou a Comunidade Emanuel. Criou a revista Jesus Vive e fundou a Edições Louva-a-Deus. Dom Cipriano publicou mais de 50 livros e acumula um acervo de mais de 6000 palestras em áudio.

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