Ao final da meditação da Via Sacra, Francisco fez uma oração sobre a Cruz de Cristo, composta por ele mesmo
Kelen Galvan
Da redação O Papa Francisco presidiu na noite desta Sexta-feira Santa, 25, a Via Sacra no Coliseu de Roma. As meditações deste ano sobre o tema “Deus é misericórdia”, foram preparadas pelo Arcebispo de Perugia, Cardeal Gualtiero Bassetti. Os textos recordaram os cristãos perseguidos, o holocausto dos judeus na II Guerra Mundial e o drama dos imigrantes. Mas também refletiu sobre o sofrimento das famílias em crise, dos casamentos falidos e dos desempregados. [Veja o livreto da Via Sacra, disponível em italiano] Ao final da Via Sacra o Santo Padre fez uma oração, composta por ele mesmo, refletindo sobre a Cruz de Cristo, que ainda hoje é encontrada em inúmeras realidades. Leia, abaixo, oração completa:
Ó Cruz de Cristo!
Ó Cruz de Cristo, símbolo do amor divino e da injustiça humana, ícone do sacrifício supremo por amor e do egoísmo extremo por insensatez, instrumento de morte e caminho de ressurreição, sinal da obediência e emblema da traição, patíbulo da perseguição e estandarte da vitória. Ó Cruz de Cristo, ainda hoje te vemos erguida nas nossas irmãs e nos nossos irmãos assassinados, queimados vivos, degolados e decapitados com as espadas barbáricas e com o silêncio velhaco. O Cruz de Cristo, ainda hoje te vemos nos rostos exaustos e assustados das crianças, das mulheres e das pessoas que fogem das guerras e das violências e, muitas vezes, não encontram senão a morte e muitos Pilatos com as mãos lavadas. Ó Cruz de Cristo, ainda hoje te vemos nos doutores da letra e não do espírito, da morte e não da vida, que, em vez de ensinar a misericórdia e a vida, ameaçam com a punição e a morte e condenam o justo. Ó Cruz de Cristo, ainda hoje te vemos nos ministros infiéis que, em vez de se despojarem das suas vãs ambições, despojam mesmo os inocentes da sua dignidade. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos corações empedernidos daqueles que julgam comodamente os outros, corações prontos a condená-los até mesmo à lapidação, sem nunca se darem conta dos seus pecados e culpas. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos fundamentalismos e no terrorismo dos seguidores de alguma religião que profanam o nome de Deus e o utilizam para justificar as suas inauditas violências. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje naqueles que querem tirar-te dos lugares públicos e excluir-te da vida pública, em nome de certo paganismo laicista ou mesmo em nome da igualdade que tu própria nos ensinaste. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos poderosos e nos vendedores de armas que alimentam a fornalha das guerras com o sangue inocente dos irmãos. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos traidores que, por trinta dinheiros, entregam à morte qualquer um. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos ladrões e corruptos que, em vez de salvaguardar o bem comum e a ética, vendem-se no miserável mercado da imoralidade. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos insensatos que constroem depósitos para armazenar tesouros que perecem, deixando Lázaro morrer de fome às suas portas. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos destruidores da nossa «casa comum» que, egoisticamente, arruínam o futuro das próximas gerações. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos idosos abandonados pelos seus familiares, nas pessoas com deficiência e nas crianças desnutridas e descartadas pela nossa sociedade egoísta e hipócrita. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje no nosso Mediterrâneo e no Mar Egeu feitos um cemitério insaciável, imagem da nossa consciência insensível e narcotizada. Ó Cruz de Cristo, imagem do amor sem fim e caminho da Ressurreição, vemos-te ainda hoje nas pessoas boas e justas que fazem o bem sem procurar aplausos nem a admiração dos outros. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos ministros fiéis e humildes que iluminam a escuridão da nossa vida como velas que se consumam gratuitamente para iluminar a vida dos últimos. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos rostos das religiosas e dos consagrados – os bons samaritanos – que abandonam tudo para faixar, no silêncio evangélico, as feridas das pobrezas e da injustiça. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos misericordiosos que encontram na misericórdia a expressão mais alta da justiça e da fé. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nas pessoas simples que vivem jubilosamente a sua fé no dia-a-dia e na filial observância dos mandamentos. O Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos arrependidos que, a partir das profundezas da miséria dos seus pecados, sabem gritar: Senhor, lembra-Te de mim no teu reino! Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos Beatos e nos Santos que sabem atravessar a noite escura da fé sem perder a confiança em ti e sem a pretensão de compreender o teu silêncio misterioso. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nas famílias que vivem com fidelidade e fecundidade a sua vocação matrimonial. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos voluntários que generosamente socorrem os necessitados e os feridos. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos perseguidos pela sua fé que, no sofrimento, continuam a dar testemunho autêntico de Jesus e do Evangelho. Ó Cruz de Cristo, vemos-te ainda hoje nos que sonham com um coração de criança e que trabalham cada dia para tornar o mundo um lugar melhor, mais humana e mais justo. Em ti, Santa Cruz, vemos Deus que ama até ao fim, e vemos o ódio que domina e cega os corações e as mentes daqueles que preferem as trevas à luz. Ó Cruz de Cristo, Arca de Noé que salvou a humanidade do dilúvio do pecado, salva-nos do mal e do maligno! Ó Trono de David e selo da Aliança divina e eterna, desperta-nos das seduções da vaidade! Ó grito de amor, suscita em nós o desejo de Deus, do bem e da luz. Ó Cruz de Cristo, ensina-nos que o amanhecer do sol é mais forte do que a escuridão da noite. Ó Cruz de Cristo, ensina-nos que a aparente vitória do mal se dissipa diante do túmulo vazio e perante a certeza da Ressurreição e do amor de Deus que nada pode derrotar, obscurecer ou enfraquecer. Amém!