Superação

Japão: das feridas da bomba nuclear às expectativas das Paraolimpíadas

Após os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, o país se prepara para os Jogos Paraolímpicos; Japão recorda dos ataques nucleares de agosto de 1945

Da redação, com Vatican News

Japoneses rezam pelas vítimas do bombardeio atômico de 1945 durante missa na Catedral de Urakami, em Nagasaki, nesta segunda-feira, 9 de agosto Foto: Kyodo / via REUTERS

Para o Japão, esta segunda-feira, 9, é um dia marcante. Há 76 anos a cidade de Nagasaki foi atingida por um bombardeio nuclear,  três dias após o de Hiroshima. Um momento de dor, luto e oração, uma oportunidade de ouvir, como todos os anos, as vozes dos sobreviventes.

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Os testemunhos daqueles que, de geração em geração, ainda carregam nos seus corações e nos seus corpos feridas que ainda estão abertas.

Hoje é também o dia seguinte ao encerramento dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Olimpíadas na qual foram entregues mais de mil medalhas – um recorde na história dos Jogos – a atletas de todos os continentes. Portanto, por um lado a memória de um longo período, doloroso e necessário, e por outro com os olhos já voltados para o próximo grande evento que começará dentro de algumas semanas: os Paraolímpicos.

Tóquio 2020: alegria com pesar

Quando Tóquio foi escolhida para sediar os Jogos – a segunda vez na história, após a edição de 1964 – as pessoas imaginaram um evento completamente diferente daquele vivido nos últimos 15 dias.

A pandemia não só fez com que as Olimpíadas fossem adiadas por um ano, mas também fez com que estádios, pistas de atletismo e pavilhões esportivos fossem fechados ao público.

Este foi um grande problema, tanto em termos do clima festivo que acompanha os Jogos quanto, é claro, a perda de renda do turismo e dos patrocinadores. Mesmo assim o espírito olímpico prevaleceu, com muitas histórias e emoções. Mas hoje, qual é o clima que se respira em Tóquio?

Padre Andrea Lembo, missionário PIME há mais de 10 anos no Japão, responde a esta pergunta em uma entrevista à Rádio Vaticano – Vatican News:

“O adiamento dos Jogos Olímpicos não criou apenas problemas organizacionais, mas também uma queda no entusiasmo, e não podemos esquecer a enorme quantidade de capital investido para acomodar o grande número de turistas que deveriam vir. As decisões em um determinado momento foram políticas, houve também movimentos sociais a favor e contra. Mas depois de ter iniciado, o esforço, o compromisso, o sacrifício dos atletas tiveram uma importante repercussão na mídia, mesmo sem a presença do público. Especialmente as competições à noite e as de sábado e domingo tiveram muita audiência”.

Rádio Vaticano: Como os jovens viveram estas Olimpíadas?

Padre Andrea Lembo: “Paralelamente aos Jogos, há muitas atividades esportivas realizadas por pessoas simples, onde se pode sentir o espírito olímpico”. Porém os problemas não faltam. “A Igreja está na linha de frente para as famílias, para os muitos desabrigados, porque a pobreza está aumentando. A pandemia”, explicou, “causou grandes dificuldades e, apesar da luz dos Jogos, estes problemas permanecem.

Os Paraolímpicos e o foco nos mais vulneráveis

Rádio Vaticano: Os Paraolímpicos começam em 25 de agosto. Quais são as expectativas no país para este evento?

Para o padre Andrea, estes Jogos “são muito aguardados, eu diria até mais do que as Olimpíadas”. A razão é dupla. Por um lado”, explica, “as datas coincidem com um dos feriados mais longos do Japão, portanto haverá mais telespectadores. Mas acima de tudo, a sociedade japonesa dá muita atenção à deficiência, e este é o elemento mais importante. Assim, com este evento, o Japão quer mostrar ao mundo sua positividade, sua atenção aos frágeis, aos deficientes, àqueles que por nascimento ou acidente têm uma vida diferente, difícil, mas que apostam nesta vida, jogam, fazem um esforço.

Tudo isso, enfatiza, “é um grande incentivo, mostra que a coragem e a esperança, a capacidade de superar os próprios limites, conduz à verdadeira humanidade. Sempre em frente, o objetivo de alcançar um ponto pelo qual eu digo que sim, é bom viver! Mesmo em uma sociedade que exige excelência, uma realidade meritocrática, ver esses atletas paraolímpicos será um grande incentivo para todos”. Especialmente para a geração mais jovem. “Não é fácil para a geração mais jovem construir um futuro, isto pode ser um verdadeiro incentivo para a vida dos jovens”.

Desde a bomba atômica até a chama olímpica

O Japão se prepara para sentir novas emoções, mas ao mesmo tempo é chamado a lembrar a página mais dolorosa de sua história: o bombardeio atômico americano de Hiroshima e Nagasaki. Uma coincidência da qual o arcebispo de Nagasaki, Dom Joseph Mitsuaki Takami, também falou à Rádio Vaticano, e que o padre Andrea vê como “uma feliz e bela coincidência, até porque no mês passado o Supremo Tribunal japonês decidiu estender a distância de residência das pessoas que, devido aos danos causados pela bomba atômica, têm uma série de benefícios sociais e de saúde”.

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“Mais de uma centena de pessoas que agora têm câncer ou outras doenças como resultado do bombardeio atômico se juntaram aos milhares de sobreviventes. O Estado reconhece que os efeitos dessa tragédia não param com apenas uma geração ou uma certa quilometragem”. O padre continuou a destacar a importância das celebrações que comemoram os dias 6 e 9 de agosto de 1945. “Todos os anos a nação para e medita sobre a paz e o absurdo da guerra. Sempre – acrescenta – são recordadas as palavras de São João Paulo II e também as mensagens do Papa Francisco. A Igreja desempenha um papel importante neste sentido e dá uma grande contribuição para a reflexão sobre a energia nuclear e a posse de armas nucleares”.

Ao lado dos jovens

Desde o mês passado, padre Andrea Lembo é o novo diretor de um Centro que a diocese de Tóquio criou nos anos 30 para ajudar os jovens no seu crescimento humano e cristão, incentivando momentos de encontro e convívio. O Centro é chamado de Shinseikaikan, ou seja, Verdade e Vida.

“Os jovens daquela época viviam sob um imperialismo muito forte, com uma mentalidade muito unânime. Ao longo dos anos, o Centro, que queria tornar o Evangelho conhecido, se desenvolveu e hoje”, diz o sacerdote, “é uma grande honra para mim e para o PIME dirigi-lo. É claro que é também uma grande responsabilidade”. 

“Tentamos levar Jesus e o Evangelho, especialmente àquelas pessoas que vivem as experiências mais dramáticas da jornada humana. Refiro-me à doenças, famílias divididas, os muitos suicídios e, portanto, de forma mais geral, à solidão. Queremos – conclui – ser uma semente que possa crescer, dando um sopro de oxigênio evangélico às pessoas próximas a nós com atividades diárias de vários tipos com a intenção de estar sempre perto dos necessitados e encorajar encontros internacionais, em um mundo cada vez mais fechado por causa da pandemia, recuperando a beleza do verdadeiro encontro entre irmãos de diferentes culturas, línguas e tradições”.

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