Solidariedade

Dia Mundial dos Pobres: não podemos naturalizar a exclusão, diz bispo

Igreja celebra Dia Mundial dos Pobres neste domingo

Denise Claro
Da redação

Pobreza no Brasil atinge 13,2 milhões de pessoas. /Foto de Aamir Mohd Khan por Pixabay

Neste domingo, 17, é comemorado o Dia Mundial dos Pobres. A data foi convocada pelo Papa Francisco no encerramento do Ano da Misericórdia, em 2016. O objetivo do dia é que toda a igreja reflita sobre a situação dos mais pobres, e volte seu olhar para eles.

A mensagem do Papa para o Dia Mundial dos Pobres deste ano, que tem como tema “A esperança dos pobres jamais se frustrará” (Sl 9, 19), afirma que “a opção pelos últimos, por aqueles que a sociedade descarta e lança fora é uma escolha prioritária que os discípulos de Cristo são chamados a abraçar para não trair a credibilidade da Igreja e dar uma esperança concreta a tantos indefesos”.

A realidade da pobreza no Brasil é alarmante. Dados do Cadastro Único do Ministério da Cidadania mostram que a pobreza extrema no país aumentou e já atinge 13,2 milhões de pessoas. Nos últimos sete anos, mais de 500 mil pessoas entraram em situação de miséria, sendo o nordeste o pior cenário.

O bispo da arquidiocese de Curitiba e membro da Comissão para a Ação Sociotransformadora, Dom Francisco Cota, explicou a escolha da data do Dia Mundial dos Pobres, que começou com a proposta de ser comemorado no penúltimo domingo do ano litúrgico, compreendendo a semana que antecede a Festa de Cristo Rei.

“É o Dia do Pobre e a Semana da Solidariedade, pois o Papa quer mostrar que tem duas dimensões de perceber a misericórdia: tanto a misericórdia com relação ao perdão de Deus, quanto devemos nos identificar com quem Ele se identificou. Jesus não veio para ser servido mas para servir, e nos motivou a encontrá-Lo naqueles que vivem em situação de sua dignidade negada”, afirma o bispo.

O religioso lembra que a Igreja é continuadora da Missão de Cristo, e é chamada a ter esse olhar bíblico, do modo de agir de Deus. A Igreja age de duas maneiras com os mais necessitados. Por um lado, há a solidariedade imediata, de assistência, de dar imediatamente de comer, beber, vestir; por outro lado, ela amplia seu olhar, e busca entrar na causa, na situação de exclusão que a pessoa vive.

“Deus vê a situação, ouve, intervém e liberta. Aí entra a ação sociotransformadora, complementando a ação caritativa, para que haja uma mudança na situação dessas pessoas, abrindo para elas horizontes de recuperar a sua dignidade, de se reerguer da situação que vivem de exclusão e abandono”

Na mensagem do Santo Padre para este ano, o tema é relacionado a uma situação de desigualdade social. Durante um período de melhora econômica, mas que formata a sociedade prevendo um desenvolvimento econômico, sem pensar no desenvolvimento social, e aumentando, assim, a pobreza e a desigualdade.

“Não podemos naturalizar a exclusão, de tanto ver o pobre, de tanto ver as desigualdades, nos tornar indiferentes. A pobreza não é natural, é fruto de um modelo de sociedade desigual, que exclui as pessoas”, reforça Dom Francisco.

Igreja no Brasil

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio de sua Comissão Episcopal Pastoral para Ação Sociotransformadora, e em parceria com as Pastorais Sociais, a Cáritas Brasileira e organizações sociais realizaram, no último dia 7, uma roda de conversa, com o tema: “Desafios e alternativas das Pastorais Sociais e movimentos populares na superação das desigualdades”. 

A iniciativa antecipou a Semana da Solidariedade, organizada pela Cáritas do Brasil, após a definição da III Jornada Mundial dos Pobres (JMP), em todo o Brasil, de 10 a 17 de novembro.

O diretor-executivo da Cáritas Brasileira, Fernando Zamban, acredita que a data é uma grande convocação para que a Igreja no Brasil e no mundo se tornem cada vez mais sinal concreto da caridade de Cristo junto aos mais necessitados.

“Antes de qualquer coisa, é um grande apelo mundial para conversão dos cristãos católicos à solidariedade. Essencialmente o trabalho da Igreja é estar junto com os pobres. É uma celebração de alerta e de denúncia de uma realidade que é posta à margem e desprezada pela sociedade em geral”. 

Zamban lembra ainda que os pobres são os que não desistem, confiam em Deus e lutam contra as injustiças sociais. Ele comenta também sobre as iniciativas no Brasil em virtude da data. “A convocação da III Jornada Mundial dos Pobres vem orientada pela Igreja no Brasil para ser um amplo processo de escuta, de diálogo e encontro nas comunidades, paróquias e dioceses. Cada grupo realiza a sua Jornada e desenvolve as ações concretas para a semana. Uma das ações propostas é no âmbito da reflexão, como por exemplo a roda de conversa que fizemos”. 

O diretor-executivo da Cáritas no país cita também a formação de grupos de reflexão sobre a mensagem do Papa para este ano e sobre a importância de se criar momentos de formação diretamente com as pessoas afetadas pela extrema pobreza do país, celebrações eucarísticas, etc.

“Quando se ouve as pessoas mais necessitadas, se entende melhor a situação delas. Elas muitas vezes sabem o que fazer, mas sozinhas não conseguem realizar”.

Por fim, a necessidade de pensar em doações para essas pessoas, analisar o que elas mais necessitam, mutirão para construção de casas populares, e outros gestos concretos, como diálogo com o poder público.

“Para o domingo, o Dia mesmo do Pobre, uma boa ideia é um almoço ou um jantar, para que essas pessoas em situação de necessidade possam ter essa refeição partilhada, junto com a comunidade paroquial”. 

Dia do Pobre e Campanha da Fraternidade

Na carta enviada neste ano pelo secretário-geral da CNBB, Dom Joel Portella, o bispo lembra que “a JMP é um convite a todas as comunidades cristãs e a todas as pessoas de boa vontade, para que levem esperança e conforto aos pobres, e a colaborarem para que ninguém se sinta privado da proximidade e da solidariedade humana”

Dom Francisco lembra que, no Brasil, há uma situação concreta de relação com o pedido do Papa, pois já se viveu, neste ano, a Campanha da Fraternidade sobre as políticas públicas.

“Sabemos que o caminho para se lidar com as causas da desigualdade e da pobreza é intervir nas estruturas, e se queremos fazer isso, temos alguns caminhos: fazer valer as garantias constitucionais, as políticas públicas. Igreja, política e sociedade civil precisam se unir para pensar soluções que venham de encontro a tirar essas pessoas da situação de pobreza e de direitos negados em que ela se encontra”. 

A Jornada Mundial dos Pobres é uma oportunidade de desenvolver nas pessoas o olhar de Jesus, e de tirar os pobres desta situação de invisibilidade. “A semana da solidariedade nos chama a atenção para isso. Se nós hoje não enxergamos, não ouvimos, não queremos ver essas pessoas, Jesus está presente nelas e um dia também irá nos dizer que talvez tenhamos sido cúmplices dessa realidade”. 

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