A reforma da Igreja no pontificado de Francisco

Em um ano de Pontificado, o Papa dá continuidade ao trabalho de reforma iniciado pelos pontificados anteriores e imprime o seu próprio estilo

Liliane Borges
Da Redação

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“Mudanças são sempre necessárias, e o que chama a atenção em Francisco é o modo como as está realizando”, destaca Cardeal Orani Tempesta / Foto: L´osservatore Romano

Desde a eleição do Cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio ao papado, em 13 de março de 2013, o assunto que corre mundo afora é a Reforma da Igreja. O tom dado à conversa por vezes segue linhas ideológicas ou desinformação.

O Papa Francisco, como todos os Papas da história,  está imprimindo sua própria marca ao governo da Igreja, o que não deixa de ser um processo de continuidade com o esforço da Instituição em  se renovar diante das novidades do próprio tempo.

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O arcebispo do Rio de Janeiro, Dom João Orani Tempesta,  que esteve recentemente em Roma para receber o título cardinalício,  destaca a continuidade e a originalidade do novo Papa em prosseguir uma reforma já iniciada em outros pontificados.

“Há uma continuidade na doutrina, na fé, naquilo que é essencial na Igreja, e a maneira de fazer, falar e explicar são próprias de cada Papa; no caso do Papa Francisco, com sua proximidade, com suas falas diretas, com suas maneiras comparativas de falar, vai anunciado uma Igreja querigmática”

O cardeal destaca também que as mudanças são sempre necessárias, e o que chama a atenção em Francisco é o modo como as está realizando. Dom Orani recorda que sendo a Doutrina a mesma, o diferencial é a maneira de fazer, “o que vai mudando de acordo com a época, possibilidades e necessidades da sociedade”, conclui.

Entre as novidade de Francisco está o grupo de oito cardeais, escolhido para representar as diferentes realidades eclesiais no mundo. O chamado “Conselho de Cardeais”, foi criado pelo Pontífice, em abril de 2013, com o objetivo de obter auxílio no governo da Igreja e no projeto de reforma da Cúria Romana. O documento de instituição do conselho foi publicado em 30 de setembro do mesmo ano.

Na ocasião, a Santa Sé informou,  por meio de seu porta-voz, padre Federico Lombardi, que a criação deste Conselho surgiu das sugestões dadas pelos Cardeais durante as Congregações Gerais antes do último Conclave.

“A palavra-chave para pensar, nesse método de governo que o Papa está configurando, creio que seja o caráter sinodal, a ideia do caminhar juntos: uma Igreja que caminha junto em seus diversos componentes e o Papa se coloca em caminho com essa Igreja; e o discernimento, que é a busca da vontade de Deus mediante uma consulta frequente e paciente”, declarou o porta-voz.

Francisco e Bento XVI

Francisco deu continuidade a Reforma iniciada por Bento XVI ao Banco do Vaticano / Foto: L´osservatore Romano

Algumas mudanças

O Papa prossegue na mesma linha de Bento XVI em relação ao Instituto para as Obras Religiosas (IOR), popularmente conhecido como “Banco do Vaticano”. A Vigilância instaurada pelo pontífice alemão com a Autoridade Financeira de Informação foi fortalecida por Francisco com dois Motus Proprios e a consolidação de uma Lei que “reforça o  sistema interno de prevenção e combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento de terrorismo”.

A nova legislação está alinhada aos parâmetros internacionais, em particular com as recomendações do Grupo de Ação Financeira (GAFI) e da União Europeia. O Papa argentino deu maior visibilidade à ação de combate, à própria Reforma, de modo geral, devido à facilidade com que fala do assunto quando interpelado, principalmente pela imprensa.

Neste âmbito, a medida mais incisiva  foi a criação da Secretaria para a Economia que tem autoridade sobre todas as atividades econômicas e administrativas da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano. O que significa simplificação e  vigilância, superando as expectativas de quem esperava uma reforma apenas no Banco do Vaticano. Francisco mudou a estrutura administrativa e financeira da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano.

O que o Papa diz a respeito

No regresso à Roma, durante o voo após a viagem ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude, em julho passado, o próprio Papa Francisco comentou sobre suas ações. O Pontífice destacou que seus passos se basearam em duas vertentes: as sugestões do cardeais antes do Conclave e a oportunidade.

“Eram coisas que nós, cardeais, tínhamos pedido àquele que haveria de se tornar o novo Papa. Eu me lembro que pedi muitas coisas, pensando que seria outro… Pedíamos, por exemplo, para se fazer isso: a comissão de oito cardeais; sabemos que é importante ter um Organismo Consultivo externo, não os organismos consultivos que já existem, mas de fora”, explicou o Papa

A respeito da oportunidade, Francisco explica que foram surgindo fatos que o motivaram, por exemplo, a intervir no IOR, o que que acabou com a prisão de um  monsenhor. “Estes são escândalos, que fazem sofrer”, lamentou o Papa.

Porém, Francisco destacou que, ao contrário do que se pensava, ele não encontra as “famosas” resistências e intrigas na Cúria Romana. “Há santos na Cúria. E também há alguns que não são tão santos, e esses são os que fazem mais barulho. Vocês sabem que faz mais barulho uma árvore que cai do que uma floresta que cresce”, conclui.

Dom Braz de Aviz: uma reforma devagar

Segundo o Cardeal da Cúria Romana, o brasileiro Dom João Braz de Aviz , a característica de Francisco configura-se em um reforma que  acontece “devagar, com jeito, mas é uma reforma em que ele não exclui ninguém”.

“O que ele não quer é que existam pessoas, sobretudo em cargos importantes, de decisões e tudo, mas que não têm o seguimento de Jesus claro, que não são discípulos, que fazem outras coisas”, comenta o Cardeal.

Dom João destaca o modo de Francisco relacionar-se com a Cúria Romana e seu jeito de trabalhar com os Cardeais. “Lá no Vaticano a gente sente que tudo se simplificou. Ele confia muito nas pessoas, então isso para nós é uma responsabilidade muito grande, precisa confiar para trabalhar com ele, mas a confiança dele é total, então a gente fica feliz”, conclui.

A simplicidade do Papa no processo

O  Bispo da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, Dom Fernando Rifan,   destaca justamente a simplicidade do Papa em realizar todo esse processo.

“As reformas na Cúria que o Papa  tem procurado fazer é para tornar as coisas menos burocráticas, mais fáceis e acessíveis. Nós rezamos para que o Santo Padre consiga, com esse caráter pastoral, atrair as pessoas para a Igreja”, declara Dom Rifan.

Um ano de pontificado, novidades e continuidade, essa tem sido a marca do Papa que atrai justamente pelo modo “Francisco de ser”.

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