Dia Mundial da Paz 2024

Papa pede inteligência artificial voltada para a paz e fraternidade

Divulgada a mensagem de Francisco para o Dia Mundial da Paz; apelo do Pontífice é também para a regulamentação do desenvolvimento e uso de inteligência artificial

Julia Beck
Da redação

Foto: Vandeville Eric/ ABACA

Com o tema “Inteligência artificial e paz”, a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial da Paz 2024 foi publicada nesta quinta-feira, 14. O texto traça oito pontos de reflexão que vão desde o progresso da ciência e da tecnologia como caminho para paz, até os desafios da inteligência artificial.

Inicialmente, o Santo Padre sublinha que a inteligência é expressão da dignidade que foi dada pelo Criador, que fez o homem à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 26) e o tornou capaz, através da liberdade e do conhecimento, de responder ao seu amor.

Com base nesta afirmação, o Pontífice indica que a qualidade fundamentalmente relacional da inteligência humana manifesta-se de modo particular na ciência e na tecnologia, que são produtos extraordinários do seu potencial criativo.

“O próprio progresso da ciência e da tecnologia – na medida em que contribui para uma melhor organização da sociedade humana, para o aumento da liberdade e da comunhão fraterna – leva à melhoria do homem e à transformação do mundo”, assinala.

Progresso da ciência: possibilidades e perigos

Francisco reflete que há alegria e reconhecimento pelas extraordinárias conquistas da ciência e da tecnologia, mas, ao mesmo tempo, alerta que o progresso técnico-científico, e o seu vasto leque de possibilidades, pode constituir um risco para a sobrevivência humana e um perigo para a a casa comum

Por isso, o Santo Padre reforça a importância de questionar as consequências das novas tecnologias, a médio e longo prazo, e os impactos que podem causar na vida dos indivíduos e da sociedade.

A multiplicidade de algoritmos e a extração de dados que permitem controlar os hábitos mentais e relacionais das pessoas para fins comerciais ou políticos foram citadas pelo Papa, bem como a ética deste mecanismo e de outros semelhantes.

Inteligência artificial de forma positiva

Quanto às formas de inteligência artificial, o Pontífice relata que, na linguagem comum, procuram reproduzir ou imitar as capacidades cognitivas do ser humano. No entanto, sublinha que o seu impacto depende não só da concepção, mas também dos objetivos e interesses de quem os possui e de quem os desenvolve, bem como das situações em que são utilizados.

“A inteligência artificial deve ser entendida como uma galáxia de realidades diversas e não podemos presumir a priori que o seu desenvolvimento dará uma contribuição benéfica para o futuro da humanidade e para a paz entre os povos. O resultado positivo só será possível se nos mostrarmos capazes de agir com responsabilidade e respeitar valores humanos fundamentais como ‘inclusão, transparência, segurança, equidade, privacidade e fiabilidade’”, sublinha.

Francisco reforça, então, que esta tecnologia e a sua expansão devem afastar-se da tentação do egoísmo, do interesse próprio, do desejo de lucro e da sede de poder, e aproximar-se da paz e do bem comum.

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“A dignidade intrínseca de cada pessoa e a fraternidade que nos une como membros da única família humana devem estar na base do desenvolvimento das novas tecnologias e servir como critérios indiscutíveis para avaliá-las antes da sua utilização, para que o progresso digital possa ser verificado no respeito pela justiça e contribuir para a causa da paz”, afirma.

Limites

O Papa alertou sobre a importância dos limites dentro da inteligência artificial: “o ser humano, mortal por definição, pensando em ultrapassar todos os limites através da tecnologia, corre o risco, na obsessão de querer controlar tudo, de perder o controle sobre si mesmo; em busca da liberdade absoluta, de cair na espiral de uma ditadura tecnológica”.

Reconhecer e aceitar o próprio limite como criatura é, segundo o Pontífice, condição indispensável para que o homem alcance, ou melhor, aceite a plenitude como dom. A falta de limites, alerta, pode resultar em desigualdades, riqueza acumulada nas mãos de poucos, com sérios riscos para as sociedades democráticas.

Neste contexto, Francisco citou o impacto das novas tecnologias no local de trabalho e pediu que a comunidade internacional, vendo como tais formas de tecnologia penetram cada vez mais profundamente nos locais de trabalho, considere como uma alta prioridade o respeito pela dignidade dos trabalhadores e a importância de emprego para o bem-estar econômico das pessoas, famílias e sociedades, estabilidade no emprego e igualdade salarial.

As novas tecnologias não devem contribuir para o setor de armas

A questão das armas também foi refletida pelo Santo Padre. Ele afirma que a alta tecnologia que chegou a este setor levou a uma menor percepção da devastação causada e da responsabilidade do uso de armas, contribuindo para uma abordagem ainda mais fria que muitas vezes leva à guerra.

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“Não podemos ignorar a possibilidade de armas sofisticadas caírem em mãos erradas, facilitando, por exemplo, ataques terroristas ou intervenções destinadas a desestabilizar instituições governamentais legítimas. Em suma, o mundo não precisa realmente de novas tecnologias para contribuir para o desenvolvimento iníquo do mercado e do comércio de armas, promovendo a loucura da guerra”, enfatiza.

O Pontífice sublinha que seria positivo que a inteligência artificial se centrasse na promoção do desenvolvimento humano integral, nas inovações importantes na agricultura, na educação e na cultura, na melhoria do nível de vida de nações e povos inteiros, no crescimento da fraternidade humana e da amizade social, além da inclusão destes últimos, os mais frágeis e necessitados.

A tecnologia a favor da educação é outra defesa do Papa. Segundo ele, a inteligência artificial deve ter como objetivo principal promover o pensamento crítico, o desenvolvimento da capacidade de discernimento, no combate à desinformação, às notícias falsas e à cultura dos “muros”.

Regulamentação

Por último, Francisco exortou a Comunidade das Nações a trabalhar em conjunto para adotar um tratado internacional vinculativo, que regule o desenvolvimento e a utilização da inteligência artificial nas suas diversas formas.

“Naturalmente, o objetivo do regulamento não deve ser apenas impedir mais candidaturas, mas também incentivar boas candidaturas, estimulando abordagens novas e criativas e facilitando iniciativas pessoais e coletivas”, afirmou.

O Santo Padre pediu, então, que, nos debates sobre a regulamentação da inteligência artificial, sejam tidas em conta as vozes de todas as partes interessadas, incluindo os pobres, os marginalizados e outros que muitas vezes permanecem ignorados nos processos de tomada de decisão globais.

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