No Cazaquistão, primeiro discurso do Papa Francisco foi no encontro com as autoridades, com a sociedade civil e com o corpo diplomático
Huanna Cruz
Da Redação
O Papa Francisco foi acolhido pelas autoridades do Cazaquistão nesta terça-feira, 13, seu primeiro dia de visita ao país. Em seu primeiro discurso, Francisco falou que se sente como peregrino de paz à procura de diálogo e de unidade. “O nosso mundo tem necessidade e precisa voltar a encontrar harmonia”.
Para o Papa, a harmonia está bem representada num instrumento musical, tradicional e caraterístico do país, que é a dombra. Instrumento que constitui um emblema cultural e um dos símbolos mais importantes do Cazaquistão, a ponto de lhe ter sido dedicado, recentemente, um dia específico.
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Ao se preparar para esta viagem, o Pontífice procurou saber algumas versões da dombra, que era tocada já na época medieval e que, ao longo dos séculos, acompanhou os contos musicais de sagas e obras poéticas, ligando o passado ao presente. Símbolo de continuidade na diversidade, marca a cadência da memória do país e, face às rápidas mudanças econômicas e sociais em curso, recorda a importância de não se transcurar os laços com a vida de quem os precedeu, inclusive através das tradições que permitem fazer tesouro do passado e valorizar tudo o que se herdou.
“A memória do Cazaquistão, que o Papa João Paulo II – aqui peregrino – definiu como ‘Terra de mártires e de crentes, Terra de deportados e de heróis, Terra de pensadores e artistas’ (Discurso na Cerimónia de Boas-vindas, 22/IX/2001), traz impressa uma gloriosa história de cultura, humanidade e sofrimento”, ressaltou o Papa.
Segundo o Pontífice, o Cazaquistão se caracteriza pela capacidade de avançar criando harmonia entre “duas cordas paralelas”: temperaturas tão rígidas no inverno como elevadas no verão; tradição e progresso, bem simbolizados pelo encontro de cidades históricas a par doutras modernas, como a capital. Sobretudo, ressoam, no país, as notas de duas almas, a asiática e a europeia, que fazem dele uma permanente “missão de ligação entre dois continentes”.
País do encontro
“As cordas da dombra são tocadas juntamente com outros instrumentos de arco típicos destes lugares: a harmonia matura e cresce no conjunto, no coro que torna harmoniosa a vida social. ‘A fonte do sucesso é a unidade’: reza um belo provérbio local. Se isto é válido em todo o lado, é-o de modo particular aqui: os cerca de cento e cinquenta grupos étnicos e as mais de oitenta línguas presentes no país, com histórias, tradições culturais e religiosas variegadas, compõem uma sinfonia extraordinária e fazem do Cazaquistão um laboratório multiétnico, multicultural e multirreligioso único, revelando a sua peculiar vocação que é a de ser país do encontro”.
Segundo o Papa, a Constituição do Cazaquistão, ao defini-lo como um Estado laico, prevê a liberdade de religião e de crença. Uma laicidade sã, que reconheça o papel precioso e insubstituível da religião e contraste o extremismo que a corrói, representa uma condição essencial para o équo tratamento de todo o cidadão, além de favorecer o sentimento de pertença ao país por parte de todas as suas componentes étnicas, linguísticas, culturais e religiosas. Com efeito as religiões, enquanto desempenham o papel insubstituível de buscar e testemunhar o Absoluto, precisam da liberdade de se expressar. E assim a liberdade religiosa constitui o álveo melhor para a convivência civil.
Caminhar livre e independente
“A palavra ‘cazaque’ evoca precisamente o caminhar livre e independente. A tutela da liberdade, aspiração inscrita no coração de cada ser humano, única condição para que o encontro entre as pessoas e os grupos seja real e não artificial, traduz-se na sociedade civil principalmente através do reconhecimento dos direitos, acompanhados pelos deveres”, afirmou o Pontífice.
Francisco manifestou o seu apreço pela afirmação do valor da vida humana através da abolição da pena de morte no Cazaquistão, em nome do direito à esperança para todo e cada um dos seres humanos. “É importante garantir a liberdade de pensamento, consciência e expressão, para dar espaço ao papel único e paritário que cada um reveste para o conjunto”.
Segundo o Papa, a dombra é principalmente um instrumento musical popular e, como tal, comunica a beleza de preservar o gênio e a vivacidade dum povo. Isto está confiado em primeiro lugar às autoridades civis, primeiras responsáveis pela promoção do bem comum, e realiza-se de modo especial através do apoio à democracia, que constitui a forma mais adequada para que o poder se traduza em serviço a favor de todo o povo, e não só de alguns.
Empenho global pela paz
Pensando precisamente no empenho global pela paz, Francisco exprimiu vivo o apreço pela renúncia às armas nucleares empreendida com determinação por este país; bem como pelo desenvolvimento de políticas energéticas e ambientais centradas na descarbonização e no investimento em fontes limpas, que há cinco anos pôs em destaque a Exposição Internacional.
Para o Papa, juntamente com a solicitude pelo diálogo inter-religioso, estas são sementes concretas de esperança plantadas no terreno comum da humanidade, “que cabe a nós cultivar para as gerações vindouras; para os jovens, a cujos desejos é preciso olhar ao empreender as decisões de hoje e de amanhã”.
Por fim, o Pontífice assegurou que os católicos, presentes na Ásia Central desde tempos antigos, desejam continuar a testemunhar o espírito de abertura e diálogo respeitoso que caracteriza esta terra.