Papa Francisco presidiu a missa desta quarta-feira de Cinzas na Basílica de Santa Sabina
Denise Claro
Da redação
Nesta quarta-feira de cinzas, 6, o Papa Francisco presidiu a Santa Missa com o rito de bênção e imposição das Cinzas na Basílica de Santa Sabina, em Roma.
A celebração aconteceu após a procissão penitencial com a primeira das estações quaresmais, que teve início na Igreja de Santo Anselmo. Participaram da procissão cardeais, arcebispos, bispos, fiéis e também os monges beneditinos de Santo Anselmo e os padres dominicanos de Santa Sabina.
O Pontífice iniciou sua homilia citando um trecho da primeira leitura “Tocai a trombeta em Sião, ordenai um jejum” (Jl 2, 15), e afirmando que este som estridente que abre o tempo da Quaresma é um som intenso, capaz de abrandar o ritmo da vida de cada fiel, sempre dominada pela pressa, mas que muitas vezes não sabe bem para onde vai:
“É um apelo a deter-se para ir ao essencial, a jejuar do supérfluo que distrai. É um despertador da alma. Ao som deste despertador segue-se a mensagem que o Senhor transmite pela boca do profeta, uma mensagem breve e veemente: ‘Voltai para Mim’ (2, 15). Voltar. Se devemos voltar, isso quer dizer que a direção seguida não era justa. A Quaresma é o tempo para reencontrar a rota da vida.”
Leia mais
.: Íntegra da Homilia da Missa de Quarta-feira de Cinzas
Francisco lembrou que, no caminho da vida, o que conta é não perder de vista a meta: “Quando o que interessa na viagem é ver a paisagem ou parar a comer, não se vai longe. Cada um de nós pode interrogar-se: no caminho da vida, procuro a rota? Ou contento-me de viver o dia a dia, pensando apenas em sentir-me bem, resolver alguns problemas e divertir-me um pouco? Qual é a rota? Talvez a busca da saúde, que hoje muitos dizem vir em primeiro lugar, mas mais cedo ou mais tarde faltará? Porventura a riqueza e o bem-estar? Mas não é para isso que estamos no mundo. Voltai para Mim, diz o Senhor. Para Mim: o Senhor é a meta da nossa viagem no mundo. A rota deve ser ajustada na direção d’Ele.”
O Papa refletiu sobre o sentido das cinzas, que ajuda os cristãos a encontrar a rota, como um sinal que faz pensar:
“De tantas coisas que trazes na cabeça, atrás das quais corres e te afadigas diariamente, nada restará. Por mais que te afadigues, não levarás contigo qualquer riqueza da vida. As realidades terrenas dissipam-se como poeira ao vento. Os bens são provisórios, o poder passa, o sucesso declina. A cultura da aparência, hoje dominante e que induz a viver para as coisas que passam, é um grande engano. Pois é como uma fogueira: uma vez apagada, ficam apenas cinzas. A Quaresma é o tempo para nos libertarmos da ilusão de viver correndo atrás de pó. A Quaresma é descobrir que somos feitos para o fogo que arde sempre, não para a cinza que imediatamente se some; para Deus, não para o mundo; para a eternidade do Céu, não para o engano da terra; para a liberdade dos filhos, não para a escravidão das coisas. Hoje podemos interrogar-nos: De que parte estou? Vivo para o fogo ou para as cinzas?”
Na viagem de regresso ao essencial que é a Quaresma, o Evangelho propõe três etapas, que Deus pede para percorrer sem hipocrisia nem ficção: a esmola, a oração, o jejum.
O Santo Padre lembrou aos fiéis que essas etapas reconduzem às únicas três realidades que não se dissipam. A oração liga-nos a Deus; a caridade, ao próximo; o jejum, a ‘nós mesmos’.
“Deus, os irmãos, a minha vida: tais são as realidades, que não acabam em nada e sobre as quais é preciso investir. Eis para onde nos convida a olhar a Quaresma: para o Alto, com a oração, que liberta duma vida horizontal e rastejante, onde se encontra tempo para si próprio, mas se esquece Deus. E depois para o outro, com a caridade, que liberta da nulidade do ter, de pensar que as coisas estão bem se para mim correm bem. Por último, convida-nos a olhar para dentro de nós mesmos, com o jejum, que liberta do apego às coisas, do mundanismo que anestesia o coração. Oração, caridade, jejum: três investimentos num tesouro que dura.”
Citando o Evangelho, Francisco falou sobre o tesouro. O coração aponta sempre para uma direção: é como uma bússola que sempre procura a orientação.
“Podemos também compará-lo a um ímã: precisa de se apegar a qualquer coisa. Mas, quando se apega só às coisas terrenas, mais cedo ou mais tarde torna-se escravo delas: as coisas de que nos servimos passam a coisas às quais servimos. O aspeto exterior, o dinheiro, a carreira, os passatempos: se vivermos para eles, tornar-se-ão ídolos que nos usam, sereias que nos encantam e, em seguida, nos deixam à deriva. Ao contrário, se o coração se apega ao que não passa, encontramo-nos a nós mesmos e tornamo-nos livres. Quaresma é tempo de graça para libertar o coração das nulidades; é tempo de cura de dependências que nos seduzem; é tempo de fixar o olhar naquilo que resta.”
O Papa afirmou que o olhar do cristão ao longo do caminho da Quaresma deve estar no Crucificado, em Jesus, bússola da vida, que orienta para o Céu.
“A pobreza do lenho, o silêncio do Senhor, a sua nudez por amor mostram-nos a necessidade duma vida mais simples, livre da azáfama excessiva pelas coisas. Da cruz, Jesus ensina-nos a coragem esforçada da renúncia. Pois, carregados com pesos embaraçantes, nunca iremos para diante. Precisamos nos libertar dos tentáculos do consumismo e dos laços do egoísmo, de querer sempre mais, de não nos contentarmos jamais, do coração fechado às necessidades do pobre. Jesus, abrasado de amor no lenho cruz, chama-nos a uma vida inflamada por Ele, que não se perde entre as cinzas do mundo; uma vida que arde de caridade, e não se apaga na mediocridade.”
Ao final, Francisco lembrou que este tempo litúrgico começa nas cinzas, mas termina no fogo da noite da Vigília Pascal:
“É difícil viver como Ele pede? Sim, mas conduz à meta. No-lo mostra a Quaresma. Esta começa com as cinzas, mas leva-nos no final ao fogo da noite da Vigília Pascal, a descobrir que, no sepulcro, a carne de Jesus não se torna cinza, mas ressuscita gloriosa. O mesmo vale para nós, que somos pó: se voltarmos ao Senhor com as nossas fragilidades, se tomarmos o caminho do amor, abraçaremos a vida que não tem ocaso. E viveremos na alegria.”