Há décadas, vemos uma diminuição da prática religiosa e percebemos o afastamento de grande número de batizados da vida da Igreja, disse o Papa Bento XVI no encontro com os católicos comprometidos na Igreja e na sociedade, em Friburgo, neste domingo, 25, último dia de sua viagem à Alemanha.
Diante dessa situação, surge a pergunta: Porventura não deverá a Igreja mudar? Não deverá ela, nos seus serviços e nas suas estruturas, adaptar-se ao tempo presente, para chegar às pessoas de hoje que vivem em estado de busca e na dúvida?
O Santo Padre recordou um pequeno episódio que traz dois ensinamentos. “Uma vez alguém pediu a beata Madre Teresa para dizer qual seria, segundo ela, a primeira coisa a mudar na Igreja. A sua reposta foi: tu e eu!”.
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Em primeiro lugar, essa resposta diz que “a Igreja não são apenas os outros ou a hierarquia…, mas somos todos nós, os batizados”. Por outro lado, a religiosa parte do pressuposto de que há uma necessidade de mudança, por isso “cada cristão e a comunidade dos crentes são chamados a uma contínua conversão”.
Mas como acontecerá essa mudança? reflete o Papa. Para ele, o motivo fundamental da mudança é a “missão apostólica” dos discípulos e da própria Igreja, que “deve verificar incessantemente a sua fidelidade a esta missão”.
Desmundanizar a Igreja
Bento XVI disse que, devido às pretensões e condicionamentos do mundo, o testemunho cristão muitas vezes fica ofuscado e a mensagem do Evangelho acaba relativizada. E explicou que “para cumprir a sua missão, ela [a Igreja] deverá continuamente manter a distância do seu ambiente, deve por assim dizer ‘desmundanizar-se'”.
A Igreja, afirma o Papa, encontra o seu sentido exclusivamente no compromisso de “ser instrumento da redenção, de permear o mundo com a palavra de Deus e de transformá-lo introduzindo-o na união de amor com Deus”.
Entretanto, ao longo do desenvolvimento da Igreja, muitas vezes manifestou-se uma tendência contrária a isso: a de uma Igreja que se acomoda neste mundo, torna-se autossuficiente e se adapta aos critérios do mundo. “Deste modo, dá uma importância maior, não ao seu chamamento à abertura, mas à organização e à institucionalização”, apontou.
“Para corresponder à sua verdadeira tarefa, a Igreja deve esforçar-se sem cessar por destacar-se da mundanidade do mundo. Assim fazendo, ela segue as palavras de Jesus: ‘Eles não são do mundo, como também Eu não sou do mundo’ (Jo 17, 16)”, destacou Bento XVI.
Segundo ele, a história, em certo sentido, vem em auxílio da Igreja com as diversas épocas de secularização, que contribuíram de modo essencial para sua purificação e reforma interior. “As secularizações… sempre significaram uma profunda libertação da Igreja de formas de mundanidade: despojava-se, por assim dizer, da sua riqueza terrena e voltava a abraçar plenamente a sua pobreza terrena”.
Os exemplos históricos mostram que o testemunho missionário de uma Igreja “desmundanizada” refulge de modo mais claro. “Liberta do seu fardo material e político, a Igreja pode dedicar-se melhor e de modo verdadeiramente cristão ao mundo inteiro, pode estar verdadeiramente aberta ao mundo. Pode de novo viver, com mais agilidade, a sua vocação ao ministério da adoração de Deus e ao serviço do próximo”, afirmou o Papa.
Escândado da cruz
Bento XVI afirmou que, a fé cristã constitui, ainda hoje, um escândalo para o homem. “[Crer] que o Deus eterno se preocupe conosco, seres humanos, e nos conheça; que o Inatingível, num determinado momento, se tenha colocado ao nosso alcance; que o Imortal tenha sofrido e morrido na cruz; que nos sejam prometidas a nós, seres mortais, a ressurreição e a vida eterna – crer em tudo isto é para nós, homens, uma verdadeira presunção”.
Este escândalo – destacou o Santo Padre -, que não pode ser abolido se não se quer abolir o cristianismo, “foi infelizmente encoberto por outros tristes escândalos dos anunciadores da fé”. “Cria-se uma situação perigosa, quando estes escândalos ocupam o lugar do ‘skandalon’ primordial da Cruz tornando-o assim inacessível, isto é, quando escondem a verdadeira exigência cristã por trás da incongruência dos seus mensageiros”.
Força da fé cristã
Há mais uma razão para pensar que seja novamente a hora de tirar corajosamente o que há de mundano na Igreja, ressaltou o Papa. “Isto não significa retirar-se do mundo. Uma Igreja aliviada dos elementos mundanos é capaz de comunicar aos homens, precisamente no âmbito sóciocaritativo – tanto aos que sofrem como àqueles que os ajudam –, a força vital particular da fé cristã”.
“Certamente também as obras caritativas da Igreja devem continuamente prestar atenção à necessidade duma adequada separação do mundo, para evitar que, devido a um progressivo afastamento da Igreja, se sequem as suas raízes. Só a relação profunda com Deus torna possível uma atenção plena ao homem, tal como sem a atenção ao próximo se empobrece a relação com Deus”, pontualizou.
Para a Igreja “desmundanizada”, ser aberta às vicissitudes do mundo significa testemunhar segundo o Evangelho, com palavras e obras, aqui e agora a soberania do amor de Deus. “Esta tarefa remete ainda para além do mundo presente: de fato, a vida presente inclui a ligação com a vida eterna. Como indivíduos e como comunidade da Igreja, vivemos a simplicidade dum grande amor que, no mundo, é simultaneamente a coisa mais fácil e a mais difícil, porque requer nada mais nada menos que o doar-se a si mesmo”, concluiu.
Após o encontro, o Santo Padre se dirigiu ao Aeroporto de Lahr, onde participará da cerimônia de despedida, antes de retornar a Roma.
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