Segundo a CNBB, todos devem assumir, com coragem e determinação, o compromisso de rever caminhos e decisões que, ao longo da história, só têm excluído e condenado os pobres à miséria e à morte.
A Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, contribui para definir a agenda do desenvolvimento sustentável para as próximas décadas. A proposta brasileira de sediar a Rio+20 foi aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua 64ª Sessão, em 2009.
O objetivo da Conferência é a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do progresso e das lacunas na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto e do tratamento de temas novos e emergentes. Leia abaixo a íntegra da mensagem:
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“O Senhor Deus tomou o Homem e o colocou no jardim de Éden, para o cultivar e guardar” (Gn 2,15).
A Conferência das Nações Unidas Rio +20, sobre o desenvolvimento sustentável, acolhida pelo Brasil neste mês de junho, carrega consigo a irrenunciável responsabilidade de responder aos anseios e expectativas mundiais em relação à defesa e promoção de toda forma de vida, especialmente a humana, desde sua concepção até seu término natural.
A crise econômica, financeira e social por que passam as grandes potências da economia mundial, com graves consequências para as nações emergentes, emoldura a Rio +20. Considerada, por causa de sua profundidade e alcance, como uma crise de civilização, esta crise “interpela todos, pessoas e povos, a um profundo discernimento dos princípios e dos valores culturais e morais que estão na base da convivência social”. Entre suas múltiplas causas está “um liberalismo econômico sem regras e incontrolado” (Nota do Pontifício Conselho Justiça e Paz sobre o sistema financeiro).
É urgente repensar nossa relação com a natureza, que “nos precede, tendo-nos sido dada por Deus como ambiente de vida” e está à nossa disposição “não como um lixo espalhado ao acaso, mas como um dom do Criador” (Bento XVI – Caritas in Veritate, n. 48). Se, por um lado, como nos recorda o Papa Bento XVI, é “lícito ao homem exercer um governo responsável sobre a natureza para guardá-la, fazê-la frutificar e cultivá-la, inclusive com formas novas e tecnologias avançadas, para que possa acolher e alimentar condignamente a população que a habita”, por outro, é preciso que “a comunidade internacional e os diversos governos saibam contrastar, de maneira eficaz, as modalidades de utilização do ambiente que sejam danosas para o mesmo” (Bento XVI – Caritas in Veritate, n. 50).
Os bispos da América Latina e Caribe, reunidos em Aparecida em 2007, já denunciavam: “com muita frequência se subordina a preservação da natureza ao desenvolvimento econômico, com danos à biodiversidade, com o esgotamento das reservas de água e de outros recursos naturais, com a contaminação do ar e a mudança climática” (V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe – Documento de Aparecida n. 66).
O cuidado com a natureza e com a vida, que nela brota e dela depende, passa pelo reconhecimento de que é dever de todos, especialmente dos dirigentes das nações, garantir a estas e às futuras gerações a casa comum – o Planeta Terra – livre de toda destruição. Essa meta só se alcançará com a subordinação do desenvolvimento econômico à justiça social, no respeito à pessoa, à natureza e aos povos. Para tanto, é necessário que todos, especialmente os dirigentes mundiais, assumam com coragem e determinação, o compromisso de rever caminhos e decisões que, ao longo da história, só têm excluído e condenado os pobres à miséria e à morte. Para a erradicação da fome e da miséria, "não se trata de diminuir o número dos convidados para o banquete da vida, mas de aumentar a comida na mesa”, como já nos alertou o Papa Paulo VI (cf. Homilia de João Paulo II em Puebla, 1979).
A Cúpula dos Povos, organizada pela sociedade civil e realizada concomitantemente à Rio +20, tem a importante tarefa de reafirmar a responsabilidade dos dirigentes das nações pelas graves consequências de uma opção equivocada, ao subjugar o desenvolvimento econômico ao domínio do mercado e do lucro, desconsiderando tanto a natureza quanto a vida e a cultura dos povos.
A Igreja no Brasil, especialmente através da Campanha da Fraternidade, tem chamado constantemente a atenção para a destruição da natureza provocada por um desenvolvimento econômico predatório, alimentado por um sistema produtivo e um estilo de vida consumista, muitas vezes, também predatórios. As consequências são, dentre outras, o desmatamento, a contaminação e escassez da água e as mudanças climáticas. Os que mais sofrem os impactos de tudo isso são os pobres e excluídos.
É imperioso que nos eduquemos para relações novas e éticas com o meio ambiente. Esta é uma meta imprescindível da Rio +20, que não deve desviar-se de sua real e concreta finalidade.
A Rio +20 indica uma resposta a essas questões com a chamada Economia verde. Se esta, em alguma medida, significa a privatização e a mercantilização dos bens naturais, como a água, os solos, o ar, as energias e a biodiversidade, então ela é eticamente inaceitável. Não podemos nos contentar com uma roupagem nova para proteger o insaciável mercado, que só tem olhos para o lucro, configurando-se como “lobo em pele de cordeiro” ao manter inalteradas as causas estruturais da crise ambiental.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB espera que, da Rio +20, brote o compromisso de construção de um “modelo de desenvolvimento alternativo, integral e solidário, baseado em uma ética que inclua a responsabilidade por uma autêntica ecologia natural e humana, que se fundamenta no evangelho da justiça, da solidariedade e do destino universal dos bens e que supere a lógica utilitarista e individualista, que não submete os poderes econômicos e tecnológicos a critérios éticos” (V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe – Documento de Aparecida n. 474c).
Esse compromisso deve ser assumido por todos. Os cristãos, de modo especial, movidos pela solidariedade, que gera fraternidade e comunhão, são convocados a trabalhar pela preservação do meio ambiente e a colaborar na construção de uma sociedade justa, ecologicamente sustentável.
Que Deus, o Criador de todas as coisas, se digne abençoar seus filhos e filhas nesta nobre missão de “cultivar e guardar” a terra, lugar de vida para todos (cf. Gn 2,15).
Cardeal Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da CNBB
Dom José Belisário da Silva
Arcebispo de São Luís do Maranhão
Vice-Presidente da CNBB
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário Geral da CNBB