Cantalamessa

Cristo está com a Igreja todos os dias, frisa última pregação da Quaresma

O pregador da Casa Pontifícia, Cardeal Raniero Cantalamessa, ministrou a última meditação da Quaresma à Cúria Romana

Da redação, com VaticanNews

Última pregação da Quaresma à Cúria Romana, não contou com a presença do Papa, que está hospitalizado / Foto: Reprodução VaticanNews

Nesta sexta-feira, 31, a Cúria Romana participou da quinta e última pregação da Quaresma, ministrada pelo pregador da Casa Pontifícia, Cardeal Raniero Cantalamessa, OFMCap.

No início da pregação, o purpurado convidou os presentes a fazerem uma oração pelo Papa Francisco que se encontra internado no Hospital Policlínico Gemelli. A Santa Sé informou que o Santo Padre deve ter alta neste sábado, 1º de abril.

Esta quinta pregação foi intitulada “Tende coragem, eu venci o mundo!”, palavras que estão entre as últimas ditas por Jesus aos discípulos, antes de se despedir deles (cf. Jo 16,33). Cantalamessa explicou que este “tende coragem!” não é aquele habitual dito por alguém que está prestes a partir, pois Jesus também disse: “Não vos deixarei órfãos, venho a vós” (Jo 14,18).

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.: Íntegra da quinta pregação da Quaresma, do Cardeal Cantalamessa

O pregador questionou, então, o que significa esse “venho a vós” – se está para deixá-los – e de que modo e com que veste virá e permanecerá com os discípulos. Segundo Cantalamessa, se a resposta a esta pergunta não for compreendida, jamais será entendida a verdadeira natureza da Igreja.

O cardeal explica que esta resposta está presente de forma recorrente nos discursos de adeus, do Evangelho de João. Cantalamessa citou os versículos que fazem essa referência e destacou a importância de escutá-los seguidamente.

Espírito de Cristo

Jesus promete que enviará o Espírito Santo, mas hora Ele fala em primeira pessoa – “venho a vós” – ora em terceira pessoa – “quando vier o Paráclito”.

“O que é e quem é o Espírito Santo que Ele promete? É Ele mesmo, Jesus, ou um outro?”, refletiu o pregador.

“Tocamos o mistério da relação entre o Ressuscitado e o seu Espírito. Relação tão estreita e misteriosa, que São Paulo parece às vezes identificá-los. Escreve, de fato: ‘O Senhor é o Espírito’, mas logo acrescenta sem solução de continuidade: ‘e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade’ (2Cor 3,17). Se é o Espírito do Senhor, não pode ser, pura e simplesmente, o Senhor”, afirma.

Cantalamessa destacou que a resposta da Escritura é que o Espírito Santo, com a redenção, tornou-se “o Espírito de Cristo”. “É o modo com que o Ressuscitado assim opera na Igreja e no mundo, tendo sido, ‘segundo o Espírito de santidade, constituído Filho de Deus com poder, desde a ressurreição dos mortos’ (Rm 1,4). Eis porque Ele pode dizer aos discípulos: ‘É bom para vós que eu vá’ e acrescentar: ‘não vos deixarei órfãos'”, explica.

“Estou convosco até o fim dos tempos”

O cardeal afirmou que é preciso libertar-se completamente de uma visão da Igreja “deísta ou cartesiana”, que concebe a relação entre Deus e o mundo de uma forma distante. Como se, no início, Deus criasse o mundo e depois se retirasse, deixando-o se desenvolver por conta própria. Nesta visão, cada intervenção de Deus atrapalharia a ordem por Ele criada e os milagres seriam inadmissíveis.

Mas não é assim, afirma. “Jesus subiu no barco e está dentro dele. É preciso levar a sério as suas últimas palavras, em Mateus: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28,20)”.

Cantalamessa destacou que em cada tempestade, inclusive, as cotidianas, é preciso recordar as palavras de Jesus aos apóstolos (cf. Mt 8,26), quando questiona “Porque tendes medo?”. Aqui, o cardeal convidou à reflexão: “Pode afundar no mar aquele que criou o mar?”. E afirmou: “Cristo jamais se ausentou e jamais se ausentará da sua Igreja. Com a sua morte e ressurreição, ele se tornou ‘Cabeça do corpo, que é a Igreja (Cl 1,18), e assim continuará a ser até o fim dos tempos: o verdadeiro e único Senhor da Igreja”.

Poder do Alto

O pregador explicou que a presença espiritual de Jesus é infinitamente mais real e eficaz do que foi sua presença física. “É a presença dele ressuscitado, que age no poder do Espírito, age em todo tempo e lugar, e age dentro de nós.”

Utilizando uma metáfora, Cantalamessa destacou como seria um alívio para a humanidade se, diante da crescente crise energética, houvesse a descoberta de uma fonte de energia inesgotável. E afirmou que a Igreja tem uma semelhante fonte inesgotável de energia: o poder do Alto, que é o Espírito Santo.

“Jesus pôde dizer dele: ‘Até agora, nada pedistes em meu nome. Pedi e recebereis, para que vossa alegria seja completa’ (Jo 16,24)”, destacou.

Sair e reconstruir a casa de Deus

O cardeal recordou que há um momento na história da salvação que se aproxima das palavras de Jesus na última ceia. Trata-se no oráculo do profeta Ageu (cf. 2, 1-5). Um dos poucos tempos do Antigo Testamento que pode ser datado com precisão.

Nesta citação, o profeta Ageu faz uma exortação ao povo: “Sê forte – oráculo do Senhor – e trabalhai! Meu espírito permanecerá em vosso meio”.

Cantalamessa afirmou que a Palavra de Deus, uma vez pronunciada, volta a ser ativa e atual cada vez que é novamente proclamada. Citando também um oráculo precedente (cf. Ag 1, 2-9), o pregador afirmou que “somos nós agora este povo ao qual é dirigida a Palavra de Deus”.

Nesta citação, o profeta fala sobre as “casas revestidas”, nas quais a pessoa é tentada a permanecer tranquila. O cardeal Cantalamessa destacou, então, três tipos de “casas concêntricas”, das quais é preciso sair para subir ao monte e reconstruir a casa de Deus.

Três casas concêntricas

A primeira é o “meu eu”. Este é o muro mais difícil de derrubar e o melhor dissimulado, pois é muito fácil a própria honra se passar pela honra de Deus e da Igreja.

A segunda casa é a “minha paróquia, minha ordem religiosa, movimento ou associação eclesial, minha Igreja local, minha diocese…”. Cantalamessa afirmou que é preciso ter amor e zelo por estas realidades particulares, mas o errado é absolutizá-las e perder de vista a catolicidade da Igreja.

A terceira casa é “a denominação cristã particular a que pertencemos”. Ele afirmou que todos têm convicção de que parte da fraqueza da evangelização e ação no mundo deve-se à divisão recíproca entre cristãos.

“Não podemos nos contentar, certamente, com esta unidade tão vasta, mas tão vaga. E isto justifica o empenho e o confronto, também doutrinal, entre as Igrejas. Mas nem mesmo podemos desprezar e não levar em conta esta unidade de base que consiste em invocar o mesmo Senhor Jesus Cristo. Quem crê no Filho de Deus, crê também no Pai e no Espírito Santo”, enfatizou.

Coragem e trabalhai

Cantalamessa destacou, por fim, que o Oráculo de Ageu sobre o templo reconstruído conclui-se com uma promessa radiosa: “Maior será a glória desta futura Casa do que da primeira, diz o Senhor dos exércitos. E neste lugar darei a paz, oráculo do Senhor dos exércitos” (Ag 2,9).

O cardeal contou sua experiência pessoal com esse Oráculo do profeta Ageu, que em vários momentos tornou-se “palavra viva”. Concluiu sua pregação proclamando-a novamente.

“Hoje, ouso proclamar de novo aquela palavra, sabendo que não se trata de uma simples citação, mas de uma palavra sempre viva, que volta a operar toda vez aquilo que promete. Portanto, coragem, Papa Francisco! Coragem irmãos cardeais, bispos, sacerdotes e fiéis da Igreja Católica, e trabalhai, pois eu estou convosco, diz o Senhor. O meu Espírito estará convosco!”.

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