Preservação

Dia da Amazônia: biólogo fala sobre as ameaças ao 'pulmão do mundo'

Apesar das diversas ameaças, a Amazônia esconde benefícios e riquezas que sequer foram explorados em sua totalidade

Thiago Coutinho
Da Redação

Nesta quarta-feira, 5, celebra-se o Dia da Amazônia, floresta que é considerada o pulmão do mundo. Com sua biodiversidade incomparável, a floresta amazônica é responsável pela manutenção dos serviços essenciais ao meio ambiente e ecossistema.

Além do Brasil, a Amazônia compreende outros países, como Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Equador, Suriname, Guiana e Guiana Francesa. São 5,5 milhões de quilômetros quadrados de biodiversidade e fauna de valor inestimável à humanidade (veja mais no quadro abaixo).

Mas este imenso tesouro da natureza está sob forte ameaça. Segundo estudo realizado por biólogos da Fundação das Nações Unidas, o desmatamento na região amazônica pode não ter volta. Explica-se: isto acontece quando a área desmatada supera 20% de sua área original. Segundo esta pesquisa, a Amazônia teve 17% de sua área original destruída no último meio século.   

E os fatores que levam a este cenário são muitos. De acordo com o biólogo e professor do Departamento de Biologia da Universidade de Taubaté (Unitau), no interior de São Paulo, Júlio Voltolini, o extrativismo vegetal, mineral e a pecuária são alguns dos principais problemas que acometem atualmente a região amazônica. “Mais de 90% do mercado brasileiro é abastecido por madeira ilegal. Não toda ela da Amazônia, mas boa parte vem de lá”, alerta o biólogo.

Voltolini também atenta para o modo como a pecuária é exercida na Amazônia. Ele explica que os fazendeiros derrubam e destroem completamente a floresta para criar espaços para confinar o gado. “Não é deixado nada, a floresta é derrubada por tratores gigantescos”, diz.

Já o extrativismo mineral é ainda mais danoso, sobretudo por conta das vidas que são perdidas nos locais em que ele é praticado, pois o mercúrio utilizado nesta prática contamina e mata os índios que lá vivem. “O mercúrio vai parar na água, os índios ingerem peixes com altos níveis de mercúrio. Eles começam a ingerir esses peixes com altos índices de metais pesados e passam a desenvolver câncer”, lamenta o biólogo.

O custo disto para a natureza é inestimável. A medicina, por exemplo, deixa de produzir remédios e drogas contra diversas doenças, já que a base para muitos desses remédios vem das plantas. “Quando você destrói a floresta amazônica, destrói uma biblioteca gigantesca de remédios que poderiam ser utilizados por empresas de alta tecnologia para curar doenças gravíssimas”, adverte.

Outro dano irreparável causado pela devastação da floresta amazônica pode ser percebido no meio ambiente. Como não há mais árvores e vegetais para absorver o calor, as mudanças climáticas se tornam inevitáveis.

“Se você retira a floresta, a temperatura sob o solo naqueles locais vai se tornar mais alta, já que não há mais proteção. Se não tenho mais esta floresta, a evaporação da água aumenta e nuvens são formadas em locais que não deveriam. Ocorrem chuvas onde não deveriam e nuvens migram para locais que não deveriam. Por isso dizemos que, na verdade, a Amazônia é o ar-condicionado da América do Sul por conta das mudanças climáticas que podem acontecer se a tirarmos de lá”, detalha Voltolini.

Uma mina de ouro

A Amazônia tem um potencial econômico imensurável. Pode ser fonte alimentação com suas centenas de frutas, sementes e pescados. As plantas são riquíssimas e atualmente utilizadas pela indústria de cosméticos e os remédios. “Várias drogas para cura de diversas doenças já são feitas a partir de plantas. E muitas delas são completamente desconhecidas dos pesquisadores”, revela Voltolini.

O biólogo afirma que há laboratórios internacionais que investem pesado nas pesquisas dessas plantas e na capacidade de cura de inúmeras doenças que podem ser encontradas nelas. “Enquanto isso, o investimento do Brasil neste sentido é muito tímido e precisamos mudar isto. Temos alimento, remédios e o turismo. Ainda engatinhamos também no turismo e acredito que esta poderia ser uma tática de conservação não só da Amazônia, mas também de outros biomas”, assegura Voltolini.

A presença da Igreja

A Igreja Católica também reconhece o quanto a degradação não só da Amazônia, mas também de seus habitantes, pode ser ruim. Com isto em mente, será realizado em outubro de 2019 o Sínodo para Amazônia. Trata-se de uma resposta do Papa Francisco à realidade da Pan-Amazônia.

“Nós acreditamos que muita coisa bonita está por vir com a realização do Sínodo para a Amazônia. Só esse movimento de escuta, que o Papa Francisco faz, de querer ouvir todos os povos da Amazônia, já nos traz uma grande mobilização da Igreja e contribui para a comunhão, quando nos coloca em processo de sínodo”, diz Irmã Maria Irene Lopes dos Santos, assessora da Comissão Episcopal para a Amazônia (CNBB) e Secretária Executiva da Rede Eclesial Pan-Amazônia (REPAM-Brasil).

Para Irmã Maria, este Sínodo será uma manifestação clara do que o povo quer para a Amazônia. “É a partir dos clamores que emergirem do povo que será produzido o Documento de Trabalho que orientará toda a Assembleia Sinodal. Por isso, é tão importante a participação e organização dos territórios para as escutas locais”, afirma.

E os temas não serão centrados apenas no desmatamento predatório que assola o solo amazônico, “mas as diversas questões ambientais e ecológicas que afetam a vida do planeta e das populações que habitam a Amazônia”, detalha a assessora e secretária-executiva da CNBB. “É impossível não discutir as ações das empresas mineradoras e madeireiras; tratar do avanço do agronegócio capitalista como um trator que derruba casas e árvores, jardins e roças de ribeirinhos e de povos indígenas; problematizar as motosserras, plantações de soja, exploração de minérios e o impacto da mineração, das hidrelétricas”, detalha.

Irmã Maria garante que a voz do povo será ouvida e atendida. Esta é uma premissa que foi exigida pelo próprio Papa Francisco. “Esse é um desejo expresso do próprio Papa Francisco, de que o povo precisa ter voz, precisa dizer, e nós temos que escutar. É muito bonito ir até uma comunidade, realizar uma assembleia territorial e ouvir dos quilombolas, dos indígenas, dos ribeirinhos, das quebradeiras de coco, dos atingidos por mineradoras que ‘o Papa se preocupa com a gente’, ou que ‘o Papa quer nos ouvir’”, finaliza.

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