Entre todas as procissões, a do Corpus Christi tornou-se a mais participada e solene, afirma Dom Armando Bucciol
Da redação, com CNBB
Nesta quinta-feira, 31, a Igreja Católica celebra a solenidade do “Corpo e Sangue de Cristo”, mais conhecida com o ‘título’ em latim, Corpus Christi.
O presidente da Comissão para a Liturgia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Armando Bucciol, relembra a origem desta solenidade e todo o caminho percorrido até ela tornar-se a procissão mais solene e com maior participação popular.
Origem da Solenidade de Corpus Christi
Segundo Dom Armando, a origem da Festa de Corpus Christi se coloca num tempo em que refloresce o culto à divina Eucaristia, entre os séculos 11 e 12. A Bélgica – cidade de Liège (ou Lieja) – foi o centro propulsor.
Em 1208, a beata Juliana de Rétine, do mosteiro do Monte Cornélio, teve uma primeira visão que foi interpretada como se faltasse uma solenidade em honra do Santíssimo Sacramento. Muito decisivo foi o apoio do seu diretor espiritual, João de Lausanne, cônego de Liège, de Ugo de São Caro, em seguida cardeal, e de Tiago Pantaleone, arci-diácono de Liège e futuro papa Urbano IV.
Segundo Dom Armando, a celebração da festa em honra do Corpus Domini (Corpo do Senhor) começou pela insistência de João de Lausanne, junto ao bispo de Liège, Roberto de Thorote. Foi aí que o prelado aceitou a proposta e assim, em 1246, na quinta-feira após a festa da Santíssima Trindade, a celebração se deu, em Liège. “Urbano IV demorou antes de propor a celebração da festa à Igreja universal. Um fato, talvez foi de incentivo para tomar a decisão, o milagre de Bolsena, uma hóstia sangrando nas mãos de um padre que duvidava da presença eucarística”, conta Dom Armando.
Em junho de 1264, Dom Armando relata que o papa acolheu o corporal ensanguentado de Bolsena, e no dia 11 de agosto, do mesmo ano, instituiu a festa para toda a Igreja, publicando a Bula Transiturus. Nela, lembrava também da visão da beata Juliana. Pouco depois, o papa celebrou a festa na cidade de Orvieto, com grande solenidade e participação popular. “Com rapidez, começando por diversas cidades da Bélgica, da França, da Alemanha e da Itália, a celebração se expandiu. A súbita morte do papa Urbano, em 2 de outubro de 1264 impediu que a celebração tivesse maior e mais repentina difusão”, diz Dom Armando.
Na sequência, em 1314, Dom Armando explica que o papa Clemente V confirmou a Bula de Urbano IV e, logo depois, com o papa João 22, a festa foi acolhida pela Igreja toda. Nessa difusão, destaca-se o incentivo provindo dos mosteiros. “Na Bula do papa Urbano, não se fala, de forma explícita, da procissão. O texto pontifício, porém, é tão solene que parece desejar que aconteça. Os historiadores observam que o surpreendente e espontâneo fervor popular, rapidamente, tornou a celebração sempre mais acolhida, ao ponto que, pelo meado do século 14, a festa, com a procissão, é celebrada na Igreja toda”, explica o bispo.
Procissão Eucarística
No início, Dom Armando garante que a procissão era facultativa, mas ao longo do tempo tornou-se “o elemento mais solene da celebração, com o apoio do clero e a participação do povo”: “As crônicas da época relatam que o Santíssimo é levado em procissão, no início, dentro de relicários, junto com as relíquias do Santo da Cidade, ou em cálices ou píxides. Em alguns lugares, isso continuará até o século 18, quando se encontra a proibição de juntar, na procissão, a Eucaristia com as relíquias dos santos”.
Não passou muito tempo e, para a exposição do Santíssimo e a procissão, Dom Armando conta que apareceram os ostensórios que se tornaram artísticos e de grande tamanho. Em Gênova, por exemplo, para carregar o ostensório (de 1553), precisavam oito padres. “A devoção eucarística é alimentada pela presença de numerosas Confrarias do Santíssimo Sacramento, que nascem já no século 13 e se multiplicam no século 14”, diz o bispo.
Entre todas as procissões, Dom Armando afirma que a do Corpus Christi tornou-se a mais participada e solene, apesar das limitações e ambiguidades que comporta tal manifestação popular. “As raízes da ambiguidade se encontram ainda no início. Na época, o desejo de ‘ver a hóstia’ era considerado como o ato de fé mais importante, enquanto o sentido da comunhão ao Corpo do Senhor tinha-se quase perdido. Somente em tempos mais recentes se retoma, na teologia e na vida cristã, a centralidade da celebração eucarística; nela, de fato, o culto à divina Eucaristia deve encontrar seu fundamento. Se desligar de sua nascente, as sagradas espécies perdem a ligação com o mistério pascal, memorial da paixão, morte e ressurreição do Senhor”, afirma o bispo.
Hoje, de acordo com Dom Bucciol, a Igreja recomenda que o culto eucarístico manifeste dependência e referência à celebração, e na solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, a procissão seja “um sinal de fé e de adoração da comunidade”. “Recomenda-se que a hóstia a ser levada em procissão seja consagrada na mesma missa; os cantos e as orações deverão contribuir para que todos manifestem sua fé em Cristo, atentos somente ao Senhor. Assim, a procissão tornar-se-á um verdadeiro testemunho do Senhor que continua ‘no meio de nós’ e, pela fé dos discípulos, sinal de sua presença em nossa vida do dia-a-dia”, finaliza o bispo.