Para o Papa Bento XVI a maior ameaça à Europa não é a crise financeira, mas é a crise ética que ameaça o Velho Continente.
“Embora certos valores como a solidariedade, o serviço aos outros, a responsabilidade pelos pobres e atribulados sejam em grande parte compartilhados, todavia falta muitas vezes a força capaz de motivar e induzir o indivíduo e os grandes grupos sociais a abraçarem renúncias e sacrifícios”, salienta o Pontífice.
No encontro com os membros da Cúria Roma, nesta quinta-feira, 22, na Sala Clementina, Bento XVI ressaltou que o conhecimento e a vontade caminham, necessariamente, lado a lado. A vontade de preservar o lucro pessoal obscurece o conhecimento e este, enfraquecido, é incapaz de revigorar a vontade.
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.: NA Íntegra: Discurso do Papa à Cúria Romana – 22/12/2011
Então surgem os questionamentos: Onde está a luz que possa iluminar o conhecimento? Onde está a força que sublime a nossa vontade? Segundo o Papa, estas são questões que nova evangelização deve dar resposta.
Mas então como anunciar hoje o Evangelho? Como pode a fé, enquanto força viva e vital, tornar-se realidade hoje?
As pessoas que frequentam regularmente a Igreja vão se tornando sempre mais idosas e o número de fiéis está diminuindo continuamente. Bento XVI nota também uma estagnação nas vocações ao sacerdócio, bem como um crescimento do cepticismo e da descrença. “Então que devemos fazer?”, questiona o Papa.
“ O cerne da crise da Igreja na Europa, como disse em Friburgo, é a crise da fé. Se não encontrarmos uma resposta para esta crise, ou seja, se a fé não ganhar de novo vitalidade, tornando-se uma convicção profunda e uma força real graças ao encontro com Jesus Cristo, permanecerão ineficazes todas as outras reformas”, salienta.
Fé e felicidade africana
Em sua viagem à Benim, na África, Bento XVI disse não ter visto tédio no ser cristão, ele via alegria, mesmo em meio as dificuldades.
“E desta alegria nascem também às energias para servir Cristo nas situações opressivas de sofrimento humano, para se colocar à sua disposição em vez de acomodar-se no próprio bem-estar. Encontrar esta fé disposta ao sacrifício e, mesmo no meio destas [dificuldades], a 'alegria' é um grande remédio contra a lassidão de ser cristão que experimentamos na Europa”, afirma o Papa.
JMJ: remédio contra o desânimo da fé
O Pontífice ressalta também que um remédio contra a lassidão do crer foi também a magnífica experiência da Jornada Mundial da Juventude, em Madrid.
“Esta foi uma nova evangelização ao vivo. De forma cada vez mais clara vai-se delineando, nas Jornadas Mundiais da Juventude, um modo novo e rejuvenescido de ser cristão”, disse.
A experiência da JMJ fez o Papa identificar cinco pontos importantes:
1. Universalidade da Igreja
Para Bento XVI, a JMJ Madri mostrou que há uma nova experiência da catolicidade, da universalidade da Igreja.
“Falamos línguas diferentes e possuímos costumes de vida diversos e formas culturais diversas; e, no entanto, sentimo-nos imediatamente unidos como uma grande família. Separação e diversidade exteriores ficaram relativizadas. As nossas orações são as mesmas”, destaca o Papa.
No interior de cada um há o mesmo encontro com Jesus Cristo e a liturgia comum constitui uma espécie de pátria do coração e une todo numa grande família.
“Assim compreendemos também de maneira muito concreta que, apesar de todas as fadigas e obscuridades, é bom pertencer à Igreja universal que o Senhor nos deu”, reforça.
2. Novo modo de ser cristão
O encontro com os voluntário que trabalharam para a realização da JMJ 2011 mostrou ao Papa um novo modo de ser cristão. A maioria dos voluntários eram jovens, cerca de 20 mil, e todos eles doaram o próprio tempo e disposição para a realização daquele evento, ofereceram a própria vida.
“No fim, estes jovens estavam, visível e ‘palpavelmente’, inundados de uma grande sensação de felicidade: o seu tempo tinha um sentido; precisamente no dom do seu tempo e da sua força laboral, encontraram o tempo, a vida”, destaca o Pontífice.
Para ele, ficou evidente algo fundamental: estes jovens ofereceram, na fé, um pedaço de suas vidas, e não porque isso lhes fora mandado, nem porque se ganha o céu com isso, nem mesmo porque assim se escapa ao perigo do inferno. Mas os jovens não fizeram isso, porque queriam ser perfeitos, eles não olhavam para trás, para si mesmos.
“Quantas vezes a vida dos cristãos se caracteriza pelo fato de olharem, sobretudo, para si mesmos; por assim dizer, fazem o bem para si mesmos. E como é grande, para todos os homens, a tentação de se preocuparem antes de mais nada consigo mesmos, de olharem para trás para si mesmos, tornando-se assim interiormente vazios, como ‘estátuas de sal’!”, salienta o Papa.
3. Adoração ao Santíssimo Sacramento
Nas vigílias com os jovens, em todas suas viagens deste ano e especialmente na JMJ de Madri, o momento mais importante era sempre a Adoração Eucarística.
“A adoração é, antes de mais nada, um ato de fé; o ato de fé como tal. Deus não é uma hipótese qualquer, possível ou impossível, sobre a origem do universo. Ele está ali. E se Ele está presente, prostro-me diante Dele”, destaca Bento XVI.
4. Sacramento da Penitência
Outro elemento importante das Jornadas é a presença do sacramento da Penitência, que, com uma naturalidade sempre maior, vai se tornando parte do conjunto.
“Deste modo, reconhecemos que necessitamos continuamente de perdão e que perdão significa responsabilidade. Incessantemente a minha alma fica manchada por esta força de gravidade em mim, que me atrai para baixo. Por isso, temos necessidade da humildade que sempre de novo pede perdão a Deus, que se deixa purificar e que desperta em nós a força contrária, a força positiva do Criador, que nos atrai para o alto”, explica o Pontífice.
5. Alegria de ser cristão
Sem dúvida a grande característica de todas as Jornadas com a juventude é a alegria. Mas de onde ela vem? Como se explica?
Seguramente, destaca o Papa, são muitos os fatores que interagem. Mas, para ele, o fator decisivo é a certeza que deriva da fé, a certeza de ser amado e de ter uma missão confiada por Deus.
O filósofo alemão Josef Pieper salienta que ‘quem não é amado, também não se pode amar a si mesmo. Mas o verdadeiro amor, aquele incondicional que todo ser humano necessita provém somente de Deus.
“Quando falta ao homem a percepção de ser acolhido por Deus, de ser amado por Ele, a pergunta sobre se existir como pessoa humana seja verdadeiramente coisa boa, deixa de encontrar qualquer resposta; torna-se cada vez mais insuperável a dúvida acerca da existência humana. Onde se torna predominante a dúvida sobre Deus, acaba inevitavelmente por seguir-se a dúvida acerca do meu ser homem”, reforça o Papa.
É a difusão desta dúvida, da dúvida do amor de Deus que traz a infelicidade e a tristeza interior. Bento XVI reforça que só a fé dá a certeza que é bom existir como pessoa humana, mesmo em tempos difíceis. É a fé que faz as pessoas felizes a partir de dentro e as JMJ são a prova disso.