O Papa Bento XVI recebeu na Sala Clementina, neste sábado, 26, os membros do Tribunal da Rota Romana, para a inauguração do ano judiciário. Em seu discurso, o Santo Padre refletiu, de modo particular, sobre alguns aspectos da relação entre fé e matrimônio, observando que a crise de fé presente atualmente em vários lugares do mundo traz consigo um crise da união conjugal, que recai também sobre os filhos.
O Pontífice recordou o Código Canônico, que designa a realidade natural do matrimônio, como um pacto irrevogável entre um homem e uma mulher. Ele ressaltou que essa relação entre fé e matrimônio adquire um significado ainda mais profundo no plano teológico. "O vínculo matrimonial, de fato, embora realidade natural, entre os batizados foi elevado por Cristo à dignidade de Sacramento”.
E a fé, segundo o Santo Padre, é muito importante em uma união matrimonial cristã. Ele destacou que a fé “é importante na realização do autêntico bem conjugal, que consiste simplesmente no querer sempre o bem do outro”. Além disso, ela faz crescer e frutificar o amor dos esposos, dando espaço à presença do Deus Trinitário.
Referindo-se ao pronunciamento do beato João Paulo II ao mesmo tribunal, há 10 anos, Bento XVI lembrou que uma atitude do noivos que não leva em consideração a dimensão sobrenatural do casamento pode torná-lo inválido somente se isso afeta a validade no plano natural no qual é colocado o mesmo sinal sacramental.
Segundo o Papa, a cultura contemporânea, marcada por um acentuado subjetivismo e relativismo ético e religioso, coloca a pessoa e a família diante de prementes desafios. "Em primeiro lugar em relação à capacidade de um ser humano de unir-se, e se é possível que essa união dure toda uma vida e se isto corresponde realmente à natureza humana, ou mesmo, se esta união não estaria em contraste com a liberdade humana e com a sua auto-realização. Isto faz parte de uma mentalidade muito difundida de que a pessoa se torna ela mesmo, permanecendo autônoma e entrando com contato com o outro somente através de relações que podem ser interrompidas a qualquer momento”, advertiu.
O Santo Padre destacou ainda que somente abrindo-se à verdade de Deus é possível compreender e realizar, na vida conjugal e familiar, a verdade do homem como filho, regenerado pelo Batismo. A recusa a esta proposta divina, segundo enfatizou o Papa, leva a um desequilíbrio em todas as relações humanas, a uma falsa compreensão da liberdade e da auto-realização.
Usando o exemplo dos santos que viveram a união matrimonial e familiar numa perspectiva cristã, Bento XVI recordou que eles conseguiram superar as situações mais adversas, alcançando, muitas vezes, a santificação do cônjuge e dos filhos com um amor sempre mais reforçado por uma sólida confiança em Deus, de uma sincera piedade religiosa e de uma intensa vida sacramental.
Concluindo seu discurso aos juízes da Rota Romana, o Pontífice afirmou que, com suas considerações, ele não pretendeu sugerir um fácil automatismo entre carência de fé e nulidade da união matrimonial. Antes, o objetivo foi "individuar como tal carência possa, embora não necessariamente, ferir também os bens do matrimônio, a partir do momento que a referência à ordem natural desejada por Deus seja inerente ao pacto conjugal”.