Especialista em Oriente Médio e Relações Internacionais comenta a postura da comunidade internacional na crise síria, que atinge muitos cristãos
André Cunha
Da redação
Segundo especialistas, a crise atual na Síria já gerou entre 220 e 230 mil mortos, 12 milhões de pessoas precisando de ajuda humanitária, sendo que praticamente a metade é de crianças. Muitos também são cristãos ou pertencentes a minorias étnicas e religiosas submetidas à ação de grupos extremistas, que tentam avançar na região.
A crise provocou ainda um gigantesco deslocamento de famílias no interior do país; mais de 4 milhões de pessoas buscando refúgio em países vizinhos, criando uma necessidade de 8,4 bilhões de dólares para resolver a questão de assistência às vítimas somente no momento atual.
O teólogo e especialista em Oriente Médio, Rogel Tavares, afirma que uma intervenção não poderia ser, antes de tudo, apenas em favor dos cristãos, mas sim em favor da estabilização da Síria, o que, consequentemente, beneficiaria os cristãos.
Todavia, nada ainda foi feito concretamente em favor do povo sírio, que para o especialista, parece ter sido esquecido pelo mundo.
Rogel Tavares aponta algumas razões que podem ter dificultado alguma intervenção por parte da comunidade internacional.
Razões para não intervir
Segundo ele, o principal motivo para o Ocidente não intervir na situação da Síria tem relação com as condições do momento: Estados Unidos sem apoio do Congresso e da população, Europa fechada ao assunto e/ou sem apoio de alguns países, ONU sem suporte do Conselho de Segurança e a Rússia “adormecida”.
E “somado ao alto custo financeiro de vidas humanas, intervenções mais recentes, pós Guerra Fria, extremamente desastrosas do ponto de vista humanitário, político e de resultados, trazem descrédito a possíveis intervenções futuras”, disse.
Além disso, existe, por parte das potências, a pouca vontade de intervir, reduzida pelos altos custos financeiros e pela política interna.
“Com esta postura, nações empurram a responsabilidade aos EUA, que já possuem a fama (não em vão) de ‘Polícia do Mundo’ e com certeza levarão a acusação de imperialistas e de intervenção interesseira somente. Sendo um agravante, o fato de o atual governo ter uma posição de não intervenção e o congresso americano ainda ter em mente os horrores das intervenções no Iraque e no Afeganistão”.
Por que é preciso intervir?
Rogel pontuou algumas razões para que a comunidade internacional, bem como a ONU, faça uma intervenção no Oriente Médio:
– Violação dos direitos humanos: a situação atual de total violação maciça de direitos humanos tanto pelo governo como pelos opositores. Ela cria um jogo que mecanismos brandos, como diplomacia e sanções, não conseguem resolver.
– Fortalecimento de grupos isolados: a atual situação tem sido uma das principais responsáveis pelo fortalecimento do Estado Islâmico que está unindo vários grupos que sozinhos não representavam grande poder, mas hoje pela atual conjuntura estão se aliando a este e conseguindo alterar o equilíbrio da balança de poder na região.
– Alta no número de mortes: por último, a não intervenção pode jogar no currículo da ONU um volume de mortos que a desqualificaria para o proposito pela qual foi criada após a Segunda Guerra Mundial. “Pois a ONU justifica sua atuação como sendo uma resposta internacional para uma ‘Ameaça à paz Mundial’, a qual por uma série de fatores internos e externos não está conseguindo honrar”.
Como seria uma intervenção?
De acordo com Rogel Tavares, hoje são infinitas as possibilidades de intervenção. Contudo, ele considera que algumas são básicas e merecem mais atenção.
A primeira seria uma intervenção humanitária e de manutenção da paz. Apesar de ser uma opção, tal ação, segundo o especialista, não é viável na atual conjuntura atual por “estarmos bem no meio do furacão da guerra”. “Esta seria mais um tipo de operação para um momento pós-derrubada de poderes e submissão parcial de jogadores, sejam grupos Jihadistas ou o principal, o Estado Islâmico”, salientou.
Uma segunda possibilidade seria um conjunto de operações mais amplas, entre elas as Operações de Paz – Peacekeeping ou Peace enforcement. A primeira tem por objetivo proteger civis, e as partes envolvidas precisam estar dispostas a cooperar, principalmente o governo cujo território sofrerá a operação. A segunda possui autorização para o uso da força e não necessariamente precisa da autorização do Estado que atuar.
Uma terceira opção seria a intervenção de uma nação que lideraria todo o processo como foi o caso iraquiano em 2003, quando os EUA invadiram o Iraque. “Neste modelo, o Conselho de Segurança ficaria sem atuação, ao mesmo tempo que o sistema internacional para resoluções de conflitos seria extremamente desrespeitado, gerando uma possível falência do mesmo”, explicou Rogel.