Segundo declarou o próprio Bento XVI, o seu encontro com os jovens, na esplanada em frente à basílica de Santa Maria dos Anjos, ao fim da tarde deste Domingo, foi “pensado… quase como ponto culminante da jornada”, com “um significado particular”.
De facto, observou, se “São Francisco fala a todos”, ele “tem precisamente para os jovens uma atracção especial”, “a sua conversão teve lugar quando estava no pleno da sua vitalidade, das suas experiências, dos seus sonhos. Tinha passado 25 anos sem conseguir descobrir o sentido da vida. Poucos meses antes de morrer, recordará aquele período como o tempo em que estava nos pecados”.
Em que pensava ele ao dizer isto, de que “pecados” se tratava. Não é fácil determina-lo, reconheceu o Papa, referindo os textos biográficos primitivos chegados até nós. Bento XVI tentou, ainda assim, evocar alguns traços característicos da juventude de Francisco, antes da sua “conversão”, há 800 anos, refletindo como esses elementos se encontram, de algum modo, nos jovens de hoje.
Passando depois a comentar algumas das perguntas que os jovens lhe tinham dirigido, em vista deste encontro, o Papa começou pela “dificuldade de discernir a verdade”.
“É uma questão que atravessa largamente a sociedade e a cultura de hoje,. O Evangelho apresenta Jesus como verdade: verdade de Deus e ao mesmo tempo verdade do homem. Como aconteceu com Francisco, também a nós Cristo fala ao coração. Corremos o risco de passar uma vida inteira ensurdecidos por vozes ruidosas mas vazias, corremos o risco de deixar fugir a sua voz, a única que conta, porque é a única que salva.
“Contentamo-nos com fragmentos de verdade ou deixamo-nos seduzir por verdades que só o são na aparência. E havemos então de nos admirar se nos sentimos no meio de um mundo contraditório que, não obstante tantas coisas belas, tantas vezes nos desilude, com suas expressões de banalidade, injustiça, violência? Sem Deus, o mundo perde o seu fundamento e a sua direção de marcha".
“Não tenhais medo de imitar Francisco – exortou o Papa, dirigindo-se aos jovens – sobretudo na capacidade de vos tornardes vós próprios. Ele soube fazer silêncio dentro de si, colocando-se à escuta da Palavra de Deus. Passo a passo, deixou-se conduzir pela mão até o pleno encontro com Jesus, até dele fazer o tesouro e a luz da sua vida.
Também o encontro com os irmãos mais sofredores, colocando-se ao seu serviço, foi um encontro com Jesus – fez notar o Papa, referindo a lugar de Rivotorto, para onde eram remetidos os leprosos – os últimos, marginalizados, em relação aos quais Francisco experimentava um irresistível sentido de rejeição. Mas tocado pela graça, abriu-lhes o seu coração… beijando-os e servindo-os…
E era assim que a graça ia plasmando Francisco. Tornou-se capaz de fixar o seu olhar sobre o rosto de Cristo, escutando a sua voz – recordou o Papa, referindo o Crucifixo de São Damião, que falou a Francisco, chamando à ousada missão de reparar a sua casa, em ruínas.
A “imagem do Crucificado/Ressuscitado, vida da Igreja – fez notar aos jovens o Papa – continua a falar-nos a nós, como há dois mil anos falou aos seus apóstolos e há oitocentos anos falou a Francisco. A Igreja vive continuamente deste encontro”.
Bento XVI evocou a “grande veneração” que Francisco, diácono, nutria em relação aos sacerdotes. “Embora sabendo que também nos ministros de Deus há tanta pobreza e fragilidade, via-os como ministros do Corpo de Cristo, e isso bastava para suscitar nele um sentido de amor, reverência e obediência”.
“Precisamente porque de Cristo, Francisco é também homem da Igreja. Do Crucifixo de São Damião tinha tido a indicação de reparar a cãs de Cristo, que é precisamente a Igreja. Entre Cristo e a Igreja existe uma relação íntima e indissolúvel. Ser chamado a repará-la implicava, sem dúvida, na missão de Francisco, algo de próprio e de original".
"Ao mesmo tempo, aquela tarefa mais não era, ao fim e ao cabo, senão a responsabilidade atribuída por Cristo a todo o batizado. A Igreja cresce e reforma-se sobretudo na medida em que cada um de nós se converte e se santifica. E edifica-se através das muitas vocações, a partir da vocação laical e familiar, até à vida de especial consagração, à vocação sacerdotal”.
“Afeto verdadeiramente filial” era também o que tinha Francisco ao seu bispo de Assis. E “sentiu de modo especial a missão do Vigário de Cristo, ao qual sujeito a sua Regra e confiou a Ordem. Se os Papa tanto afeto têm mostrado a Assis, ao longo da história, trata-se num certo sentido de responder ao afeto que Francisco teve pelo Papa” – observou Bento XVI, reafirmando-se na esteira dos seus predecessores, em especial de João Paulo II.