Queridos Irmãos e irmãs,
Hoje marcados pelo austero símbolo das cinzas, entramos no tempo da Quaresma iniciando um itinerário espiritual que nos prepara a celebrar dignamente os mistérios pascais. As cinzas bentas colocadas sobre a nossa cabeça é um sinal que nos recorda a nossa condição de criaturas, nos convida à penitência e a intensificar o compromisso de conversão para seguir sempre mais o Senhor.
A quaresma é um caminho, é acompanhar Jesus que sobe a Jerusalém, lugar do cumprimento do seu ministério de Paixão, morte e Ressurreição. Nos recorda que a vida cristã é uma via para percorrer, consistente não como uma lei a observar, mas na pessoa de Cristo, para encontrar, acolher e seguir. Jesus, de fato, nos diz: "Se alguém quer me seguir, renegue a si mesmo, pegue sua cruz de cada dia e me siga". Diz-nos, isto é, que para alcançar com Ele a luz e a alegria da ressurreição, a vitória da vida, do amor, do bem, também nós devemos pegar a cruz de cada dia, como nos exorta uma bela página da Imitação de Cristo: "Pegue, portanto a tua cruz e siga Jesus, assim entrarás na vida eterna. Ele próprio te precedeu, levando ele mesmo sua cruz. E é morto por você a fim que também você levasse a tua cruz e desejasse ser também você crucificado. De fato, se você morrer com Ele, com Ele também viverá. Se ele foi teu companheiro no sofrimento, ele será companheiro também na glória".
Na Santa Missa do primeiro domingo da Quaresma rezaremos: “Ó Deus nosso Pai, com a celebração desta quaresma, sinal sacramental da nossa conversão, concede aos teus fiéis de crescer no conhecimento do mistério de Cristo e de testemunhá-lo com uma conduta de vida digna”. É uma invocação que voltamos a Deus porque sabemos que somente Ele pode converter o nosso coração. E é, sobretudo na liturgia, na participação aos santos mistérios, que nós somos conduzidos a percorrer este caminho com o Senhor. É um colocar-se na escola de Jesus, percorrer de novo os eventos que nos trouxeram a salvação, mas não como uma simples comemoração, uma recordação dos fatos passados. Nas ações litúrgicas, Cristo se faz presente através a obra do Espírito Santo, aqueles acontecimentos salvíficos se tornam atuais. Existe uma palavra chave que frequentemente aparece na Liturgia para indicar isto: a palavra "hoje", e essa vem compreendida em sentido originário e concreto, não metafórico. Hoje, Deus revela a sua lei e a nós foi dado escolher hoje entre o bem e o mal, entre a vida e a morte; hoje o reino de Deus é próximo. Convertei-vos e creiais no Evangelho; hoje Cristo é morto, subiu ao céu e sentou a direita do Pai, hoje nos foi dado o Espírito Santo, hoje é o tempo favorável.
Participar da liturgia significa, então, mergulhar a própria vida no mistério de Cristo, na sua permanente presença, percorrer um caminho no qual entramos na sua morte e ressurreição para ter a vida.
Nos domingos da Quaresma, em modo particular neste ano litúrgico do ciclo A, somos introduzidos a viver um itinerário batismal, quase percorrendo de novo o caminho dos catecúmenos, daqueles que se preparam a receber o batismo, para reavivar em nós este dom de modo que a nossa vida recupere as exigências e os compromissos deste sacramento, que é a base da vida cristã.
Na mensagem que enviei para esta quaresma, quis enfatizar o nexo particular que liga o tempo quaresmal ao Batismo. Desde sempre, a Igreja associa a Vigília Pascal à celebração do batismo, passo a passo: nisto se realiza aquele grande mistério, pelo qual o homem, morto ao pecado, se torna participante da vida nova em Cristo Ressuscitado e recebe o Espírito de Deus que ressuscitou Jesus dos mortos. As leituras que escutaremos nos próximos domingos e as quais vos convido a prestar especial atenção, são da tradição antiga, que acompanhava o catecúmeno na descoberta do Batismo: são o grande anúncio disto que Deus opera neste sacramento, uma estupenda catequese batismal que se volta a cada um de nós.
O primeiro domingo, chamado "Domingo da tentação", porque apresenta as tentações de Jesus no deserto, nos convida a renovar a nossa decisão definitiva para Deus e a enfrentar com coragem a luta que nos espera para permanecermos fiéis. Sempre existe de novo esta necessidade de decisão, de resistir ao mal, de seguir Jesus. Neste domingo, a Igreja depois de ter escutado o testemunho dos padrinhos e dos catequistas, celebra a eleição daqueles que são admitidos ao sacramentos pascais. O segundo domingo é de Abraão e da Transfiguração. O batismo é o sacramento da fé e da filiação divina. Como Abraão, pai daqueles que creem, também nós somos convidados a partir, a sair da nossa terra, a deixar as seguranças que nos foram construídas, para recolocar a nossa confiança em Deus, a meta se vê na transfiguração de Cristo, o Filho amado, no qual também nós nos tornamos filhos de Deus. Nos domingos sucessivos, vem apresentado o batismo nas imagens da água, da luz e da vida. O terceiro domingo nos faz encontrar a samaritana. Como Israel no êxodo, também nós, no batismo, recebemos a água que salva; Jesus, como diz à samaritana, tem a água da vida, que extingue toda sede e esta água é o seu Espírito. A Igreja, neste domingo, celebra a primeira parte dos catecúmenos e, durante a semana, entregará a eles o símbolo: a profissão de fé, o Credo. O quarto domingo nos faz refletir sobre a experiência do cego de nascença. No batismo, somos liberados das trevas do mal e recebemos a luz de Cristo para vivermos como filhos da luz.
Também nós devemos aprender a ver a presença de Deus no rosto de Cristo e, assim, a luz. No caminho dos catecúmenos, se celebra a segunda parte. Enfim, o quinto domingo nos apresenta a ressurreição de Lázaro. No batismo, nós passamos da morte para a vida e nos tornamos capazes de agradar a Deus, de fazer morrer o homem velho para viver do Espírito do ressuscitado. Para os catecúmenos, se celebra a terceira parte e, durante a semana, é entregue a eles a oração do Senhor: O Pai nosso.
Este itinerário da quaresma que somos convidados a percorrer é caracterizado na tradição da Igreja, por algumas práticas: o jejum, a esmola e a oração. O jejum significa a abstinência do alimento, mas compreende outras formas de privação para uma vida mais sóbria. Tudo isso, entretanto, não é ainda a realidade plena do jejum: é o sinal externo de uma realidade interior, do nosso compromisso, com a ajuda de Deus, de abster-nos do mal e vivermos do Evangelho. Não jejua verdadeiramente quem não sabe nutrir-se da Palavra de Deus.
O jejum, na tradição cristã, é ligado mais estreitamente à esmola. São Leão Magno ensinava, em um dos seus discursos, sobre a quaresma: “Quanto cada cristão pode fazer em cada tempo, deve agora praticá-lo com maior solicitude e devoção, a fim que se cumpra a norma apostólica do jejum quaresmal consistente na abstinência não só dos alimentos, mas sobretudo dos pecados.
Nestes santos jejuns, nenhuma obra pode associar-se mais utilmente do que a esmola, a qual sob o nome único de "misericórdia" abraça muitas obras boas. Imenso é o campo das obras de misericórdia. Não só os ricos e pessoas de posses podem beneficiar os outros com a esmola, mas também aqueles de condição modesta e pobre. Assim, desiguais nos bens de fortuna, todos podem ser iguais nos sentimentos de piedade da alma. (Discurso 6 sobre a Quaresma, 2: PL 54, 286). São Gregório Magno recordava na sua regra pastoral, que o jejum torna-se santo pelas virtudes que o acompanham, sobretudo pela caridade, por cada gesto de generosidade, que doa aos pobres e aos necessitados o fruto da nossa privação. (cf. 19,10-11).
A quaresma, além disso, é um tempo privilegiado para a oração. Santo Agostinho diz que o jejum e a esmola são as duas asas da oração, que as permitem de pegar mais facilmente o seu impulso e de chegar até Deus. Ele afirma: “De tal modo a nossa oração, feita de humildade e caridade, no jejum e na esmola, na temperança e no perdão das ofensas, dando coisas boas e não restituindo as coisas ruins, nos afastando do mal e fazendo o bem, procura a paz e a alcança. Com as asas destas virtudes, a nossa oração voa segura e mais facilmente é conduzida ao céu, onde Cristo, nossa paz no precedeu”. (Sermão 206, 3 sobre a Quaresma: PL38,1042).
A Igreja sabe que pela nossa fraqueza é difícil fazer silêncio para colocar-se diante de Deus e ter a consciência da nossa condição de criaturas que dependem dele e de pecadores necessitados do seu amor. Por isto, a Quaresma convida a uma oração mais fiel e intensa e a uma prolongada meditação sobre a palavra de Deus. São João Crisóstomo exorta: “Enche a tua casa de modéstia e humildade com a pratica da oração. Torne esplêndida a tua habitação com a luz da justiça, orna as suas paredes com as obras boas como de um revestimento de ouro puro. No lugar dos muros e das pedras preciosas, coloque fé e a sobrenatural magnanimidade, colocando sobre todas as coisas, no alto do mais alto, a oração em dignidade de todo o complexo. Assim, prepare para a o Senhor uma digna morada, o acolha em esplêndido reinado. Ele te concederá de transformar a sua alma em templo da sua presença” (Homilia 6 sobre a oração: PG 64,466).
Caros amigos, neste caminho quaresmal,, estejamos atentos a acolher o convite de Cristo a segui-lo de modo mais decidido e coerente, renovando a graça e os compromissos do nosso batismo, para abandonar o homem velho que está em nós e revestir-nos de Cristo, para chegar renovados a Páscoa e poder dizer com São Paulo: “Não sou eu que vivo, mas Cristo vive em mim” (Gal 2,20). Bom caminho quaresmal a todos vocês! Obrigado.