Chile

Cardeal Martino fala da participação da Igreja na política

"A Igreja não pode desinteressar-se pela crise de valores e confiança que a política atravessa, pois esta faz parte do desígnio de Deus sobre a humanidade". Assim afirmou, nesta semana, o Cardeal Renato Martino, presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz, em uma conferência pronunciada na sede da Universidade Católica de Valparaíso (Chile).

Cardeal Martino destacou que a Igreja não pode agir como se Deus não existisse e que a Igreja "nunca poderá renunciar ao papel público da fé religiosa". O presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz afirmou, ainda, que o cristão tem o dever de evangelizar, inclusive, a política.

Esta conferência faz parte de uma série de encontros que o Cardeal Martino está tendo nestes dias no Chile e na Guatemala com bispos, empresários, políticos e universitários de ambos países, sobre a Doutrina Social da Igreja e desafios da sociedade atual.

Participação dos cristãos na política

Em sua intervenção, explicou que "ainda que a Igreja não faça política", possui "uma doutrina iluminadora" sobre esta, "capaz de desatar alguns dos intrincados nós que lhe impedem de exercer sua autêntica função".

"O cristão está chamado a dar à política um estatuto autenticamente humano, libertando-a constantemente de ilusões messiânicas e recuperando seu papel fundamental, resgatando-a das desilusões que a circundam", explicou.

O Cardeal Renato Martino explicou que a política, mais ainda a partir da globalização, tem de enfrentar hoje duas questões, "infelizmente ignoradas há muito tempo, com grave dano", e são a questão da verdade e a questão da autoridade. A reflexão política não costuma considerar estas questões, "a primeira por estar muito comprometida com uma época de empenho metafísico, e a segunda por ser pouco adaptável a uma sociedade caracterizada pelas 'opções' de vida".

Contudo, hoje mais que nunca é necessário voltar a propor ambos princípios, afirma o Cardeal Martino.

Verdade e autoridade

"A questão da verdade será cada vez mais relevante no futuro próximo, pela demanda dramática de sentido que a tecnologia oferece", especialmente "no âmbito político, onde existe o risco da tecnocracia; no âmbito da manipulação da vida, na qual se confia cegamente na biotecnologia; e no âmbito da comunicação, remodelado pela tecnologia informática", capaz de produzir "mundos virtuais". Tudo isto, afirma, "abre a porta a formas inéditas de serviço do homem ao homem".

A autoridade também será relevante no futuro, devido "às exigências cada vez mais fortes de governo e de guia que nascem da fragmentação originada pelo aumento das liberdades".

Esta autoridade, acrescenta, deverá ser "pensada e articulada de um modo novo", mais "horizontal e flexível" e com maior coerência com o princípio de subsidiariedade.

Laicidade

O cardeal se referiu ao atual debate sobre a laicidade, especialmente nos países ocidentais, "onde é compreendida como exclusão da religião da vida pública". Contudo, esta concepção de laicidade não pode ser boa nem para a Igreja nem para um regime político.

"Um regime político autenticamente leigo aceita tanto que o cristão atue como cristão na sociedade, como que a Igreja manifeste suas próprias avaliações éticas em jogo", afirmou. "Se a política pretende viver como se Deus não existisse, no final ela se torna estéril e perde a própria consciência da intangibilidade da vida humana".

Por sua parte, para a Igreja, relegar a fé ao âmbito privado "contradiz o critério da encarnação e da coerência entre a fé e a vida. O catolicismo nunca poderá renunciar ao papel público da fé religiosa", acrescentou.

Entre outras questões, o cardeal Martino se referiu à questão dos princípios não-negociáveis e ao pluralismo democrático: "A Igreja está fortemente comprometida com os direitos do homem", explicou, mas estes "devem ser precisos dentro de uma ordem moral respeitosa da verdade".

"Hoje existem muitos conceitos de pessoa, mas entre eles é possível estabelecer uma hierarquia, mais inclusiva" e, portanto, "envolva melhor a realidade da pessoa", e que impeça sua redução "de fim a meio, de alguém a algo". A democracia "tem necessidade dessa 'alma'", disse o prelado.

"Difundir a doutrina social é verdadeiramente uma das grandes prioridades pastorais de nossas Igrejas, chamadas a evangelizar também a política, a iluminar, com a luz do Evangelho, tudo aquilo que, de uma maneira ou de outra, tem a ver com a política", concluiu.

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