Dom Tobji relata a união de confissões cristãs em um comitê ecumênico para a reconstrução do país – ato transforma o sofrimento em amor
Da redação, com Vatican News
“Vivemos uma Quaresma sofrida, mas cheia de solidariedade. O verdadeiro acontecimento não é o terremoto, mas a sensibilidade do mundo para conosco”. Foi o que afirmou Dom Joseph Tobji, arcebispo maronita de Aleppo, ao comentar sobre 0 pós-terremoto que colocou a Síria no centro das atenções de toda a comunidade internacional por várias semanas. Além da tragédia natural, o país também soma anos de guerra e devastação que não conseguiram provocar a mesma onda de compaixão e apoio.
Dom Tobji conta que muitas pessoas se ofereceram para trabalhar na reconstrução do país: jovens, associações e fraternidades se mobilizaram para ajudar aqueles que sofreram danos. “Foram realizadas campanhas em todo o mundo para ajudar nosso povo”, relata. A solidariedade também veio de comunidades religiosas e de países vizinhos da região, como Iraque e Emirados Árabes Unidos. “Em meio a esta tragédia, há algo de positivo, a Síria voltou a aparecer nas páginas dos jornais internacionais depois de ter sido esquecida por vários anos”.
A Quaresma, no país, foi “diferente”, de acordo com o bispo. Ela vem depois de mais de uma década de outros acontecimentos dolorosos: “Doze anos de guerra, dois de pandemia da covid, depois cólera, sanções… Cada vez há uma cruz para carregar”.
Relações com muçulmanos
A Síria é formada por um mosaico de etnias e confissões religiosas e, portanto, assume um valor ainda maior neste período de 2023 em que coincidem a Páscoa e o Ramadã. “O contato entre cristãos e muçulmanos é diário. Claro, há muita fraternidade, mas também algo que prejudica as boas relações, mas em geral nos damos muito bem”, conta o bispo.
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Neste contexto, são significativas as relações que ligam o arcebispo maronita de Aleppo ao Gran Mufti da Síria e a todos os líderes religiosos de Aleppo: “Com os muçulmanos, não trocamos apenas saudações formais, mas mantemos diálogos profundos, por exemplo, sobre a figura da Virgem Maria”. “Os dois feriados coincidem – acrescenta – assim como coincidem todas as sensibilidades que surgiram durante o terremoto e que tanta solidariedade suscitaram, estamos no mesmo barco!”.
Sofrimento que leva ao amor
As celebrações comunitárias puderam decorrer de forma pacífica, apesar dos transtornos causados pela destruição do terremoto, uma possibilidade nada óbvia depois dos anos mais duros da guerra em que os cristãos sofreram inúmeras proibições nos territórios controlados pelos rebeldes jihadistas. Dom Tobji destaca que a comunidade cristã “se preocupa muito com este momento litúrgico”:
“Não podemos deixar de assistir a estas celebrações porque dão muita esperança e o próprio significado da nossa fé”. Os cristãos, portanto, olham para a cruz e a paixão de Cristo para obter força nas dificuldades, garante. “Estamos acostumados ao sofrimento – continua o bispo maronita – a dor educa as almas ao amor, não há amor sem sofrimento, Cristo se ofereceu na cruz movido pelo amor e esta é a nossa atitude”. No entanto, o prelado não pretende subestimar “o peso da dor”, porque “as pessoas estão esgotadas por todos estes anos de crise”.
A Páscoa é também um momento de ressurreição, e por isso o bispo de Aleppo revela que “as expectativas dos jovens estão muito altas”, mas pede realismo, porque “se destrói rapidamente e se reconstrói lentamente”. “Precisamos ser pacientes e esperar que a graça do Senhor abra os corações e as consciências dos governantes de todo o mundo, nossa oração é pela paz no mundo e pela prosperidade dos povos”.
Comunidades cristãs sob os jihadistas
O pensamento do bispo dirige-se também às pequenas comunidades cristãs do norte da Síria, que ainda estão sob o controle de grupos rebeldes de extremistas islâmicos. São aldeias onde os cristãos não podem professar livremente a sua fé.
“Nas áreas do norte fora do controle do governo, os cristãos sofrem, restam muito poucos, especialmente os idosos, e eles vivem em grande sofrimento, ao contrário em Aleppo e nas áreas vizinhas estamos bem deste ponto de vista, nós podemos de fato realizar nossas orações, procissões e funções nas ruas”, relata Dom Tobji.
O bispo convida os católicos a rezarem pelos cristãos nas áreas sob controle dos jihadistas: “Eles só podem rezar dentro das Igrejas, e isso já é suficiente, mas não devem exibir símbolos religiosos fora”. O prelado está em contato com um dos poucos padres presentes naquelas áreas e o viu há cerca de um mês, este lhe disse que o terremoto “devastou 80% das casas e não receberam ajuda porque ninguém entra nas áreas controladas por extremistas”.
Cristãos unidos pela reconstrução
Dom Tobji conclui fazendo um balanço da reconstrução pós-terremoto das estruturas da comunidade cristã em Aleppo: “A maioria dos edifícios da cidade está danificada, por isso formamos um comitê ecumênico para a ajuda de todos os cristãos, do qual sou o presidente”. Foram lançados dois projetos, “o de reconstrução e restauro de casas dos cristãos, que prevê também o apoio à renda para quem teve de abandonar as suas casas” e o de ajuda cotidiana sob a forma de “cesta de alimentos e donativos em dinheiro” para famílias, “porque o trabalho já não andava bem antes e com o terremoto muitos outros postos de trabalho foram perdidos “.
A comissão ecumênica é mais um sinal de esperança e reação diante da tragédia. Os vários bispos cristãos reuniram, de fato, para um projeto concreto seis comunidades católicas – orientais e de rito latino -, três ortodoxas e duas protestantes. “Somos onze diferentes realidades cristãs, mas trabalhamos juntos”, finaliza.