Segundo especialista em educação socioambiental, preocupação com a situação climática não é só da Igreja, mas do mundo, pois a realidade vem se agravando de forma acelerada nas últimas décadas
Kelen Galvan
Da Redação

Foto: Canva Pro
Secas, enchentes, furacões, altas temperaturas são alguns dos problemas climáticos que têm afetado a humanidade. Não são de hoje, mas nas últimas décadas têm se tornado mais extremos e sentidos pela população. Questões que colocam em cheque a garantia de um planeta habitável para o ser humano. Diante do risco, a Igreja Católica, enquanto grande defensora da vida humana, tem assumido com mais intensidade o cuidado com a Casa Comum. No Brasil, nesse sentido, a Campanha da Fraternidade se debruça uma vez mais sobre a temática.
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De acordo com um dos estudiosos e pesquisadores do assunto no Brasil, Telmo Pedro Vieira, as mudanças climáticas foram provocadas pelo processo de desenvolvimento ocorrido a partir da Revolução Industrial, em 1760, quando começou o uso de combustíveis fósseis. Telmo é professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e animador Laudato Si‘. Ele possui Pós-doutorado em Sociologia da Religião; Doutorado e Mestrado em Antropologia Ibero-americana; Formação em Pedagogia e Especialização em Educação Socioambiental.
Ele destaca também que o estilo de vida consumista leva as empresas a produzirem mais e esse excesso de produção libera uma grande quantidade de gases de efeito estufa na atmosfera.

Prof. Telmo / Foto: Arquivo Pessoal
“Esses gases estão provocando o que chamamos de Aquecimento Global. E o aquecimento global altera a vida no planeta, provocando eventos extremos, como os que estamos assistindo nos dias de hoje: excesso de chuva no sul do Brasil (situação do Rio Grande do Sul), chuvas torrenciais na Espanha e em Portugal, neve no deserto da Arábia Saudita, incêndios por todos os lados, secas no Brasil, na África, perda da biodiversidade em todo Planeta. Essa é a gravidade da situação hoje e digo que a crise não é só social e nem só ambiental, mas socioambiental e global”, alerta o pesquisador.
Movidos pela esperança
Telmo enfatiza que a situação planetária é grave e lamenta a falta de compromisso da comunidade internacional, dos chefes de estado e das grandes corporações. Contudo, ele destaca que os cristãos são movidos pela esperança e acreditam que a mudança é possível.
“O nosso Deus é o Deus da vida é o Deus da ecologia integral. Precisamos aproveitar o ano do Jubileu (2025), que nos convida a esperançar e partir para uma caminhada de justiça socioambiental, em busca de uma nova relação com Deus, com as outras pessoas e das pessoas com a natureza”.
A gravidade desta situação ambiental levou a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a escolher como tema da Campanha da Fraternidade deste ano: “Fraternidade e Ecologia Integral” e lema: “Deus viu que tudo era muito bom”(Gn 1,31).
“A escolha do tema é reflexo do compromisso da Igreja de cuidar da Obra da Criação”, ressaltou Prof. Telmo. Ele destaca que essa é uma preocupação não só da Igreja, mas do mundo, pois a situação vem se agravando de forma acelerada nas últimas décadas.
Maiores desafios no Brasil
Telmo afirma que a crise climática é o problema atual mais grave, pois coloca em risco a espécie humana. E que há uma grande dificuldade no enfrentamento desses problemas devido à indiferença das pessoas.
Ele explica que, no Brasil, há duas realidades principais que influenciam na crise planetária: o desmatamento e o agronegócio, responsáveis por lançar 75% dos gases de efeito estufa na atmosfera. “É preciso deixar claro que o agro não contempla a agricultura familiar que é a solução para a produção de alimento no planeta”, esclareceu.
Ele destaca outras situações graves, como o problema da poluição em todas as suas formas, em especial a poluição hídrica, que atualmente tem causado grandes impactos para a vida marinha.
Outro ponto é o desrespeito às leis ambientais. “Quando os governos permitem construções sobre os rios ou em suas margens, não respeitando os 30 metros da mata ciliar”, citou como exemplo.
Telmo apontou ainda a questão da ocupação desordenada do solo, o crescimento acelerado das cidades aliado à falta de acesso aos serviços básicos de saneamento e o avanço de atividades econômicas exploratórias.
Por onde começar?
O pesquisador acredita que só a partir de uma conversão integral esta crise socioambiental será superada. Ele destaca que a Campanha da Fraternidade propõe uma ação muito importante, que é a mudança no estilo de vida.
“Sabemos que a Campanha da Fraternidade não chega a todos os recantos do Brasil, mas, vamos fazer a nossa parte, iniciando um processo de conversão ecológica e mudança de estilo de vida. Deixar o consumismo descontrolado para só consumir o que precisamos, não acumular e evitar o uso de materiais descartáveis e de uso único”, indica como sugestões. Ele afirma que a CF 2025 apresenta uma série de ideias para auxiliar nesta mudança.
Telmo enfatiza que é preciso “silenciar” o próprio egoísmo, abrir os olhos para o processo de conversão e colocar-se no lugar do outro. “Não olhar o irmão que sofre com todas as injustiças socioambientais como estatística, como números, mas como um irmão que precisa da nossa compaixão, do nosso amor”, afirmou.
Por fim, ele destacou que o Papa Francisco tem travado uma grande luta por ter abraçado essa causa de cuidado com a Criação. Isso porque além de ter que tratar com autoridades mundiais, enquanto chefe de Estado, sofre com resistências internas. “Já ouvi de alguns que o Papa não tem que cuidar das questões ambientais, pois isso é assunto para ecologistas e cientistas, enquanto outros consideram que o papel do padre e do bispo é salvar almas. E eu lhes digo: se você não cuidar do planeta, não terá almas para salvar”, enfatizou.