Padre recém-ordenado e diáconos à espera da ordem presbiteral contam como é receber este sacramento em tempos de pandemia da Covid-19
Julia Beck
Da redação
A ordenação de um diácono permanente e de um sacerdote é motivo de festa para a Igreja Católica. As cerimônias costumam contar com a presença de um grande número de membros do clero, familiares, amigos e fiéis que acompanham atentos esse momento, que inclui o rito de eleição do candidato, homilia do bispo, propósito do eleito, entoação da ladainha, imposição das mãos, prece de ordenação, unção das mãos e entrega do pão e do vinho.
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Com a pandemia de coronavírus, os muitos abraços, demonstrações de carinho e felicitações comuns a essas cerimônias agora precisam esperar. A alegria permanece, mas por questões sanitárias, o número de pessoas que participam dessas cerimônias foi drasticamente reduzido e alguns ritos precisaram ser revistos, de acordo com orientações da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para as celebrações comunitárias.
Após anos de estudo e pastoral, encontrar esta realidade em um ano tão importante exigiu de Márcio Leandro Fernandes, Elenildo da Silva, Everton Gonçalves e Thales Maciel uma resposta diante da dúvida: “Seguir com a ordenação ou adiá-la?” A decisão foi difícil, mas a vocação foi fator determinante para que os três vocacionados dessem seu “sim” em direção à ordenação.
A poucos dias de receber o sacramento da ordem – cerimônia está marcada para este domingo, 28 – diácono Thales conta que a opção feita pela ordenação foi pautada pela vida de um santo conhecido da Igreja Católica: São João Paulo II. Anos atrás, o diácono relata ter lido a biografia do Papa que foi canonizado, e conta ter ficado profundamente impactado com o contexto de sua formação e de sua ordenação: o assédio da ocupação nazista e o totalitarismo do comunismo soviético.
Hoje, próximo de tornar-se sacerdote, Thales afirma fazer suas as reflexões de São João Paulo II e se questionar a respeito da relação entre o amadurecimento de sua vocação e o cenário de morte atual.
“A opção pela ordenação neste tempo em que vivemos é uma questão de identidade e missão do sacerdócio. Seria coerente subtrair-me à eleição para o ministério sacerdotal sob a justificativa de aguardar tempos melhores? Não seria precisamente em ‘tempos ruins’ que deveria brilhar a luz do ministério ordenado como sinal de esperança e da proximidade de Deus?”, frisou.
Ainda que o contexto de sua ordenação não seja o sonhado, o diácono destaca que é para a realidade e para curar os corações feridos que o Senhor envia os sacerdotes.
“É claro que a dor do mundo e a distância do povo de Deus repercutem de maneira incisiva e profunda em meu interior. Não é possível esconder o sofrimento que vivencio por tudo isso. Mas isto é cristológico: ser capaz de se compadecer, ofertar-se a si para sarar a dor dos filhos e filhas de Deus é próprio daquele que respondeu positivamente ao chamado do Senhor”.
“Seria coerente subtrair-me à eleição para o ministério sacerdotal sob a justificativa de aguardar tempos melhores? Não seria precisamente em ‘tempos ruins’ que deveria brilhar a luz do ministério ordenado como sinal de esperança e da proximidade de Deus?”
Diácono Thales Maciel
O diácono Everton conta que a decisão de seguir com a ordenação, que será juntamente com a do diácono Thales, contou com o apoio dos familiares, principalmente de sua mãe. “Foi na família que encontrei força na decisão. Em particular, minha mãe me disse: ‘Ordene neste tempo, estamos com você. Deus te escolheu’. Foi então que recordei do meu lema de ordenação: ‘Sanctificavi te’ ( te escolhi), retirado de Jr 1,5”.
Este tempo de espera, de acordo com o diácono, tem sido também de muita emoção, ansiedade e alegria. “Com o isolamento posso dizer que fiz um retiro pessoal de preparação para a ordenação, onde rezei pedindo a Deus para que ilumine e prepare eu e meus colegas para este tempo novo, onde seremos ministros no meio do povo”.
Estar distante dos fiéis é desafiador, afirma Everton. “É este povo que nos sustenta na fé”. O diácono frisa que, mesmo com as dificuldades, não irá desanimar. “Hoje existem vários meios para se chegar às pessoas e é dessa forma que guardo em mim a esperança. O Senhor estará conosco todos os dias, foi assim que Ele disse aos seus. Sempre vou viver confiante na palavra do Senhor”.
Padre Elenildo, missionário da Comunidade Canção Nova (CN) recém-ordenado no inicio deste mês – no sábado, 7 de junho -, sublinha que a ausência da família, dos amigos e dos membros da comunidade foi sentida.
O sacerdote conta que a decisão pela ordenação o fez refletir que, apesar das dificuldades atuais, o tempo era oportuno e a Igreja necessita hoje, mais do que nunca, de mais padres que auxiliem o povo de Deus na vida sacramental.
Ao falar sobre os desafios de ser um neo-sacerdote em tempo de pandemia, padre Elenildo retoma o sentimento da ordenação: é desafiador não poder estar próximo do povo. “Eu até quero, mas a pandemia não me permite. (…) Essa parte é desafiadora porque o que um padre quer é poder viver bem a sua vocação, celebrando a santa missa, atendendo a confissões, fazendo coisas que só um sacerdote pode fazer. Confesso que ter restrições quanto a isso é muito ruim, é um martírio dentro do contexto sacerdotal que iniciei”.
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Diante da atmosfera de medo, o sacerdote revela a necessidade de encarar diariamente a vocação a partir do olhar para Cristo. “Ele é o modelo por excelência. É preciso olhar para o Cristo e dizer: Senhor eu vou te seguir até as últimas consequências”.
Em geral, padre Elenildo sublinha que muitos são os sentimentos despertados com a ordenação, mas a alegria é, para ele, o maior deles. “É algo até sobrenatural entender que eu tinha sido chamado por Deus e que a ordenação seria essa confirmação. Até então era um tempo de discernimento, e a ordenação é esse selo: ‘de fato Deus me chamou’”.
Junto com padre Elenildo, Márcio Leandro, também missionário da Canção Nova, foi ordenado diácono. “Sempre estive totalmente confiante na Providência de Deus em relação à minha ordenação. Não tive dúvida de que a data já estava no coração de Deus e, por isso, Ele mesmo providenciaria cada detalhe, como realmente aconteceu”.
Márcio conta que não teve os pais presentes na cerimônia, mas contou com a presença de uma pessoa especial: “Tive a graça da minha irmã de sangue poder participar e entrar comigo”. Agora, o diácono afirma que busca viver com intensidade cada palavra que prometeu no dia de sua ordenação diaconal.
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“Mesmo em meio à pandemia, sei que, vivendo tudo que a Igreja me pede como diácono, estarei me preparando muito bem para a ordenação sacerdotal. Desta forma, preciso viver o serviço, amando a Deus de todo o meu coração, como está no meu lema diaconal. Tenho percebido que é possível sim ser diácono e viver muito bem o ministério neste momento. Procuro perceber as vias possíveis de ajudar o próximo e tenho feito isso. Assim, tenho tido a graça de servir e ajudar, tantos irmãos e irmãs”.