Série: Mês das Vocações

No matrimônio é essencial entender o que é o amor, indica casal

Vocação matrimonial é refletida pela Igreja nesta Semana Nacional da Família; Letícia e Adriano Gonçalves falam sobre desafios atuais enfrentados pelos esposos 

Julia Beck
Da redação

Adriano e Letícia Gonçalves; Família do casal /Fotos: Arquivo Pessoal

Na Semana Nacional da Família, compreendida dentro do mês vocacional – iniciada neste domingo, 11, e que terá sua conclusão no sábado, 17, a reflexão é a vocação ao matrimônio. Casados há oito anos, Adriano Gonçalves e Letícia Cavalli Gonçalves são os entrevistados desta semana da série “Mês das Vocações”.

Em suas redes sociais, antes de qualquer outra atribuição, ambos se definem como “esposo” e “esposa”, adiantando o valor que o matrimônio ocupa em suas vidas. Juntos, eles são pais de Chiara, Catarina, Celina e Agnes. Adriano é filósofo e psicólogo especialista em análise existencial e logoterapia Frankliana. Letícia é terapeuta em counseling, também especialista em análise existencial e logoterapia Frankliana.

Perguntas sobre relacionamentos são comumente respondidas por eles em suas redes sociais. Nesta segunda-feira, 12, eles respondem ao Notícias Canção Nova questões importantes que permeiam a vocação ao matrimônio – desde o discernimento dela até os principais desafios enfrentados pelos esposos na atualidade. Confira:

NOTÍCIAS CANÇÃO NOVA: A vocação ao matrimônio é para todos? Se não, como discerni-la?

Letícia Gonçalves: A vocação ao matrimônio é o símbolo do amor trinitário, um símbolo de união. Essa vocação específica não é para todos, mas para os que são chamados por Deus. Para discernir essa vocação, é preciso ter uma escuta primeiramente de Deus. É ele quem chama, e nós respondemos a esse chamado, a essa vocação. A vocação de toda mulher é ser mãe e esposa. Não necessariamente ela será chamada especificamente à vocação matrimonial, mas ela tem um chamado existencial a ser esposa e mãe. Ela pode, por exemplo, ser esposa de Cristo e ser mãe em uma dimensão espiritual, mas ela precisa exercer a sua vocação original de ser esposa e mãe. Tem mulheres que irão responder a essa vocação de uma maneira muito concreta, casando com um homem e gerando filhos (…). Na história de vida de São Luís e Santa Zélia, São Luís tentou entrar para um mosteiro, Santa Zélia tentou ser religiosa, ambos receberam uma negativa. São Luís, porque ele não sabia latim; e Santa Zélia porque a irmã identificou que ela não teria esse chamado. Deus demorou nove anos para responder a São Luís, até que ele encontrou Santa Zélia e ambos perceberam que ali havia uma vocação ao matrimônio. Então, é preciso ter uma vida interior de entrega, de impulso para o outro. É claro que o homem e a mulher tenham liberdade de escolha. Ser livre para decidir, para escolher e assumir as consequências dessa escolha livre e responsável. Então é preciso perceber os sinais e dar os passos concretos.

Adriano Gonçalves: A vocação natural de todo homem e de toda mulher é o matrimônio, tanto que, desde Gênesis, já tínhamos ali esta união do homem com a mulher. Então, é uma vocação natural. Homens e mulheres são chamados a isso. Claro, sabemos que alguns homens e mulheres são convocados por Deus a um chamado sobrenatural, ou seja, renunciar ao matrimônio em vista do celibato, em vista do sacerdócio. E aí eles vivem a paternidade, a maternidade espiritual. Mas todo homem e toda mulher são chamados a ser pai e a ser mãe. É bonito ver, na Teologia do Corpo, São João Paulo II afirmar que todos somos chamados ao casamento, vamos assim dizer, com Deus. Somos a noiva, e o próprio Jesus é o esposo que nos espera. Então, os casados, aqueles vocacionados ao matrimônio, revelam para os celibatários que eles são chamados a esta união. E os celibatários mostram para os casados que o casamento deles não é para esta Terra, mas é para o  Céu. Então, de fato, precisamos entender a beleza desse chamado de Deus ao matrimônio, a todos, mas acima de tudo, a esse matrimônio espiritual. O casamento, o matrimônio, é um meio, porque o grande fim é o encontro com Deus.
Como discernir? Se sou chamado ao matrimônio, já não é um discernimento, todos são. A grande questão é: será que eu trago um chamado ao celibato, ao sacerdócio? Para aqueles que são vocacionados ao matrimônio, a grande questão do discernimento será, primeiro, se não tem um chamado ao celibato – algo muito específico, até mesmo sobrenatural. É uma convocação para uma missão muito específica. Aqueles que percebem que não são chamados ao celibato precisam atualizar a vocação ao matrimônio. O grande discernimento é: com quem?

Fundador da Canção Nova, Monsenhor Jonas Abib, foi quem celebrou o casamento de Adriano e Letícia/ Foto: Arquivo Pessoal

NOTÍCIAS CANÇÃO NOVA: Quais virtudes o esposo e a esposa precisam ter para viver bem essa vocação?

Letícia: Primeiramente, a gente compreende que um casamento maduro e virtuoso vem de pessoas, de um homem, de uma mulher bem instalados na sua condição feminina e na sua condição masculina. Homens e mulheres virtuosos assumem um matrimônio virtuoso. Esse matrimônio só se torna virtuoso se ambos exercem essa busca pelas virtudes individualmente. Então, eles precisam ter consciência primeiro do que é essa vocação, que é sim um meio de santificação muito concreto. Quando se nega as exigências próprias dessa vocação, enfraquecem as virtudes na vida de santidade. Nós precisamos compreender que a própria dinâmica matrimonial de sacrifício, de decisão, de entrega, de perdão, de amor, de resignação, vai nos trazendo virtudes, amadurecendo e fortalecendo no amor.

Adriano: Eu acredito que precisamos de todas as virtudes, mas, para o homem, acredito que a virtude da fortaleza precisa ser muito bem vivida, porque capacitará este homem a domar, a autodominar, a ordenar os seus impulsos em prol daquela que ele ama. Ser forte no sentido de se tornar um sacrifício vivo em direção à sua esposa e aos seus filhos. Muitas vezes, será pedido a este homem atos heroicos, de dar a própria vida, porque o sacrifício é todo o sofrimento vivido em prol do ser amado. Então, acredito que a virtude que os homens, os esposos precisam viver a todo momento, são todas, mas de modo muito especial a fortaleza. E as esposas acredito que a própria virtude da caridade, do amor, esse amor desinteressado, esse amor que gera a própria vida, esta abertura. A mulher é um símbolo de abertura sempre, e não de fechamento. Um símbolo de fecundidade, um símbolo de vida nova. É tão interessante que, tradicionalmente, os homens se casam de preto e as mulheres de branco, ou seja, o preto simboliza o luto, este homem que, pela virtude da fortaleza, é capaz de dar a própria vida; e a mulher que, no branco, simboliza a própria vida, a possibilidade de gestar uma nova experiência, gestar uma nova vida.

NOTÍCIAS CANÇÃO NOVA: Atualmente, quais os principais desafios vividos pelos vocacionados ao matrimônio?

Letícia: Percebemos que as pessoas estão fracas no amor. Foi arrancado de nós a capacidade do sacrifício. Elas querem negar a todo custo o sofrimento, as exigências, mas elas querem que o outro seja uma fonte de prazer e alegria, de ajuda, e esquecem que, antes, eles precisam ser oferta um para o outro. Então, os principais desafios, nessa vocação, é que, se não está bom, as pessoas “largam”. Não há uma promessa para todo sempre, de a todo custo, aconteça o que acontecer, as pessoas permanecerem, se “suportarem” no bom sentido (…). No casamento, nós devemos ser solução para o outro, e não problema (…).

Adriano: Para mim, e eu tenho visto muito isso no consultório. O maior desafio é entender o que é o amor. A nossa geração tem dificuldade de viver o amor naquilo que ele é: livre, total, fiel e fecundo. As pessoas têm uma dificuldade de viver este amor livre, este amor que se torna responsável pelo outro. Não há como ter liberdade sem a responsabilidade, porque estamos em meio a uma sociedade hedonista, egocêntrica, que olha somente para si. E, dentro do matrimônio, a nossa liberdade não é liberdade de algo, é uma liberdade para algo. Liberdade de tomar decisões elevadas, de tomar decisões altruístas em direção ao ser. E o grande desafio é que, hoje, a nossa geração é marcada pela parcialidade, a dificuldade de uma entrega total. E aí, ama-se fazendo cálculos, ama-se com o prazo de validade e não de forma total. As pessoas, infelizmente, casam-se, se não der certo nós terminamos. Não é um amor total, livre, fiel. As pessoas infelizmente, pela pornografia, pela cultura e ideologia de gênero, por causa de uma banalização da vida sexual, elas têm dificuldade da fidelidade total. Victor Frankl vai dizer que o amor maduro é aquele amor que já não tem mais olhos para nenhum outro ser, a não ser a pessoa amada. Infelizmente a pornografia, as redes sociais fazem com que muitos estejam casados e vivam a infidelidade do pensamento, do ato, e aí é um grande crime, no mundo onde a criança é um risco, a criança é um erro, nessa cultura do aborto, nessa cultura de controle da natalidade, as pessoas não conseguem viver o amor fecundo. Elas calculam, elas não se abrem à vida, não tem uma abertura à vida, e o matrimônio nada mais é que a possibilidade de vida a todo instante. Então acredito que a grande ameaça é a incapacidade de viver o amor livre, total, fiel e fecundo.

NOTÍCIAS CANÇÃO NOVA: A partir do matrimônio surge a família, considerada pelo Papa Francisco e pela Igreja como “célula fundamental da sociedade”. Por que ela é tão preciosa e precisa ser cuidada?

Letícia: Nós percebemos o quanto a família tem sido atacada em todos os sentidos. Ela é atacada porque tem valor, tem força. É da família que vem as vocações, sejam sacerdotais, religiosas ou até matrimoniais. É da família que vem a força da sociedade, bons profissionais. É da família que vem a força e a vida da sociedade. Então, quando se destrói a família se destrói a sociedade, se destrói a humanidade. Percebemos uma defesa atual do aborto. Então, se nós somos capazes de matar a vida no início, na família, o que a gente não faz com ela no fim? É na família que reconhecemos o valor da vida.

Adriano: A família é o santuário da vida. A família estrutura não apenas uma pessoa, mas toda uma sociedade. Não podemos perder de vista que estamos nos finais dos tempos. E como diz Nossa Senhora, em Fátima, os finais dos tempos serão uma guerra contra o casamento e a família. Porque é na família que os futuros santos nascem. É na família que a vida pode acontecer. É na família que Deus continua investindo e acreditando na humanidade. Aquilo que é muito sagrado, é muito profanado. Por isso, o grande ataque à família, porque ela é sagrada. Ela é um santuário da vida.

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