Oração do Papa

Igreja e Psicologia podem ajudar famílias a superarem crises

Intenção de oração do Papa para este mês, famílias enfrentam questões de saúde mental, mudanças sociais, econômicas e tecnológicas; especialista e casais católicos refletem sobre tema

Julia Beck
Da redação

Foto: Canva Pro

No atual cenário mundial, as famílias enfrentam uma série de desafios. PhD em Psicologia Clínica, Élison Santos pontua que além das questões de saúde mental, como depressão e ansiedade, mudanças sociais, econômicas e tecnológicas transformaram profundamente a dinâmica familiar, trazendo novos obstáculos para o desenvolvimento saudável de seus membros.

PhD em Psicologia Clínica, Élison Santos /Foto: Arquivo Pessoal

Um dos principais desafios é a falta de tempo de qualidade juntos. “O ritmo acelerado da vida moderna, somado às exigências profissionais e acadêmicas, muitas vezes fragmentam as relações dentro de casa. Pais e filhos podem compartilhar o mesmo espaço, mas sem uma conexão real, o que pode gerar sentimentos de isolamento, dificuldades emocionais e uma carência de vínculos afetivos que se reflete na vida adulta”, enfatiza.

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O excesso de exposição às telas e à tecnologia, acrescenta o especialista, compromete o desenvolvimento de habilidades sociais essenciais, causa dificuldade de lidar com frustrações, baixa tolerância ao tédio e busca incessante por estímulos rápidos. Comportamentos como esses levam a padrões impulsivos, ansiedade e até dificuldades na construção de relacionamentos profundos.

O psicólogo frisa também desafios estruturais, como a instabilidade financeira e a insegurança profissional, que impactam diretamente na saúde emocional da família. “O estresse constante gerado por dificuldades econômicas pode resultar em conflitos familiares, desgaste emocional e até no comprometimento da saúde mental”.

No entanto, reconhecer esses desafios é o primeiro passo para enfrentá-los, indica o profissional, assim como admitir a importância das famílias para a sociedade.

Família e sociedade

A família é um pilar fundamental para o desenvolvimento humano, não apenas pelos aspectos biológicos, disserta Élison. “Como mamíferos, somos naturalmente dependentes uns dos outros, mas, além disso, nossa racionalidade nos permitiu encontrar sentido nas relações. Não apenas precisamos dos outros para sobreviver, mas também buscamos proximidade e vínculo com aqueles com quem crescemos”, observa.

Coordenadores nacionais da Pastoral Familiar, Alisson e Solange Schila /Foto; Arquivo Pessoal

O elo entre pais e filhos é visto pela Igreja como fundamental. Os coordenadores nacionais da Pastoral Familiar, Alisson e Solange Schila, definem como pertinente a preocupação do Papa Francisco em colocar as famílias em crise no centro das orações da Igreja neste mês de março.

A família é a “célula primeira da sociedade. É a partir dela que se desenvolvem as pessoas, os relacionamentos e tantos outros fatores que vão demandar no bem da sociedade, no bem comum e no bem da Igreja”, destaca o casal. Os coordenadores da Pastoral Familiar reforçam que foram vários os papas que, dentro dos seus magistérios, colocaram a família como fonte de vida.

Os coordenadores das Equipes de Nossa Senhora da Diocese de Lorena (SP), Fábio e Marcela da Silva, acrescentam que a família é o berço de todas as vocações. A partir dela, “formam-se homens e mulheres para um mundo melhor”. “O Sacramento do Matrimônio, a partir do qual se forma uma nova família, vale a pena ser vivido”, refletem.

Igreja e fé 

A Pastoral Familiar e as Equipes de Nossa Senhora são alguns dos muitos movimentos pertencentes à Igreja que destinam atenção e esforços em prol das famílias. A partir do trabalho pastoral que realizam, Alisson e Solange observam os mesmos fatores citados pelo PhD em Psicologia Clínica, Élison Santos, como culminantes em crises familiares: falta de diálogo e individualismo.

A Igreja tem destinado esforços para que as famílias saibam que podem encontrar nela um apoio, afirmam os coordenadores nacionais da Pastoral Familiar. Em muitas paróquias, casais e famílias consolidadas acompanham outros casais nas muitas fases que antecedem e sucedem a formação familiar: namoro, noivado, casamento, chegada dos filhos.

Coordenadores das Equipes de Nossa Senhora da Diocese de Lorena (SP), Fábio e Marcela da Silva /Foto: Arquivo Pessoal

Marcela e Fábio reforçam que quando questões do dia a dia parecem fugir o controle, a fé pode ser sustento e impulso para seguir adiante, acreditando que Deus pode aquilo que a família não pode sozinha. “Na família, no matrimônio, acreditamos que tudo se dá à três: nós (casal) e Deus. Ele faz parte da nossa união desde o ‘sim’ no altar. Essa certeza, essa fé ajuda a superar as dificuldades”, frisam.

A fé, opina Élison, pode ser sim um recurso poderoso para ajudar uma família a enfrentar desafios. Ele ressalta que ela deve ser vivida de maneira saudável e integrada à vida cotidiana.

“Para muitas pessoas, a espiritualidade oferece um sentido de propósito, esperança e resiliência diante das dificuldades. Em momentos de crise, a fé pode ser um ponto de apoio que dá força para continuar trazendo conforto emocional e fortalecendo os laços entre os membros da família”, enfatiza.

O especialista comenta que, no cristianismo, como em muitas tradições religiosas, há um incentivo poderoso à vivência de valores como a compaixão, o perdão, a paciência e a solidariedade, que são fundamentais para uma convivência familiar mais harmônica.

“A fé pode promover uma cultura de diálogo e acolhimento, ajudando as pessoas a enxergarem os problemas sob uma perspectiva mais ampla, muitas vezes aliviando o peso de certas dificuldades. No entanto, é importante lembrar que a fé, por si só, não substitui tratamentos médicos e psicológicos. Portanto, a fé pode ser uma grande aliada, desde que não seja usada como um escape da realidade, mas sim como um recurso para enfrentar os desafios com mais sabedoria, equilíbrio e senso de comunidade”, enfatiza.

Apoio psicológico

A procura por um profissional da Psicologia pode ser um fator decisivo para transformar dificuldades em oportunidades de crescimento, acredita Élison. Ele explica que um psicólogo pode oferecer um espaço seguro para que cada membro de uma família expresse suas angústias, além de ajudar na compreensão das dinâmicas que estão contribuindo para os problemas, trazendo clareza para padrões repetitivos de interação que podem ser ressignificados.

 “As famílias lidam com as crises de maneiras muito variadas, dependendo de seus recursos emocionais, da qualidade dos vínculos entre seus membros e do suporte que conseguem encontrar em sua rede de apoio”, observa Élison.

O psicólogo comenta que algumas famílias desenvolvem estratégias saudáveis, como fortalecer a comunicação, buscar momentos de qualidade juntos e criar novas formas de cooperação diante das dificuldades. Outras, no entanto, acabam sobrecarregadas pelo estresse e respondem com conflitos, distanciamento emocional ou até comportamentos disfuncionais que agravam ainda mais os problemas.

“O acompanhamento psicológico pode auxiliar na construção de habilidades emocionais fundamentais, como o manejo da ansiedade, a regulação das emoções e o desenvolvimento de estratégias para enfrentar os desafios cotidianos. Quando um ou mais membros da família recebem esse suporte, toda a estrutura familiar pode se beneficiar, pois a mudança em um indivíduo impacta o grupo como um todo”, reforça.

Élison conta que ainda há um certo estigma sobre buscar ajuda psicológica, mas cada vez mais famílias têm compreendido que cuidar da saúde mental é tão essencial quanto cuidar da saúde física. “A Psicologia não é apenas para momentos de crise, mas também para prevenir dificuldades futuras e fortalecer os laços familiares, tornando-os mais resilientes diante das adversidades”.

Ambiente familiar favorável

A psicologia do desenvolvimento demonstra, por meio de inúmeros estudos, que uma pessoa tem maiores chances de se desenvolver de forma saudável quando sua família proporciona segurança, estabilidade, afeto, diálogo, aconchego e referenciais sociais saudáveis, afirma Élison. Elementos sociais considerados essenciais para preparar o indivíduo para a vida em sociedade.

“Além disso, é no ambiente familiar que aprendemos a conviver com o diferente, a desenvolver nossa inteligência emocional e a lidar com desafios como limites e frustrações. A família nos ensina, desde cedo, a buscar soluções inteligentes para os problemas da vida, tornando-se, assim, uma base essencial para a construção de indivíduos e sociedades mais equilibradas”, frisa.

Famílias que priorizam o diálogo, explica o psicólogo, criam momentos de conexão genuína e estabelecem limites saudáveis para o uso da tecnologia conseguem construir um ambiente mais equilibrado e acolhedor. “Pequenas mudanças na rotina, como refeições sem distrações, conversas diárias e atividades conjuntas, podem fortalecer os laços familiares e proporcionar um suporte emocional essencial para enfrentar as adversidades da vida”, indica.

O especialista reforça também que a família pode ser um espaço essencial de proteção e prevenção, fatores importantes na construção de uma vida emocionalmente saudável. Os coordenadores nacionais da Pastoral Familiar acrescentam que a criação dos filhos sempre foi um desafio, mas que com exemplo e testemunho, os pais podem educá-los no caminho da fé e da esperança.

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