Papa Francisco pede orações pela famílias nesse mês de julho; veja relatos de famílias sobre dificuldades e união neste tempo de pandemia
Julia Beck
Da redação
Nesse mês de julho, a intenção de oração do Papa Francisco é pelas famílias. A escolha reforça a perseverança do Pontífice proposta em sua Exortação Apostólica “Amoris Laetitia”, comenta o presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Ricardo Hoepers. No documento citado pelo bispo, Francisco enfatiza que a família é uma prioridade na Igreja.
Dom Ricardo, que é bispo de Rio Grande (RS), destaca que não é de hoje que as intenções do Papa são dirigidas para as famílias, interpelando os cristãos a reconhecerem que todas as alegrias, angústias e esperanças da humanidade passam pela família.
Membro também da Comissão da CNBB para a Vida e a Família, o bispo de Campo Mourão (PR), Dom Bruno Elizeu Versari, frisa que o Santo Padre demonstra clara consciência de que a família é a célula base da sociedade e da fé. “O primeiro ensinamento que recebemos da fé é na família. O testemunho dos pais, a vida de oração e a vivência da fé é algo fundamental para que a criança, o jovem cresça com os princípios básicos da fé. Isso, para o Papa é muito importante, assim como para a Igreja”.
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Dificuldades familiares na pandemia
Ao pedir orações pelas famílias, o Papa destaca alguns desafios que ela enfrenta: “A família tem que ser protegida. São muitos os perigos enfrentados por ela: o ritmo de vida, o stress… Às vezes, os pais esquecem-se de brincar com os filhos”.
A família de Juliana Vilela, formada por cinco pessoas – ela, o marido e três filhos – tem sentido algumas dessas dificuldades em especial nesse tempo de pandemia do novo coronavírus. “Estamos enfrentando vários desafios nessa pandemia: desafios emocionais devido a tantas mudanças e privações a que fomos submetidos; no relacionamento conjugal e familiar, devido à intensidade no convívio; financeiros, devido à crise econômica que atingiu diretamente o trabalho do meu marido, que é o provedor da nossa casa; na nossa vida social, devido ao isolamento e desafios na nossa espiritualidade”. Ela acrescenta ainda que a distância física da Igreja também tem feito falta na vida e na rotina da família.
O stress vivido pelas famílias é uma das preocupações do Papa de outros tempos e também deste atual. Dom Ricardo recorda que não é de hoje que infelizmente as famílias recebem os impactos de uma sociedade do cansaço que valoriza somente o desempenho e não consegue compreender o ser humano na sua integralidade.
“Para driblar essa situação, a família cristã não tem uma redoma protetiva que impede de respirar esse ar social de combate e competitividade, mas tem algo melhor ainda, a consciência de ser Igreja Doméstica, morada de Deus, onde o próprio Deus quis habitar no amor prometido como aliança diante do altar. Esse amor sacramental é uma força imensurável”, frisou.
Desencadeado também pela pandemia, desemprego, necessidades, dificuldades e convivência, o estresse deve dar lugar à busca pelo encontro, explica Dom Bruno. “Hoje, a família tornou-se um lugar de encontro. Isso fez com que o relacionamento familiar resgatasse o que é fundamental: a compreensão, o amor, a partilha das experiências da vida”.
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O bispo incentiva os pais a aproveitarem esta situação para estar mais com os filhos, rezar juntos, ler livros, assistir filmes, fazer refeições e se divertirem juntos. “A família começa a perceber que há muito exagero, muita correria que não leva para lugar nenhum. As pessoas vivem correndo, estão sempre atrasadas, nunca chegam a tempo e isso nunca muda. Agora, com este momento de pausa, é possível perceber que devemos voltar ao essencial”.
Fazendo do isolamento um tempo de união
Dom Ricardo acredita que este tempo de isolamento social tem unido mais pais e filhos e tem dado um encorajamento à responsabilidade entre as gerações. “Não é fácil e nem tão simples, mas a pandemia nos forçou a olharmos nos olhos de quem convive conosco e nos colocou todos vulneráveis e interdependentes. Se havia dificuldades de convivência dentro das famílias, ao menos, nesse período, a aproximação nos fez pensar o quanto estávamos longe e distantes mesmo morando juntos”, refletiu.
Assim como Juliana, o casal Daniela Vaz e Osvaldo Jacob também enfrentam dificuldades familiares nesse tempo atual. Eles contam que, durante o isolamento, procuraram criar uma programação semanal com as filhas Nathalia e Sophia. “Assistimos séries, rezamos, praticamos exercícios, tudo em família. Após o almoço, começamos a ler o livro de uma santa, Chiara Luce. (…) Sempre queríamos seguir isso, mas não encontrávamos tempo. Achei que foi um ganho muito grande”, contou Daniela.
“A pandemia me tornou muito mais reflexiva e reforçou todos os valores que eu já depositava na minha família, como valorizar o tempo juntos, a oração em conjunto e o diálogo”, compartilhou Juliana. A professora afirma que essa “parada obrigatória” a fez rever prioridades. “A busca desenfreada do ter e trabalhar até se esgotar se transformaram numa visão mais simples e essencial da vida que é o ser, o estar e o se doar ao próximo mais próximo, sem medidas. É o viver com pouco, sem excessos e ser sempre grato ao que possui”.
Este tipo de revisão de vida e mudança de hábitos é, segundo Dom Bruno, um modo de transformar as dificuldades em oportunidades. E Dom Ricardo destaca a ênfase que as pessoas em si passaram a ter nos lares diante dessa situação. “Muitas casas se tornaram lares e começaram a pensar naquilo que realmente importa: as pessoas. Tudo passa, mas a convivência, o estar junto, é o fator que nos faz sermos pessoas melhores e mais sensíveis às necessidades do próximo”.
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O papel da Igreja
A Igreja no Brasil vem investindo cada vez mais na proposta de tornar cada família um modelo de Igreja Doméstica e cada Igreja Doméstica um modelo de vida comunitária. Dom Ricardo sublinha que as Diretrizes da Ação Evangelizadora apontam e estimulam para o testemunho de uma Igreja, casa de portas abertas, onde a família é o ponto de chegada para a ação pastoral e o ponto de partida para a vida comunitária mais ampla (n. 138).
Dom Bruno, também membro da Comissão para a Vida e a Família da CNBB, destaca que a Igreja dá suporte espiritual e incentiva a solidariedade na família. Ele recorda as palavras do Papa Francisco quando pediu à Igreja proximidade com as famílias: amor, respeito e partilha. “As palavras usadas pelo Santo Padre são o coração do Evangelho. Jesus deu a vida por amor, para salvar a humanidade por amor. Devemos compreender que o amor é capaz de transformar a vida das pessoas, é o motor para uma sociedade mais justa, igualitária, onde as pessoas podem viver felizes. O respeito é a grandeza da pessoa. Quanto mais experimentada na fé, mais ela respeita o seu irmão. (…) A partilha do conselho nada mais é que: tudo aquilo que queremos que o outro faça por nós, fazer por eles”.
“A Igreja não deve abrir mão de estar próxima às famílias. Mesmo em momentos difíceis, a Igreja pode manifestar a sua presença. (…) Valorizar, defender a família é confiar que podemos transformar o mundo, transformando as famílias. À medida que as famílias vivem o amor dentro de casa, essa experiência transborda para a sociedade. O Papa tem isso em mente: tendo famílias fortes na fé e no vínculo que os une, isso proporciona uma convivência muito mais serena, tranquila e intensa”, concluiu.