Esperança

Cardeal Sandri sobre a Síria e o Iraque: dar aos jovens um futuro

Com a proximidade da visita do Papa ao Iraque, cardeal comenta esperança para países do Oriente Médio que vivem décadas de conflito

Da redação, com Vatican News

Cardeal Leonardo Sandri /Foto: Daniel Ibanez – CNA

Encontrar-se na modalidade on-line para fazer o balanço da situação muito problemática vivida por vários países do Oriente Médio, ainda à mercê de guerras e fugas forçadas, é uma das peças que vão compor o caminho de aproximação à viagem apostólica do Papa Francisco ao Iraque em março de 2021.

O cardeal Leonardo Sandri, Prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais, explica as razões do que já promete ser um ato histórico, altamente corajoso, precursor de caminhos de diálogo e reconciliação, e sublinha o seu significado em particular para aqueles que pagaram um alto preço, também em vidas humanas:

Cardeal Sandri: Na sexta-feira passada, o pregador da Casa Pontifícia, na sua pregação de Advento, recordou-nos as palavras do profeta Isaías: consola, consola o meu povo. Para mim, essa visita do Papa significa um enorme gesto de consolo para todos esses países e povos que sofreram – Iraque, em particular – a guerra, a perseguição e a emigração, tendo de deixar tudo para trás, especialmente a população cristã, mas também as de todas as religiões e de todas as confissões. As vítimas têm o denominador comum dos filhos de Deus que foram injustamente e cruelmente reprimidos. Este é, verdadeiramente, um gesto extraordinário do Papa, que há tanto tempo queria fazer isso.

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Lembro-me de que, na reunião da Roaco (Reunião Obras Ajuda Igreja Orientais, ndr), em 2019, o Papa disse: ‘Quero ir ao Iraque’. E já naquela ocasião, todas as esperanças foram abertas para esta visita, o que traz consolo, estímulo, encorajamento para os Pastores da Igreja. Devemos curvar-nos perante os Pastores que ali permaneceram apesar de todas as dificuldades, apesar de todas as ameaças, dos ataques. Eles permaneceram ali, foram o exemplo do bom Pastor que não foge. Para todos os sacerdotes, os religiosos, neste país tão rico em história, começando por Abraão, da Igreja assíria. Isso tem demonstrado firmeza na fé e na tribulação. Portanto, será um gesto de grande consolo e força que se estenderá a toda a realidade social, civil e política deste país, porque o consolo que Jesus Cristo traz, que o Papa traz é para todos e especialmente para aqueles que sofrem. Será uma espécie de toque de sino para todo o Oriente Médio, depois de tantas tribulações que ainda existem na Síria, no Líbano. O Papa irá encorajá-los a serem, neste contexto, homens de comunhão e testemunhas do amor de Deus.

O senhor visitou o Iraque várias vezes. Como será acolhido o Papa Francisco, também pelos muçulmanos?

Cardeal Sandri: Penso que bem – e não só por causa da pessoa do Papa Francisco, o homem desarmado que só tem as armas do encontro, do sorriso, de ir ao encontro daqueles que mais precisam -, porque o Papa se apresenta com uma carteira de identidade muito importante: a Fratelli tutti e a Declaração de Abu Dhabi sobre a fraternidade humana. Como podemos querer construir um novo mundo de justiça, paz, liberdade, respeito pelos direitos humanos e liberdade religiosa, se não nos considerarmos irmãos, independentemente da identidade religiosa que deve ser mantida com todo o empenho? Quando estive no Iraque, em 2019, com todos os nossos delegados Roaco para ver as necessidades no terreno, pude apreciar com que dignidade, respeito e amor o governo iraquiano, mas também as autoridades do Curdistão e todos os líderes muçulmanos nos receberam. Basta pensar, a primeira vez que fui ao Iraque, quando cheguei a Kirquq – havia ainda muitos ataques – o patriarca Sako, que era então bispo, a primeira coisa que ele me fez fazer foi visitar uma mesquita. Fui recebido por imãs xiitas e sunitas, e eu tive de fazer um discurso. Não tenho dúvidas de que o corpo social do Iraque, em todas as suas componentes, receberá o Papa com entusiasmo.

No seu discurso na reunião sobre a emergência humanitária na região, realizada no Vaticano em 10 de dezembro último, o senhor recordou que a ferida da emigração afeta sobretudo os jovens. O que pode ser feito para deter esta hemorragia?

Cardeal Sandri: Foi dito muito claramente: é inútil para nós vivermos com essas sanções. Não se podem construir casas novas. Como podem os jovens encontrar ali a segurança para o futuro, para os seus estudos, para a formação de uma família? Dar aos jovens um futuro. A Igreja o dá do ponto de vista da luz que é Jesus Cristo, mas deve haver instâncias, nacionais e internacionais, que favoreçam a permanência. Existem profissionais maravilhosos em todas as áreas da ciência e da cultura.

O senhor acredita que, uma vez que consigam regressar, os católicos poderão contribuir para o renascimento dos seus países? Será dada a eles a oportunidade de o fazerem, em coexistência pacífica com os muçulmanos e outras religiões?

Cardeal Sandri: Espero e desejo que assim seja. Os cristãos que querem regressar devem encontrar todas as condições de segurança para uma vida digna. Eles, que talvez tenham se estabelecido através de outros membros da família que emigraram para o ocidente, digam “vamos voltar”. Mas é evidente que as maiores dificuldades são para aqueles que regressam, não para aqueles que partem. Aqueles que regressam, o fazem voluntariamente. Não seria um país de prosperidade se eles não pudessem participar na vida política. É por isso que insistimos tanto na Congregação que devemos dar a muitos jovens a possibilidade de serem formados também na Doutrina Social da Igreja. Os leigos devem construir o seu próprio país, a sua pátria, e não apenas receber indicações dos seus líderes. É você, cristão, que contribui, através dos princípios do Evangelho, para a construção desta sociedade que todos queremos inspirada por Jesus, pela Fratelli tutti e pela dignidade do homem e da mulher, para que possa viver de acordo com as suas próprias crenças e fé. 

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