IGREJA

Cardeal Czerny: “A Igreja caminha com os que sofrem, não à frente deles”

Em sua primeira entrevista ao Reino de Eswatini, o Cardeal Michael Czerny deixou uma mensagem profunda sobre o papel da Igreja no mundo contemporâneo

Da redação, com Vatican News

Cardeal Michael Czerny / Foto: Regional Norte 1

O purpurado, que é Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, falava ao Vatican News, à margem das celebrações do Jubileu de Ouro da Associação Inter-regional dos Bispos da África Austral (IMBISA), que decorre em Manzini (eSwatini) sob o tema “Uma caminhada sinodal, alimentada pela compaixão e florescendo na fé, como peregrinos da esperança.”

Uma Igreja que acompanha, não que controla

“A Igreja não é uma agência de desenvolvimento”, afirmou o Cardeal Czerny. “Ela caminha ao lado do seu povo no desejo de crescer e florescer.”

Segundo explicou, o trabalho do seu Dicastério não é substituir os governos ou organizações, mas garantir que os agentes do desenvolvimento humano não percam de vista a fé e a esperança.

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“A nossa missão é acompanhar — ser sinal e experiência de esperança, que as pessoas precisam para continuar o caminho”, sublinhou.

Durante a sua intervenção aos delegados da IMBISA, o Cardeal recordou que a liderança na Igreja — seja de bispos, sacerdotes ou leigos — não consiste em oferecer soluções prontas, mas em caminhar junto com o povo.

“O papel de um líder não é necessariamente resolver problemas, mas estar presente, encorajar e recordar que Deus está próximo”, disse.

Caminhar com os que estão em movimento

Na véspera da sua viagem à África do Sul, onde presidirá à celebração do Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, o Cardeal Czerny refletiu sobre os desafios enfrentados pelos migrantes e refugiados na África Austral — desde o acesso à educação e à saúde até ao aumento da xenofobia.

“Não existe uma única resposta”, destacou. “O mais importante é que, em cada lugar, a Igreja se pergunte: como podemos responder? Às vezes, o simples fato de estar com as pessoas já é algo muito poderoso, porque elas sentem que não estão sozinhas.”

O Cardeal recordou os quatro verbos de Papa Francisco que orientam a resposta da Igreja à migração: acolher, proteger, promover e integrar.

E deixou um conselho aos agentes pastorais: “Não pensem em si mesmos como solucionadores de problemas ou representantes isolados da Igreja. Convidem outros a conhecerem os migrantes de perto. Ninguém que os encontre pessoalmente permanece indiferente. O encontro em si já é o começo da solução.”

Presença fiel nos hospitais e na criação

Referindo-se à pastoral da saúde, o Cardeal Czerny destacou que, mesmo quando a Igreja já não administra diretamente hospitais, a sua missão espiritual continua essencial.

“Os governos podem gerir as estruturas, mas não podem responder às necessidades espirituais dos doentes. Devemos perguntar como estar presentes junto de quem sofre, levando Cristo a esses lugares de dor e de esperança.”

Ele relacionou essa mesma atitude de presença e cuidado com o Tempo da Criação, convidando os fiéis a pequenos gestos comunitários de amor pela casa comum.

“Se cuidas da criação, convida alguém para caminhar contigo — plantar árvores, visitar um rio, conhecer comunidades atingidas pela seca. O cuidado pela criação nasce sempre de uma relação.”

Esperança, paz e conversão do coração

Na homilia da Missa do Jubileu de Ouro da IMBISA, celebrada na quinta-feira, 25 de setembro, o Cardeal centrou-se na mensagem da paz, evocando as regiões em conflito, como Cabo Delgado, Sudão do Sul e a Terra Santa.

“Quando ouvimos falar de guerra, talvez a única coisa que possamos fazer seja rezar. Mas será que rezamos mesmo — ou apenas nos queixamos das notícias? Transformemos a nossa angústia em oração”, exortou.

O Cardeal retomou ainda o apelo do Papa Francisco à “desarmamentação do coração”.

“Antes de fazermos longos discursos sobre a paz, precisamos enfrentar as guerras interiores que trazemos dentro de nós. A verdadeira paz começa no coração e nas relações.”

Um jubileu com rosto sinodal

Celebrando 50 anos de história, o Cardeal Czerny elogiou a escolha da IMBISA de comemorar o jubileu através de uma Assembleia Sinodal.

“Em vez de olhar para trás com nostalgia, os bispos escolheram celebrar caminhando juntos, escutando-se e discernindo em conjunto. Este é o modo mais fiel e esperançoso de preparar os próximos 50 anos.”

Uma cruz feita de esperança

Antes de partir para a África do Sul, o Cardeal falou sobre a cruz de madeira que traz ao peito — feita a partir da madeira de um barco de migrantes que deixou o norte de África rumo a Lampedusa.

“O vermelho representa o sofrimento de Cristo e dos que estão em movimento; o branco é a luz da Ressurreição; e o prego une-nos à Cruz. É um crucifixo contemporâneo — um lembrete de que Cristo continua a sofrer hoje na vida dos deslocados.”

O Cardeal Czerny concluiu agradecendo o acolhimento caloroso em Eswatini e deixou uma mensagem à Igreja na África Austral:

“Sede uma Igreja que acompanha — que não caminha à frente nem acima dos outros, mas com eles, como peregrinos da esperança.”

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