Confira um resumo das reflexões feitas no último ciclo de catequeses do Santo Padre; nesta quarta-feira, 11, aguarda-se uma nova reflexão
Julia Beck
Da redação, com informações do Boletim da Santa Sé
Nesta quarta-feira, 11, já é esperada a tradicional audiência geral com o Papa, popularmente conhecida como catequese. Entre 31 de agosto de 2022 e 4 de janeiro de 2023 (quarta-feira passada), o Papa Francisco realizou 14 Catequeses sobre o discernimento.
Do final do mês de agosto em diante, apenas três Audiências Gerais não tiveram como tema o discernimento: 21 de setembro e 9 de novembro (dois dias em que o Pontífice comentou sobre suas respectivas viagens apostólicas ao Cazaquistão e ao Bahrein), e o dia 28 de dezembro (data em que o Santo Padre fez uma reflexão sobre “O Natal com São Francisco de Sales”).
As 14 Catequeses sobre o discernimento foram divididas nos seguintes temas: “O que significa discernir?”; “Um exemplo: Inácio de Loyola”; “Os elementos do discernimento. A familiaridade com o Senhor”; “Os elementos do discernimento. Conhecer-se a si mesmo”; “Os elementos do discernimento. O desejo”; “Os elementos do discernimento. O livro da própria vida”; “A matéria do discernimento. A desolação”; “Por que estamos desolados?”; “A consolação”; “A consolação autêntica”; “A confirmação da boa escolha”; “A vigilância”; “Ajudas para facilitar o discernimento” e “O acompanhamento espiritual”.
Confira os principais ensinamentos do Santo Padre em cada uma delas:
O que significa discernir?
No início do ciclo de catequeses sobre o discernimento, o Papa Francisco afirmou que discernir é um ato importante que diz respeito a todos. Ele sublinhou que as escolhas são parte essencial da vida e é através das escolhas que se concretiza o projeto de vida e a relação de cada um com Deus.
O discernimento apresenta-se como um exercício de inteligência, aptidão e vontade, disse o Pontífice. O Papa destacou que é muito importante saber discernir, e que as grandes escolhas podem nascer de circunstâncias à primeira vista secundárias, mas que se revelam decisivas.
Conhecimento, experiência, afetos e vontade são alguns elementos indispensáveis do discernimento elencadas por Francisco.
“O discernimento comporta um esforço, pois Deus convida-nos a avaliar cada situação e a escolher: criou-nos livres e quer que exerçamos a nossa liberdade. Discernir é algo exigente, mas é indispensável para viver e requer conhecimento próprio, isto é, que eu saiba qual é o bem para mim no momento e situação em que me encontro, mas requer sobretudo uma relação filial com Deus” – Papa Francisco
Um exemplo: Inácio de Loyola
O Santo Padre apresentou Santo Inácio de Loyola como aquele que ensina sobre o discernimento. Na guerra, o santo ficou ferido e durante sua recuperação, para passar o tempo, pediu que o trouxessem um livro de cavalaria.
Em sua casa, Inácio de Loyola não tinha livros desse gênero, somente sobre a vida de santos. “Teve de se contentar com estes. E no decurso desta leitura, começou a descobrir um outro mundo, que o fascinou: admirou as figuras de São Francisco de Assis e de São Domingos de Gusmão e sentiu o desejo de os imitar”.
Francisco destacou que é discernimento que ajuda a reconhecer os sinais de que “Deus Se faz encontrar”, mesmo nas situações imprevistas e contratempos, como foi para Inácio de Loyola por meio daquela ferida. “Daí pode nascer um encontro, que muda a vida para sempre”, destacou.
A familiaridade com o Senhor
O primeiro dos elementos constitutivos do discernimento é a oração, observou o Papa. Nasce de uma oração rica de afeto que permite falar com Deus como quem fala com um amigo.
Efetivamente, o Pontífice ressaltou que discernir e decidir fazer o que agrada a Deus é exigente, mas os Santos faziam-no com naturalidade. Conseguiam agir desse modo porque, através da oração, alimentavam a amizade com Deus e, pouco a pouco, tornavam-se capazes de distinguir o mais importante.
“Discernir não é fácil, porque as aparências enganam, mas a familiaridade com Deus pode dissolver suavemente dúvidas e receios e tornar-nos cada vez mais capazes de reconhecer aquilo que conta” – Papa Francisco
Conhecer-se a si mesmo
Para um bom discernimento, Francisco sublinhou que além da oração (vivida em familiaridade e confidência com Deus), é preciso também o conhecimento de si mesmo e de desejos mais profundos. Segundo o Santo Padre, isto só se consegue com um paciente trabalho de introspeção, para pensar o modo de agir, os sentimentos e os pensamentos que condicionam a vida.
O Pontífice comentou que é preciso aprender a distinguir entre emoções e impulsos da alma. “O problema é que não nos conhecemos suficientemente e, assim, não sabemos aquilo que verdadeiramente queremos. Para superar tal ignorância é de grande ajuda o exame de consciência, ou seja, aquele hábito bom de repassar, calmamente, aquilo que fizemos durante o dia, aprendendo a notar, nas avaliações e nas decisões, aquilo a que demos maior importância, o que procuramos conseguir e porquê, e qual foi o resultado; aprendendo sobretudo a reconhecer aquilo que sacia o nosso coração”.
O desejo
Depois de refletir sobre a oração e a importância de cada pessoa ter o conhecimento de si mesmo, o Papa falou sobre o desejo, outro elemento indispensável para o discernimento.
Discernir implica procurar, disse o Santo Padre, o que por sua vez pressupõe a consciência de que falta algo. O desejo é, assim, o conhecimento da falta de plenitude que impele a fazer um caminho em busca dela, prosseguiu.
O desejo, indicou Francisco, exige saber o que se quer. “Muitas pessoas sofrem porque não sabem o que querem da vida. Como, provavelmente, nunca encontraram o seu desejo profundo, não se decidem a mudar e ficam-se pelas boas intenções”, alertou.
O Santo Padre lembrou que Jesus, antes de realizar um milagre, interrogava a pessoa sobre o seu desejo: Ele pretendia fazer luz sobre o que realmente o coração quer. E no coração humano, explicou o Pontífice, Deus colocou um profundo desejo por Ele. O pedido do Papa é que fiéis peçam a Deus que os ajude a conhecer esse desejo e a concretizá-lo.
O livro da própria vida
A história de vida de cada pessoa é o “livro” mais precioso que muitos, infelizmente, não leem, frisou o Papa Francisco. De acordo com o Santo Padre, o ser humano que não conhece o próprio passado está condenado a repeti-lo.
Ler a própria história, pontuou o Papa, significa reconhecer e livrar-se de elementos tóxicos, abrindo o coração para horizontes mais amplos, identificando facetas e detalhes importantes da vida, que até agora tinham passado despercebidos.
Francisco revelou que a leitura do livro da própria vida permite que cada pessoa note vertentes possíveis da realidade que reforçam o gosto interior, a paz e a criatividade. Parar para reconhecer a própria vida, salientou o Pontífice, é indispensável ao discernimento, pois aperfeiçoa o olhar tornando-o capaz de ver os pequenos milagres que o bom Deus realiza diariamente.
A desolação
Deus fala ao coração e a experiência da desolação se manifesta em uma certa escuridão da alma, que se sente tíbia, preguiçosa e triste, afirmou o Santo Padre. “Aprendermos a ler esta tristeza é importante, para evitar que o tentador a utilize como instrumento para nos desencorajar”.
“Quando o desânimo sobrevém, devemos continuar com firmeza o que nos tínhamos proposto a fazer. Se abandonássemos o trabalho ou o estudo por sentir tédio ou tristeza, nunca terminaríamos nada. O mesmo sucede na vida espiritual. Infelizmente, por causa da desolação, alguns abandonam a oração, e até o matrimônio ou a vida religiosa, sem parar, primeiro, para interpretar esse estado de espírito, com a ajuda de uma pessoa prudente” – Papa Francisco
Para quem quer servir o Senhor, Francisco declarou que há uma regra de ouro: nunca fazer alterações em tempo de desolação. Antes, aproveitar a desolação como uma oportunidade para converter a vida ou para imitar Jesus.
Por que estamos desolados?
Ainda sobre a desolação, o Papa comentou que ela sacode a alma, mantém-na desperta, favorece a vigilância, convida à gratuidade e a não agir sempre e só para viver a consolação. “Dá-nos a possibilidade de crescer, iniciar uma relação mais madura e bela com o Senhor e com as pessoas queridas, uma relação que não fique reduzida à mera troca”, pontuou.
“O Evangelho mostra-nos muitas vezes Jesus circundado de pessoas que O procuram para conseguirem curas, ajudas materiais, e não simplesmente pelo desejo de estarem com Ele; apesar de circundado pela multidão, estava só. Faz-nos muito bem estar com Jesus, sem outro desejo que não Ele mesmo, exatamente como procedemos com as pessoas que amamos: queremos conhecê-las cada vez melhor, porque é bom estar com elas”, disse Francisco.
A consolação
Outro elemento do discernimento é a consolação. Segundo o Santo Padre trata-se de uma experiência profunda de alegria interior. “A pessoa sente-se de tal modo envolvida pela presença de Deus, que até a dor dos próprios pecados pode tornar-se motivo de consolação. E, porque a consolação está unida à esperança, faz-nos pôr em ação iniciativas continuamente adiadas ou nem sequer vislumbradas”, destacou.
Uma profunda familiaridade com Deus é um dom do Espírito Santo, disse o Pontífice. Francisco alertou também para as consolações que podem ser falsas e sublinhou a importância do discernimento para distinguir as verdadeiras consolações. “Para encontrar as consolações de Deus, é preciso procurar primeiro o Deus das consolações”.
A consolação autêntica
“Como reconhecer a autêntica consolação?” Foi o que respondeu o Papa em sua décima Catequese sobre o discernimento. O Santo Padre afirmou que Santo Inácio de Loiola dá alguns critérios, entre eles o convite para verificar se tudo está orientado para o bem.
“Se isto acontece, é sinal de que vamos por bom caminho. Entretanto, se há algo que nos inquieta ou nos distrai do nosso bom propósito inicial, é indicação de que aquele pensamento não vem de Deus”, argumentou.
O Pontífice afirmou que é muito importante fazer pacientemente este exame sobre a origem e a autenticidade dos próprios pensamentos: “quanto mais nos conhecemos, mais somos capazes de advertir a chegada de pensamentos que provêm do espírito mau e nos desviam dos nossos bons propósitos”.
Este exame de consciência cotidiano é fundamental, garantiu o Papa, na medida em que ajuda a humanidade a crescer na liberdade e a dar-se conta de que a graça de Deus age em todos. A autêntica consolação é, portanto, uma espécie de confirmação de que está sendo cumprida a vontade de Deus.
Confirmação da boa escolha
O tempo é um critério fundamental para se reconhecer a voz de Deus no meio de todas as outras vozes. Por isso, Francisco comentou que uma vez tomada a decisão no processo do discernimento, é importante, na fase sucessiva, atenção aos sinais para ver se confirmam ou desmentem tal decisão.
O Papa revelou que só Deus sabe o que é verdadeiramente bom para cada pessoa; então é do interesse de todos oferecer a Ele aquilo que se tem de mais querido. “Isso permite-nos vivê-lo em toda a sua verdade, como um dom que o Senhor nos fez, como um sinal da sua bondade gratuita, sabendo que a nossa vida e toda a história estão nas suas mãos benévolas”.
“É o temor divino que afugenta todos os outros temores, todos os outros medos, porque está orientado para Aquele que é o Senhor de todas as coisas; na presença d’Ele, nada nos pode inquietar nem turvar. Reconhecer isso é fundamental para uma boa decisão e tranquiliza-nos sobre aquilo cujo controle ou previsão não está nas nossas mãos: a saúde, o futuro, os entes queridos, os nossos projetos” – Papa Francisco
A vigilância
Uma atitude essencial a fim de que não se perca todo o esforço para discernir o que é melhor e tomar a decisão certa é a vigilância, indicou o Santo Padre. Ele frisou que existe o risco de que, após todo o trabalho de discernimento feito, venha o Maligno e estrague tudo.
O Pontífice sublinhou que, em sua pregação, Jesus insiste muito que o bom discípulo é vigilante, permanece atento e pronto a realizar o próprio dever. “Trata-se de uma disposição de ânimo dos cristãos que esperam pela vinda definitiva do Senhor, mas também uma atitude cotidiana para que as nossas boas escolhas, consequência de um bom discernimento, possam seguir em frente de modo perseverante e produzir bons frutos”, salientou.
Ajudas para facilitar o discernimento
Francisco ressaltou que a vida obriga constantemente os homens a fazerem escolhas. Porém, o discernimento não é simples e não se pode fazer apenas com as próprias forças. Daí a invocação inicial na Liturgia das Horas: “Deus vinde em nosso auxílio”!, citou.
“Deus está sempre conosco e torna o discernimento mais fácil, colocando ao nosso dispor algumas ajudas. Uma delas é a Palavra da Sagrada Escritura, com a qual podemos interpretar o que se passa no nosso coração, nele distinguindo a voz de Deus e identificando os impulsos que Ele mesmo lá deixou”, indicou.
A Escritura, explicou o Papa, consolida a relação afetiva do homem com Jesus, que é outra ajuda divina para o discernimento: a vida com Cristo é uma amizade que cresce, dia após dia, e transforma o coração.
Por fim, outra ajuda divina que o Santo Padre destacou para o discernimento é o dom do Espírito Santo. “Presente em nós, dá novo significado à Palavra de Deus e indica caminhos de vida, até mesmo no meio da escuridão. Com estas ajudas não devemos temer”.
Acompanhamento espiritual
“O acompanhamento espiritual é, antes de mais, um importante meio para o conhecimento de nós mesmos: na verdade, para melhor nos conhecermos, é útil contar a outra pessoa a nossa fragilidade, que se revela uma verdadeira riqueza quando a sabemos aceitar e oferecer a Jesus Cristo”, disse o Pontífice na sua última Catequese sobre o discernimento.
O Papa refletiu que o acompanhamento espiritual, se realizado na abertura do coração a Cristo e na docilidade ao Espírito Santo, ajuda a desmascarar a falsidade de alguns pensamentos negativos que voltam insistentes e angustiam.
Francisco garantiu também que aquele ou aquela a quem cabe acompanhar não substitui Cristo, antes conduz até Ele, como na passagem evangélica do paralítico, e encoraja a ver a realidade com os olhos de Deus.
“O acompanhamento é, assim, uma frutuosa experiência de fraternidade espiritual, porque como filhos do mesmo Pai somos uma família em caminho” – Papa Francisco
O Santo Padre indicou Maria como mestra do discernimento: fala pouco, escuta muito, medita tudo no seu coração e deixa como recomendação fazer tudo o que Jesus diz.