VIAGEM DO PAPA FRANCISCO AO CANADÁ – 24 A 30 DE JULHO DE 2022
Encontro com uma delegação de indígenas presentes em Quebec
Arcebispado de Quebec
Sexta-feira, 29 de julho de 2022
Santa Sé
Queridos irmãos e irmãs!
Saúdo-vos cordialmente e agradeço por vos terdes deslocado até aqui, vindos de vários lugares. A vastidão desta terra faz pensar na imensidade do caminho de cura e reconciliação, que estamos a percorrer juntos. De fato, a frase que nos acompanha desde março, desde quando me foram visitar a Roma os delegados indígenas, e que carateriza os momentos da minha visita aqui é Caminhar Juntos: Walking Together / Marcher Ensemble.
Vim ao Canadá como amigo para vos encontrar, para ver, ouvir, aprender e calcular como vivem as populações indígenas deste país. Vim como irmão, para descobrir pessoalmente os frutos bons e maus produzidos pelos membros da família católica local, no decurso dos anos. Vim com espírito penitencial, para vos manifestar o pesar que sinto no coração pelo mal que não poucos católicos vos causaram apoiando políticas opressivas e injustas aplicadas a vós. Vim como peregrino, com as minhas limitadas possibilidades físicas, para propiciar mais passos em frente convosco e a vosso favor: para que se prossiga na busca da verdade, progrida na promoção de percursos de cura e reconciliação, para que se continue para diante semeando esperança para as futuras gerações de indígenas e não indígenas que desejam viver juntos, fraternalmente, em harmonia.
Mas, já próximo da conclusão desta intensa peregrinação, quero dizer-vos que, se já vinha animado por estes desejos, volto para casa muito mais enriquecido, porque levo no coração o tesouro incomparável feito de pessoas e populações que me marcaram; tesouro de rostos, sorrisos e palavras que permanecem no meu íntimo; de histórias e lugares que não poderei esquecer; de sons, cores e emoções que vibram intensamente dentro de mim. Verdadeiramente posso afirmar que, enquanto vos visitava, as vossas realidades, as realidades indígenas desta terra, visitaram o meu íntimo: entraram em mim e sempre me acompanharão. Ouso dizer – se mo permitis – que de certo modo, agora, também eu me sinto parte da vossa família e disso me sinto honrado. A recordação da festa de Santa Ana, vivida juntamente com diferentes gerações e tantas famílias indígenas, permanecerá indelével no meu coração. Num mundo que muitas vezes, infelizmente, é individualista, quão precioso é este sentido de família e comunidade tão genuíno entre vós! E como é importante cultivar bem o vínculo entre os jovens e os idosos, e manter uma relação sadia e harmoniosa com toda a criação!
Queridos amigos, desejo confiar tudo o que vivemos nestes dias e a prossecução do caminho que nos espera à cuidadosa solicitude de quem sabe guardar o que conta na vida: penso nas mulheres, particularmente em três delas. Primeiro, em Santa Ana, cuja ternura e proteção pude sentir ao venerá-la juntamente com um povo de Deus que reconhece e honra as avós. Segundo, penso na Santa Mãe de Deus: nenhuma criatura merece mais do que Ela ser definida peregrina, porque sempre – também hoje, mesmo agora – está a caminho: a caminho entre Céu e terra, para cuidar de nós por conta de Deus e para nos conduzir pela mão ao seu Filho. Finalmente, com frequência nestes dias, a minha oração e o meu pensamento detiveram-se numa terceira mulher que nos acompanhou com a sua suave presença e cujos restos mortais se conservam não muito longe daqui: refiro-me a Santa Catarina Tekakwitha. Veneramo-la pela sua vida santa, mas não poderemos pensar que a sua santidade de vida, caraterizada por uma dedicação exemplar à oração e ao trabalho, bem como pela capacidade de suportar com paciência e mansidão tantas provações, tenha sido possível também por certos traços nobres e virtuosos herdados da sua comunidade e do ambiente indígena onde cresceu?
Estas mulheres podem ajudar a compor, voltar a tecer uma reconciliação que garanta os direitos dos mais vulneráveis e saiba olhar a história sem rancores nem cancelamentos. Duas delas, a Santíssima Virgem Maria e Santa Catarina, receberam de Deus um projeto de vida e, sem interpelar homem algum, deram o seu «sim» com coragem. Estas mulheres teriam podido responder mal a todos aqueles que se opunham àquele projeto, ou então permanecer submissas às normas patriarcais de então e resignar-se, sem lutar pelos sonhos que o próprio Deus imprimira nas suas almas. Não seguiram esta opção, mas abriram o caminho com mansidão e firmeza, com palavras proféticas e gestos decisivos, e cumpriram aquilo para que foram chamadas. Que Elas abençoem o nosso caminho comum, intercedam por nós e por esta grande obra de cura e reconciliação tão agradável a Deus. De coração vos abençoo. E peço-vos, por favor, que continueis a rezar por mim.