CATEQUESE DO PAPA FRANCISCO
Sala Paulo VI – Vaticano
Quarta-feira, 8 de janeiro de 2020
Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal (Canção Nova)
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
O livro dos Atos dos Apóstolos, na parte final, conta que o Evangelho prossegue seu curso não somente por terra, mas por mar, em um vaio que conduz Paulo prisioneiro de Cesareia para Roma (cfr At 27, 1-28, 16), no coração do Império, para que se realize a palavra do Ressuscitado: “sereis minhas testemunhas […] até os confins do mundo” (At 1, 8). Leiam o Livro dos Atos dos Apóstolos e vocês vão ver como o Evangelho, com a força do Espírito Santo, chega a todos os povos, se faz universal. Peguem-no. Leiam-no.
A navegação encontra, desde o início, condições desfavoráveis. A viagem se faz perigosa. Paulo aconselha não prosseguir com a navegação, mas o centurião não lhe dá crédito e se confia ao comandante e ao armador. A viagem prossegue e começa um vento tão furioso que a equipagem perde o controle e deixa o navio à deriva.
Quando a morte parece próxima, o desespero toma conta de todos Paulo intervém e conforta os companheiros dizendo o que ouvimos: “Foi-me apresentado […] esta noite apareceu-me um anjo de Deus, a quem pertenço e a quem sirvo, o qual me disse: “Não temas, Paulo. É necessário que compareças diante de César. Deus deu-te todos os que navegam contigo” (At 27, 23-24). Mesmo na prova, Paulo não deixa de ser custódio da vida dos outros e animados da sua esperança.
Lucas nos mostra assim que o plano que guia Paulo para Roma coloca a salvo não somente o Apóstolo, mas também os seus companheiros de viagem, e o naufrágio, da situação de desgraça, transforma-se em oportunidade providencial para o anúncio do Evangelho.
Ao naufrágio segue a chegada à ilha de Malta, cujos habitantes demonstram uma calorosa acolhida. Os malteses são bravos, são mansos, são acolhedores já desde aquele tempo. Chove e faz frio e esses acendem uma fogueira para assegurar aos náufragos um pouco de calor e de alívio. Também aqui Paulo, de verdadeiro discípulo de Cristo, coloca-se a serviço para alimentar o foco com alguns ramos. Durante estas operações, é mordido por uma serpente mas não sofre dano algum: o povo, olhando para isso, diz: “Mas este deve ser um grande malfeitor, porque se salva de um naufrágio e termina mordido por uma serpente!”. Esperavam o momento que caísse morto, mas não sofre dano algum e até mesmo é visto – em vez de um malfeitor – por uma divindade. Na realidade, aquele benefício vem do Senhor Ressuscitado que o assiste, segundo a promessa feita antes de sair ao céu e dirigida os crentes: “manusearão serpentes e, se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal; imporão as mãos aos enfermos e eles ficarão curados” (Mc 16, 18). Diz a história que, daquele momento, não há mais serpentes em Malta: esta é a benção de Deus pelo acolhimento deste povo tão bom.
De fato, a estadia em Malta se torna para Paulo a ocasião propícia para dar “carne” à palavra que anuncia e exercitar assim um ministério de compaixão na cura dos doentes. E esta é uma lei do Evangelho: quando um crente faz experiência da salvação não a retém para si, mas a coloca em círculo. “O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de beleza procura, por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos outros (Esort. Ap. Evangelii gaudium, 9). Um cristão “provado” pode certamente fazer-se mais próximo a quem sofre porque sabe o que é o sofrimento e tornar o seu coração aberto e sensível à solidariedade para com os outros.
Paulo nos ensina a viver as provações estreitando-nos a Cristo, para amadurecer a “convicção de que Deus pode atuar em qualquer circunstância, mesmo no meio de aparentes fracassos” e a “certeza de quem se oferece e entrega a Deus por amor, seguramente será fecundo” (ibid, 279). O amor é sempre fecundo, o amor a Deus sempre é fecundo, e se você se deixa tomar pelo Senhor e recebe os dons do Senhor, isso te permitirá dá-los aos outros. Sempre vai além o amor a Deus.
Peçamos hoje ao Senhor para nos ajudar a viver toda prova apoiados pela energia da fé; e para sermos sensíveis aos tantos náufragos da história que chegam exaustos em nossas costas, para que também nós saibamos acolhê-los com aquele amor fraterno que vem do encontro com Jesus. É isso que salva do gelo da indiferença e da desumanidade.