VIDA ESPIRITUAL

Carmelita explica como rezar à luz das reflexões de Santa Teresa D'Ávila

Religiosa comenta por que a oração é fundamental, como progredir na vida espiritual e os quatro graus da oração ensinados por Santa Teresa D’Ávila

Kelen Galvan
Da redação

Foto: Jacob Wackerhausen via Getty Images

“Assim como o oxigênio e a água são fundamentais para a nossa vida física, a oração é fundamental para nossa vida espiritual.” É o que afirma a Irmã Carmelita Descalça, Maria Juliana Cruz da Eucaristia de São José.

A religiosa lembra que quando se ama alguém, há o desejo de estar perto. Ela cita que “recuperar o desejo de estar na presença do Senhor, ouvi-Lo e adorá-Lo” foi uma das expectativas do Papa Francisco ao declarar 2024 como o Ano da Oração, em preparação para o Jubileu 2025. O Santo Padre, explica Irmã Juliana, espera que toda a Igreja, ou seja, cada um, redescubra e recupere o desejo de estar com Deus.

A oração é um meio privilegiado para manter uma conexão profunda com Deus, com os irmãos, consigo mesmo e com tudo aquilo que é criado, indica a carmelita. “Como cristãos, seguimos a Jesus Cristo que fez da oração o seu ambiente natural e cotidiano de encontro com o Pai. Jesus rezava muito e rezava sempre. E, no decurso de sua missão, Ele sempre procurou, no diálogo e na comunhão com o Pai, toda a sua força e inspiração”, exprime a religiosa.

Por que rezar e como progredir na oração?

Irmã Maria Juliana Cruz da Eucaristia de São José, OCD / Foto: Arquivo pessoal

Para progredir na vida de oração, Irmã Juliana indica três passos: querer, fixar os olhos em Jesus e deixar-se encontrar por Deus.

Sobre o primeiro, afirma que é preciso colocar-se numa atitude de realmente querer estar com o Senhor. Ou seja, tomar consciência de que se pode viver em profunda comunhão com Ele, desde o mais íntimo de si.

Ao comentar sobre o ato de fixar os olhos em Jesus, a religiosa frisa que Ele deve ser o modelo. “Ele é tudo para nós. Então, olhar sempre para Ele, que ‘é o caminho, é a verdade, é a vida’.”

O terceiro passo, o de deixar-se encontrar por Deus, evoca a perda do medo de rezar, de estar com Deus, conversar com Ele. “Ele é Pai. Está sempre pronto a nos acolher, a nos entender. Então, entregar tudo a Ele, também os nossos pecados, limites, fracassos… Tudo!”, reitera.

Um quarto passo, prossegue a carmelita, é “alimentar a alma” com o alimento certo para progredir. “A vivência dos sacramentos, a Eucaristia, a confissão, participação na Santa Missa, a escuta da Palavra de Deus, a leitura dos santos, leituras espirituais e, depois, aqueles cuidados básicos para que a nossa oração realmente seja eficaz – acalmar a mente, o coração e escolher um local apropriado. Reservar um tempo e ser fiel”, sinaliza.

Santa Teresa e os quatro graus da oração

Santa Teresa em glória, Pietro Novelli. Óleo sobre tela.

Nesta terça-feira, 15, a Igreja celebra Santa Teresa D’Ávila, considerada a grande doutora da oração, e “mãe fundadora do Carmelo”, como descreve a religiosa carmelita.

Em sua autobiografia, no “Livro da Vida”, Santa Teresa falou sobre o tratado da oração a partir do capítulo 11, no qual apresenta quatro graus da oração, fruto de sua própria vida espiritual.

“Esse tratado reflete diretamente a evolução da oração de Santa Teresa. É dela. Ela viveu esses graus. Mas nada impede que Deus, na sua infinita bondade – e tudo que é bom Ele quer para todos os Seus filhos –, que todos nós alcancemos esses graus”, pontua.

Primeiro grau

Para Santa Teresa, o primeiro grau é a meditação, entendido como a “oração dos principiantes”. Irmã Juliana explica que, neste estágio, é necessário reflexão e afeto sobre diversos temas. De maneira especial, um tema muito querido pela santa é o da Paixão do Senhor. A partir dele, a religiosa frisa que os fiéis devem colocar os olhos no crucificado, exercitando a mente e a reflexão.

Neste ponto, Santa Teresa fala que é preciso determinar-se e perseverar na oração a todo custo, sempre com os pés no chão, sem questões místicas que não correspondem à realidade. “Aconteça o que acontecer, venha o que vier, não desistir. E ela parte muito da questão de orar a vida. Aquilo que eu sou, aquilo que acontece comigo, colocar ali na oração. E apaixonar-se pela humanidade de Cristo”, exemplifica.

A “proximidade com a humanidade de Cristo” foi um ponto muito inovador da espiritualidade de Santa Teresa D’Ávila, sublinha a religiosa, tanto que é parte da espiritualidade carmelita.

Segundo grau

Santa Teresa vai chamar o segundo grau como “oração de quietude”. Nessa fase, a pessoa começa a perceber que a oração é puro dom de Deus e envolve um silêncio da vontade. O principal exercício é “amar” e “procurar um desejo grande de mudança de vida”, indica a carmelita.

“Existe uma fascinação pelo mistério de Deus. É o início das experiências místicas, mas é apenas o início. É algo muito sutil que vai acontecendo. Nesse ponto, ela fala muito de não se importar com as ‘fantasias’, as coisas que vêm à mente, mas continuar na oração”, aponta a carmelita.

Terceiro grau

O terceiro grau Santa Teresa chama de “sono das potências”. E ela diz que, nessa fase, “Deus mesmo passa a trabalhar em nós”. O Senhor se converte em jardineiro, ou seja, passa a cuidar do jardim, que é a alma.

“A alma somente necessita encaminhar na água (quando Santa Teresa fala da água, ela está se referindo ao dom da vida ou dom da graça). Somente encaminhar, abrir-se, dar espaço, receber e abraçar as graças que vem de Deus”, explica Irmã Juliana sobre os escritos da santa.

A carmelita explica o que seria “morrer para as coisas do mundo e degustar a Deus. Nesse grau, o sono das potências, a alma, a pessoa já começa, na sua oração, a viver um puro louvor. E manifesta então uma total mudança de vida”, indica.

Quarto grau

O quarto grau constitui já um processo onde há “experiência plena de união com Deus”. “É uma oração de total conformidade com a vontade divina. Aqui, o orante entrega-se à ação transbordante de Deus. Há uma clara consciência e experiência da pertença a Deus”, destaca.

Irmã Juliana explica que, no quarto grau, que é o da união, há uma fusão do ser humano com Deus. “E aqui sim começam os múltiplos episódios místicos, êxtases, voos no Espírito e por aí vai.”

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