Análise - Dom Jaime Spengler

Santa Maria e a dor da saudade - 1 ano da tragédia

A tragédia de Santa Maria ficará para sempre na história do Estado do Rio Grande do Sul e do Brasil

Dom Jaime Spengler
Arquidiocese de Porto Alegre

boate Kiss 1 ano tragedia

Familares fizeram uma vigília em frente à Boate Kiss na madrugada desta segunda-feira, 27 (Foto: EBC)

No dia 27 de janeiro de 2013, aconteceu, na cidade de Santa Maria, por imprudência e más condições de segurança, uma tragédia que vitimou 242 jovens, feriu outros 116 e marcou para sempre um número considerável de famílias. A tragédia de Santa Maria ficará para sempre na história não só daquela cidade, mas também do Estado do Rio Grande do Sul e do Brasil.

Com a divulgação das imagens e notícias a respeito daqueles fatos, subseguiram manifestações de diversas autoridades públicas, entidades, pessoas mais ou menos próximas às vítimas e suas famílias, organizações sociais etc. A partir de então, surgiram várias iniciativas, foram tomadas medidas com o objetivo de exigir maior segurança de locais destinados a eventos, festas, diversão com concentração de público.

Tais iniciativas são certamente úteis, necessárias e urgentes. Existe, hoje, um consenso bastante vigoroso em torno do dever premente de se investir nesta causa. Infelizmente, somos vistos como o povo do “jeitinho”. Existe “jeitinho” para burlar as leis de trânsito, para passar de ano na escola, para, talvez, ter energia elétrica ou água sem registro; ‘jeitinho’ para conseguir esse ou aquele documento, para burlar o fisco, para tirar ganho desse ou daquele contrato – especialmente se estiver envolvido o bem público! Enfim, nós brasileiros somos conhecidos pelo ‘jeitinho brasileiro’!

Sem desrespeitar a memória dos que tombaram na tragédia de Santa Maria nem as exigências legais necessárias e urgentes para promover a segurança de todos que frequentam espaços públicos, e sem minimizar a seriedade da situação da segurança geral de nosso povo, reconhecemos, sim, que em tantas situações buscamos o famoso ‘jeitinho’.

Não seria demais propor o engajamento decidido e determinado de todos na causa da segurança pública e na educação necessária para tanto. Esta, certamente, é uma causa que não pode ser delegada; cada cidadão de boa vontade precisa sentir, saber e aprender da própria responsabilidade. Não podemos nos esquecer das perdas irreparáveis causadas pela imprudência de alguns, o ‘jeitinho’ de poucos e, talvez, a indiferença de outros.

Respeitar a memória dos falecidos pode ser uma obra de misericórdia. Mas pode também ajudar a todos a resgatar um aspecto importante da convivência humana: o cuidado. Sim, precisamos talvez ainda aprender a cuidar uns dos outros e, ao mesmo tempo, nos deixar cuidar uns pelos outros. É verdade que o jovem, quase naturalmente, busca aventuras, gosta, por vezes, de experiências extremas. Entretanto, não se pode desconsiderar princípios básicos seja da própria natureza, seja da natureza em geral! Cuidar e nos deixar cuidar – eis o que nos compete!

A saudade é coisa bela e, ao mesmo tempo, triste. Bela, porque expressa carinho, respeito e bem querença. Triste, porque, por vezes, parece insaciável. A saudade deixa marcas. Diante da tragédia de Santa Maria, não foram poucas as famílias, os jovens, os cidadãos que ficaram marcados pela dor da saudade. Por isso, resta-nos, sim, o silêncio respeitoso – não a indiferença!

Como sociedade, precisamos, certamente, expressar nossa solidariedade e, ao mesmo tempo, nos comprometer a trabalhar em prol do necessário para que tais tragédias não se repitam! Aos familiares dos jovens que sofreram as consequências daquele incêndio expressamos palavras de conforto que nossa fé conserva: “para aqueles que creem, a vida não é tirada, mas transformada”.

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