Após quatro meses da tragédia de Mariana, águas do Rio Doce são monitoradas diariamente
Jéssica Marçal
Da Redação
O mundo todo recordou nesta terça-feira, 22, o Dia da Água. No Brasil, ocasião especial para recordar a situação das águas do Rio Doce, um dos grandes atingidos pelo mar de lama com rejeitos de mineração após o rompimento de barragens da mineradora Samarco em novembro do ano passado.
Quatro meses após a tragédia de Mariana (MG), o trabalho de recuperação do rio continua. O secretário-executivo do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce (CBH-Doce), Edson Valgas, disse que a situação do Rio Doce ainda é crítica em relação à quantidade de sedimentos e à turbidez, ou seja, à redução da transparência da água. Isso em comparação à situação do rio antes do dia 5 de novembro, quando ocorreu a tragédia.
“Nós estamos monitorando o tempo todo para entender o movimento desse sedimento no leito do rio e entender a dinâmica de diluição do próprio rio e estamos discutindo todas as ações necessárias para revitalizar a bacia e melhorar as condições do rio dando a ele as condições de manter a diversidade”.
O risco para a biodiversidade e até mesmo para a população provém, em grande parte, da poluição da água em decorrência da tragédia. No mês passado, o governo do Estado de Minas Gerais divulgou um relatório com uma avaliação dos efeitos e desdobramentos do rompimento da barragem de Fundão. Cerca de 80 entidades contribuíram com as pesquisas e análises, que incluíram a questão da água.
Segundo o relatório, 11 municípios mineiros tiveram o abastecimento de água comprometido por conta do ocorrido. Além disso, o nível de turbidez da água da bacia do Rio Doce estava acima dos parâmetros aceitáveis, mas isso também foi agravado pelo período chuvoso e consequente erosão nas margens. O documento indicou um provável impacto sobre nascentes, mas esse é um item ainda em pesquisa.
Com relação à qualidade da água, Edson diz que o Instituto Mineiro de Gestão das Águas tem vários pontos de monitoramento instalados ao longo de toda a bacia, começando no Rio Gualaxo e Piranga, que estão entre as regiões mais afetadas. Ao longo do Rio Doce, também há pontos de monitoramento 24h para acompanhar o nível do rio, a vazão e a turbidez.
O presidente do Comitê de Bacias Hidrográficas do Rio Piranga e vice-presidente do CBH-Doce, Carlos Eduardo Silva, informou que a Samarco está construindo quatro diques para contenção dos rejeitos sólidos que atingiram as águas do rio. Tal construção deve ser finalizada em julho ou agosto.
Impacto ambiental e aprendizado
Um mês após a tragédia, um laudo técnico preliminar do Ibama informava que o rompimento das barragens resultou na destruição de 1.469 hectares de vegetação; a estimativa era que pelo menos 400 espécies tenham sido afetadas.
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Hoje, quatro meses depois, Edson diz que o número total de espécies atingidas ainda é incerto, mas não pequeno. “Toda uma cadeia alimentar foi afetada diretamente e a gente não consegue precisar quantas espécies foram extintas ou sofreram danos, mas a gente acredita que esse número não seja pequeno”.
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Professora de Direito e autora de livros sobre meio ambiente, Patrícia Nunes Lima Bianchi atenta para o fato de que, no Brasil, não existe uma regulamentação quanto a programas preventivos de segurança das barragens.
“No caso de ‘Mariana’, a mineradora Samarco é a responsável pelas ações que assegurariam a não ocorrência de danos; além de repará-los caso a primeira hipótese não se realize. Contudo, mesmo que haja indenizações, multas etc., o dano causado aos familiares das vítimas dessas tragédias, e ao meio ambiente, jamais poderá ser ressarcido, já que, na maioria das vezes, tais danos são irreversíveis”, afirma em artigo publicado sobre o tema.
Tão grande tragédia não teria uma recuperação tão fácil. Edson explica que se trata de um trabalho de longo prazo, mas não há uma estimativa de quando o Rio Doce voltará a ser o que era antes da tragédia. “Antes do rompimento, ele (o rio) já estava numa situação em que carecia de muito investimento para a revitalização do próprio rio”, disse Edson, acrescentando que há um plano de ações até 2030 para revitalizar a bacia.
“Além do noticiado, poucos avanços acontecem para estimar claramente os graves danos causados. O que temos é o impacto já causado, e que aos poucos os malefícios aparecem. Se for feito tudo com comprometimento e de acordo com a rotina de remediação ambiental, em torno de uns dez anos ou mais”, opina a engenheira ambiental Andressa de Oliveira sobre a recuperação do Rio Doce.
Ela acrescenta o aprendizado que se tem com essa tragédia de Mariana. “Pode-se aprender com essa grande tragédia que a prevenção ainda é a melhor solução. O princípio da precaução existe para nortear essas ações. A impunidade deveria ser uma prática abolida”, afirma Andressa.
“Eu tenho certeza que essa tragédia tem que servir de exemplo para o estado de Minas, para o Brasil e para o mundo todo de que essas barragens têm que ter uma técnica diferente de segurar esses rejeitos”, avalia Carlos Eduardo.
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