Dia Mundial dos Migrantes e Refugiados foi celebrado neste domingo, 14; elencando desafios, Irmã Rosita comenta ainda mensagem do Papa para a ocasião
Kelen Galvan
Da Redação
O drama dos migrantes e refugiados foi recordado pela Igreja, em todo o mundo, neste domingo, 14. O Dia Mundial dos Migrantes e Refugiados é celebrado desde 1915 e já está na 104ª edição.
Por decisão do Papa Francisco, este foi o último ano em que a data foi celebrada em janeiro. A partir de 2019, o Dia Mundial dos Migrantes e refugiados será celebrado no segundo domingo de setembro.
Segundo dados da ONU, no mundo, existem 258 milhões de migrantes, o que representa 3% da população mundial. Neste total, estão inclusos 22,5 milhões de refugiados e refugiadas e 40,3 milhões de pessoas deslocadas forçosamente no interior dos próprios países, de acordo com relatório da ACNUR divulgado em 2017.
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No Brasil, segundo dados do Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH), há aproximadamente 1,2 milhão de imigrantes, são 10.141 mil refugiados e 31.505 solicitantes de refúgio, até 1º de novembro de 2017.
Na mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Migrantes e Refugiados, o Santo Padre reiterou a necessidade de “acolher, proteger, promover e integrar” estas pessoas forçadas a deixar sua própria Pátria.
Para a diretora do IMDH, Ir. Rosita Milesi, a Mensagem do Papa traz valiosas indicações sobre o agir conjunto para assegurar esses quatro aspectos indicados pelo Pontífice. Nesse sentido, ela enfatiza que no Brasil houve avanços quanto às estruturas ou políticas voltadas à acolhida e integração de migrantes e refugiados, porém, foram avanços modestos, e ainda há desafios.
“Sem dúvida vem à mente a falta de políticas públicas em muitas áreas, onde podemos nominar, por exemplo, a oferta de cursos gratuitos de português, com transporte para viabilizar a participação dos migrantes, a falta de cursos preparatórios para o mercado de trabalho brasileiro, as poucas oportunidades que os migrantes e refugiados têm de receber do Estado capacitação sobre legislação brasileira e acesso ao mercado laboral, a falta de instrumentos de informação e orientação produzidos em vários idiomas de modo que o público alvo possa compreender a mensagem, a inexistência de uma política de moradia e mesmo de abrigamento temporário, principalmente nos primeiros meses de chegada dos imigrantes e refugiados, a ainda pouca capacitação de agentes públicos para lidar com questões migratórias, enfim, há ainda um grande caminho a percorrer”.
Na mensagem, o Papa pede maior empenho tanto na concessão dos vistos humanitários e especiais, quanto na mediação para que os migrantes e refugiados possam se inserir no mercado de trabalho nos países que os acolhem.
Nesse aspecto, a religiosa diz que o visto e a autorização de residência, por razões humanitárias, estão previstos na atual legislação brasileira, entretanto, aguarda-se a emissão de normativa que regule a aplicabilidade prática do visto e dessa autorização de residência.
Irmã Milesi destaca que a inserção dos imigrantes no mercado de trabalho é um aspecto que merece especial atenção dada à importância de uma ocupação digna para a subsistência e integração destas pessoas e suas famílias. Ela lembra que várias instituições e ONGs, inclusive o IMDH, auxiliam os migrantes neste aspecto, com elaboração de currículos, capacitação, ajuda para obter a Carteira de Trabalho, etc. Contudo, o Brasil vive um momento de grandes dificuldades no mercado de trabalho e alto índice de desemprego.
“Esta realidade afeta tanto os nacionais quanto os imigrantes. Estes, no entanto, frente a uma situação de desemprego, não tendo nenhuma alternativa além do próprio salário, quando este lhes falta, acabam tendo que encetar outro processo migratório para buscar sustento em outros países. Muitos haitianos já partiram”, enfatiza a diretora do IMDH.
Migrantes, refugiados e a segurança nacional
Um ponto delicado na acolhida aos migrantes e refugiados é a preocupação quanto à segurança nacional. Na mensagem, Francisco indica que a centralidade da pessoa humana obriga-nos a antepor a segurança pessoal à nacional, e sugere investir na formação das pessoas que fazem o controle de fronteira.
A especialista afirma que, embora tal preocupação exista, ela não se justifica, e cita estudos que mostram que, em geral, os migrantes são mais vítimas da criminalidade do que autores.
“Já no inicio dos anos 2000, estudos do americano Robert J. Sampson, pesquisador e professor da Universidade de Harvard, apontavam que comunidades onde a concentração de imigrantes é maior tendem a ser mais seguras que outras com características semelhantes e com menos imigrantes. Mais recentemente, em 2015, um estudo publicado por vários pesquisadores da Universidade de Búfalo nos Estados Unidos, que pesquisaram a relação entre imigração e criminalidade no país entre 1970 e 2010 concluiu que a imigração não aumenta a criminalidade. Não há fundamento para esta alegação de criminalidade”.
O papel de cada um
Para atender o pedido do Papa Francisco de que a Igreja, de forma geral, se comprometa na acolhida, proteção, integração e promoção dos migrantes e refugiados, Irmã Milesi destaca que cada pessoa pode encontrar oportunidades e espaços para envolver-se e viver esta “realidade bem próxima” dos dias atuais.
“Há sempre um espaço onde todos e onde cada um/a pode atuar em favor da causa ampla e humanitária das migrações e do refúgio: podemos ser uma força viva e positiva na dimensão pessoal, comunitária, institucional, no contexto da empresa onde trabalhamos, no mercado e na rua por onde transitamos, no clube, na praça ou no parque que frequentamos… é ampla a oportunidade que temos de combater a xenofobia, de evitar a rejeição e a discriminação dos migrantes e refugiados, de abrir espaço ao outro, de acolher de alma e coração sinceros estas pessoas que chegam em busca de uma oportunidade de vida, da fazer um gesto concreto de partilha, de elevar uma oração que difunda o espírito de fraternidade universal de família humana”, exemplifica.
A diretora do IMDH destaca que inspirados por sentimentos de compaixão, é possível fazer avançar a construção da paz, desejada por cada ser humano, seja migrante, refugiado, brasileiro ou brasileira. “Acima da nacionalidade, está a cidadania da dignidade inalienável de todos os membros da família humana”, concluiu.