Coluna

Padre analisa o tráfico humano na perspectiva sócio-política

Padre Mário Marcelo analisa a questão do tráfico humano destacando o papel da Igreja no combate à problemática

Padre Mário Marcelo Coelho, scj

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Padre Mário Marcelo / Foto: Divulgação

A Campanha da Fraternidade de 2014 traz para o debate o tráfico de pessoas. Com o tema “Fraternidade e Tráfico Humano”, tendo como lema-base a passagem bíblica de Gálatas 5, 1: “É para a liberdade que Cristo nos libertou”, tratará de um tema complexo e que deverá mobilizar toda a sociedade.

Diante da realidade do tráfico de pessoas, perguntamos: Que responsabilidade pode pedir a sociedade do nosso tempo? Como despertar as autoridades internacionais e nacionais, os poderes públicos e a sociedade em geral para o problema do tráfico de pessoas?  O tráfico de seres humanos atinge a todos nós por ser uma agressão à dignidade da pessoa humana criada à imagem e semelhança de Deus.

De nada nos servirá fazer um bom diagnóstico da situação atual naquilo que se refere ao tráfico de pessoas e um juízo correto das responsabilidades e compromissos da sociedade se não efetivarmos tudo em um projeto de ação executável.

No Brasil, temos a “Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas” (Decreto 6.347, de 8 de janeiro de 2008), cujos princípios norteadores são: prevenção, repressão ao tráfico de pessoas e atendimento às vítimas. A política de enfrentamento ao tráfico de pessoas busca articular diversos segmentos da sociedade civil com o fim de integração das ações voltadas à implementação de políticas públicas para combater este tipo de tráfico; promove o diálogo com os diversos órgãos que integram o poder público com projetos de enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil; tem como meta envolver e fortalecer os diversos setores da sociedade buscando a criação de redes organizadas de ação; suscita campanhas e mobilizações socioeducativas de enfrentamento ao tráfico de pessoas.

O tráfico de pessoa é a agressão e a violação dos direitos humanos, porque explora a pessoa humana, degrada sua dignidade, limita sua liberdade. É desrespeito aos direitos humanos, porque é fruto da desigualdade socioeconômica, da falta de educação, de poucas perspectivas de emprego e de realização pessoal, de serviços de saúde precárias e da luta diária pela sobrevivência.

Estabelecer uma política de ação contrária ao tráfico de pessoas é reconhecer e respeitar a dignidade de cada ser humano; não discriminar pessoas por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, raça, religião etc.; proteger e dar assistência integral às vítimas; promover e garantir a cidadania e os direitos humanos etc.

O Papa Francisco assim se referiu ao tráfico humano: “O tráfico de pessoas é uma atividade detestável, uma vergonha para as nossas sociedades que se dizem civilizadas”. O Documento de Aparecida afirma que “o tráfico humano é uma das questões sociais mais graves da atualidade” (cf. CELAM, Documento de Aparecida, 7a. Edição, 2008, n.73). O Texto Base da CF 2014 identifica as principais modalidades do tráfico humano mencionando entre outros: o tráfico para a exploração no trabalho; tráfico para a exploração sexual; tráfico para a extração de órgãos; tráfico de crianças e adolescentes etc.

Há uma necessidade de afrontar o problema do tráfico de pessoas com atitudes concretas, não aquela da violência, mas atitudes iluminadas pelos princípios da fé. Nossa atitude é, e deve ser sempre, de denunciar com coragem, franqueza (parresia: termo que quer dizer “liberdade de palavra” e “capacidade de exprimir-se sem medos”) toda ameaça contra a vida humana.

É responsabilidade de cada cristão anunciar e denunciar todo tipo de agressão à vida. Tudo o que fere a vida em sua dignidade deve ser excluído do nosso meio. A Igreja, a exemplo do Bom Pastor, se torna responsável de cuidar, proteger, curar, apascentar o povo e, de forma particular e exigente, os fracos, indefesos e sem cuidados. “Em bons pastos as apascentarei, e nos altos montes de Israel será o seu curral; deitar-se-ão ali num bom curral, e pastarão em pastos gordos nos montes de Israel. Eu mesmo apascentarei as minhas ovelhas, e eu as farei repousar, diz o Senhor Deus. A perdida buscarei, e a desgarrada tornarei a trazer; a quebrada ligarei, e a enferma fortalecerei; e a gorda e a forte vigiarei. Apascentá-las-ei com justiça” (Ez 34,14-16).

Numa atitude de fidelidade, o cristão tem o compromisso vindo do próprio Cristo de defender toda a criação e, de modo especial, a vida humana, sobretudo quando é desrespeitada.

A missão da Igreja se torna mais urgente e necessária para com os mais pobres e indefesos, aqueles que na sua vulnerabilidade ou inocência são continuamente ameaçados em seu direito de viver. A Igreja, conhecedora do projeto divino e consciente de sua missão, assume o compromisso de defender a vida que é ferida, agredida por uma sociedade que a ameaça.

Diante de Deus e da humanidade, a Igreja, mesmo sendo ridicularizada por muitos setores da sociedade, não pode se omitir, ela tem que ter uma atitude profética, ainda que seja no deserto, de defender, promover e respeitar a vida de cada pessoa criada à imagem e semelhança de Deus.

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