Artigo - Dom Odilo

Os violentos terão lugar com Deus?

São Paulo está sofrendo os efeitos de uma escalada de violência chocante. Já virou rotina, toda manhã, com as primeiras notícias do dia, conhecer o balanço dos assassinatos da noite anterior. Mata-se, sobretudo, na calada da noite, uma vez que é um ato condenável.

Tristes notícias de sangue e dor. A violência mais radical consiste em tirar a vida de pessoas, inocentes ou não.

E não se mata somente no município de São Paulo, mas em todas as cidades da área metropolitana, de Santa Isabel a Santana do Parnaíba, de Caieiras às cidades do ABC. Talvez agora nos demos conta mais exatamente daquilo que já vinha acontecendo há muito tempo, mas ninguém observava que em toda a área da grande São Paulo morriam todos os dias cerca de dez pessoas por assassinato!

E não é de hoje que se sabe das situações explosivas em que vivem vastas áreas da metrópole, com insuficiente presença e ação do Estado, com um excesso de problemas sociais a resolver, abandonadas ao mundo do crime, que alicia e envolve inteiras populações. Era previsível que isso teria consequências. Há uma necessidade imensa de investimentos nas extensas periferias pobres de nossa área metropolitana.

Enquanto isso, continuam a morrer pessoas cada dia; entre elas, muitos jovens, pessoas inocentes que acabam pagando pelo simples fato de estarem no lugar errado e na hora errada. Soldados morrem pelo fato de serem soldados. E tantas famílias sofrem! Até quando isso vai durar? A violência só gera um círculo vicioso de violência, ódio e sofrimento. Ela não é a solução para as diferenças.

A violência sistemática é sintoma de uma crise cultural e civilizatória grave, em que se obscureceram ou se perderam valores essenciais do convívio humano, como o senso da honestidade e da justiça, e o respeito pela dignidade da pessoa e seus direitos mais fundamentais, sobretudo à integridade física e à vida. A vida de uma pessoa está valendo muito pouco, mata-se por motivos fúteis, ou mesmo sem motivos.

A perda ou falta de valores e suas consequências só podem ser corrigidas mediante a proposta de valores verdadeiros. Está bem na hora de manifestarmos novamente bem forte, para toda a cidade ouvir, a advertência da Lei de Deus: “não matarás!” Quem matar seu próximo deverá dar contas disso a Deus. E mesmo se alguém disser – “eu não creio em Deus e não preciso me preocupar com isso” – nada muda. Não crer nem reconhecer a Deus não tira a existência de Deus. Deus continua existindo e cada um, crente ou não, deverá dar contas a Deus sobre sua vida e seus atos.

O Evangelho obriga-nos a estar do lado dos não violentos e a sermos promotores da paz. Duas bem-aventuranças devem ser recordadas sempre: “felizes os mansos, pois eles possuirão a terra; felizes os que promovem a paz, pois serão chamados filhos de Deus!”. Os prepotentes e violentos terão sua conduta reprovada e seus projetos serão frustrados; os valentões não triunfarão, mas os mansos e não violentos. Ao mesmo tempo, os promotores da paz têm uma bela promessa: terão lugar perto de Deus e serão reconhecidos como “filhos” pelo Deus da Paz; ao invés disso, como lembra São Paulo, os violentos não entrarão no céu. Junto de Deus não há lugar para os violentos.

A sensibilização das consciências faz parte da educação para a paz. E o anúncio do Evangelho de Cristo, mediante a ajuda do Espírito Santo, pode mover à conversão também os espíritos violentos.

Cardeal Odilo Pedro Scherer

Arcebispo de São Paulo

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