Relatório da ONU alerta sobre mudanças extremas de temperatura registradas nos últimos meses, que reforçam o caráter urgente dos cuidados com a Casa Comum
Thiago Coutinho
Da redação
Na Europa e no Canadá, recordes de calor. No sul da Itália, os termômetros chegaram a registrar 48,8°C; no Canadá, quase 50°C. No Brasil, por outro lado, uma onda de frio com características polares destruiu lavouras. Em várias cidades de São Paulo, os termômetros chegaram a ficar abaixo de zero.
No início deste mês, o IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU) divulgou um relatório em que afirma: se o mundo e os governantes não pararem, estes fenômenos extremos ligados à temperatura só vão piorar.
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O documento foi assinado por 234 autores de 65 países. “A mensagem clara do relatório é que as recentes mudanças observadas são generalizadas e têm se mostrado mais intensas. Além disso, a influência humana é incontestável e modifica o sistema climático”, explica Lincoln Alves, cientista que atua junto ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Para o especialista, estes eventos em várias partes do mundo não são ocasionais. “São sinais das mudanças climáticas que estão acontecendo”, afirma. Ele destaca a necessidade de os governantes investirem em políticas públicas, especialmente naquelas que visam à diminuição dos gases que causam o efeito estufa. “Medidas que possam mitigar e reduzir as taxas de emissões de cada país”, pondera Alves.
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Laudato sì e a Pastoral da Ecologia
A Igreja Católica também está atenta a esses fenômenos, uma atenção que se materializa mais recentemente na encíclica Laudato sì, do Papa Francisco. O documento foi publicado há seis anos e reflete sobre o cuidado da Casa Comum. Por ocasião do aniversário de cinco anos, o Pontífice instituiu o Ano Laudato sì, que terminou em maio passado e culminou no lançamento da Plataforma de Ação Laudato sì.
“A Laudato Si’ integra a visão da Igreja sobre o enfrentamento das mazelas sociais afirmando que as consequências dos desastres ambientais, embora sentidas por todos, afetam especialmente os mais pobres. A Igreja, mãe e mestra, propõe a todos a conversão ecológica, ou seja, uma mudança de rumo, de direção, em relação ao cuidado com o meio ambiente”. Quem afirma é o vice-coordenador da Pastoral da Ecologia do Regional Sul 1 da CNBB, Luciano Rodolfo de Moura Machado.
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Machado é Educador Ambiental na cidade de São José dos Campos (SP). Ele destaca que a Pastoral da Ecologia tem a missão de fazer com que a comunidade católica e a sociedade entendam esta situação, suas causas e efeitos e acrescenta ainda a elaboração de propostas de ação.
“Seja no nosso comprometimento pessoal, comunitário ou para as mudanças estruturais da sociedade, pressionando os governantes a tomarem decisões que busquem o cumprimento dos acordos internacionais para a redução da emissão destes gases, reduzindo as mudanças no clima e protegendo a vida na Terra”, observou.
O educador ambiental salienta que os fiéis podem contribuir muito para a conscientização ambiental e mudança de atitudes. “A catequese pode incluir no temário de seus encontros reflexões sobre a Laudato Si’, ao mesmo tempo em que pode estimular que os pais, quando possível, levem seus filhos a pé ou de bicicleta à Igreja, já que a combustão dos carros emitem gases de efeito estufa. Refletir o motivo da queima das florestas e qual o papel do governo nesta questão e no direcionamento das políticas ambientais”, sugere.
Energias renováveis
Um dos efeitos das mudanças climáticas é a alteração no regime de chuvas, o que traz impactos também do ponto de vista energético. No Brasil, por exemplo, com a falta de chuvas, os reservatórios das hidrelétricas estão trabalhando no limite. O resultado são contas mais caras e até medidas restritivas para consumidores e a indústria.
O uso de fontes de energia renovável, como a eólica ou a solar, seria uma saída para este problema. “De fato, o uso de energias renováveis no Brasil já até ganhou certo protagonismo. A taxa de crescimento dessas energias já cresceu bastante, mas é importante se criar incentivo para o uso dessas fontes alternativas. Apesar da matriz energética brasileira ser renovável, já que são recursos hídricos, tornam-se vulneráveis com este fenômenos extremos, como as secas”, pondera o cientista do INPE.
O Acordo de Paris
Assinado em dezembro de 2015 e ratificado em 2016, o Acordo de Paris é um tratado mundial com um único objetivo: fazer com que o aquecimento global diminua. O documento foi deliberado entre 195 países. Desses, 55 que representam a metade das nações responsáveis pela emissão de gases que causam o efeito estufa, precisam segui-lo. O Brasil é um dos signatários.
Uma das metas deste acordo é limitar o aumento da temperatura em até 1,5°C. “O relatório da ONU já aponta que estamos em 1,1°C. Nas próximas décadas, se continuarmos nesta trajetória que seguimos, em pouco mais de 20 ou 30 anos, o acordo já será atingido. Meio grau de aquecimento já mostra a intensidade destes eventos extremos, como vemos nas secas agrícolas”, aponta o cientista climático.
Para o educador ambiental e vice-coordenador da Pastoral da Ecologia, é imprescindível que os fiéis estejam atentos à realidade que os cerca. “Entender como a ação humana é responsável pela degradação ambiental e que a omissão é um pecado grave diante das injustiças. Uma ação transformadora é alimentada por uma espiritualidade que é também ecológica”, afirma.