Especialista afirma que nada é capaz de retirar dimensão religiosa do coração do ser humano
Pe. Antonio Aparecido Alves*
O ser humano, orientado para Deus
A Doutrina Social da Igreja afirma que a pessoa tem uma dignidade inviolável não somente por motivos filosóficos ou éticos, mas especialmente porque foi criada à imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26), tendo assim uma fundamentação teológica, no valor transcendente da Pessoa.
Isto significa que ela está orientada para Deus, como diz a célebre oração de Santo Agostinho, com a qual ele abre suas Confissões: “Senhor, criaste-nos para Ti e o nosso coração vive inquieto enquanto não repousar em Ti” (1,1). Aliás, é deste Santo a afirmação de que, dentre todas as criaturas, somente o ser humano é capax Dei, isto é, tem a capacidade de acolher Deus e participar de Sua vida.
O ensinamento da Igreja
O magistério recente tem reafirmado esta fé. A Constituição Pastoral Gaudium et Spes (1965) em seus primeiros parágrafos, fala da sublime vocação do ser humano e evidencia que existe nele uma semente divina (GS 3) que o torna especial entre todas as criaturas.
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A mesma Constituição, ao tratar do fenômeno do ateísmo, reputado como sendo um dos fatos mais graves daquele tempo, afirma que a razão mais profunda da dignidade humana é essa sua vocação de união com Deus (GS 19).
Mais próximo de nós, o Catecismo da Igreja Católica (1992) retoma estes ensinamentos, ao afirmar que o desejo de Deus está inscrito no coração humano (CIC 27). Por sua vez, o Compêndio de Doutrina Social da Igreja (2004), ao abordar em seu capítulo III a dignidade humana e seus diversos perfis, vem realçar essa capacidade de abertura do ser humano ao infinito, isto é, a Deus, porque tende naturalmente para Ele (CDSI 130).
O fenômeno do ateísmo
O ser humano é naturalmente religioso, isto é, tende a algo que está para além dele, como observamos em todas as culturas. Desde os tempos mais remotos temos testemunhos dessa religiosidade, seja no culto aos mortos, aos deuses da família e da tribo ou aos elementos da natureza, sendo esta uma dimensão que se encontra somente entre os humanos, não sendo observável em outras criaturas.
O Concílio Vaticano II entende o fenômeno do ateísmo como sendo próprio de nosso tempo, sem precedentes na história universal. Este foi entendido pelo Concílio de diversas formas: como total negação de Deus, ou então como afirmação de que não se pode conhecer nada sobre Ele, ou ainda como sendo Deus algo desnecessário e suplantado pela ciência, bem como uma forma de protesto contra a religião e o mal no mundo. Com humildade, a Igreja afirma que os crentes podem ter tido uma parcela de culpa na gênese do ateísmo por ofuscarem, mais do que revelarem o verdadeiro rosto de Deus e da religião (GS 19).
O laicismo contemporâneo
A sociedade moderna não foi capaz de retirar esta dimensão religiosa do coração do ser humano, embora tenha tentado de diversas formas. Por isso, agora tende a reduzi-la ao âmbito privado, impedindo a sua manifestação pública, com base na afirmação de que o Estado é laico. Esta é uma verdade, isto é, o Estado não pode estar vinculado a uma determinada religião, mas deve garantir a liberdade religiosa de todos, pois o povo é religioso.
Promover e garantir esta dimensão religiosa do ser humano não é alheio à função do Estado, como querem os fautores do laicismo, mas sim uma forma sublime de reconhecer a sua eminente dignidade.
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*Padre Antonio Aparecido Alves é Mestre em Ciências Sociais com especialização em Doutrina Social da Igreja pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma e Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Professor na Faculdade Católica de São José dos Campos e Pároco na Paróquia São Benedito do Alto da Ponte em São José dos Campos (SP). Para conhecer mais sobre Doutrina Social visite o Blog: www.caminhosevidas.com.br