Doutor em Educação, padre Edson Donizetti Castilho acredita que esta é a chave para que as transformações sociais aconteçam e a violência juvenil diminua
Thiago Coutinho, com colaboração de Jéssica Marçal
Da Redação
A Campanha da Fraternidade deste ano traz como tema “Fraternidade e superação da violência” e o lema “Em Cristo somos todos irmãos (Mt 23,8)”. Entre as várias formas de violência a ser combatida está a violência juvenil. O caminho, segundo o padre salesiano Edson Donizetti Castilho, reitor do Santuário Dom Bosco, em Lorena (SP), está na educação.
Os dados referentes a essa realidade não são animadores. No Brasil, entre 2005 e 2015 foram mais de 318 mil assassinatos contra pessoas jovens; só em 2015, foram 31.264 homicídios de pessoas com idade entre 15 e 29 anos segundo o Atlas da Violência 2017, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
“Esta proposta da Igreja para que possamos refletir sobre a questão da violência durante a Quaresma é muito importante”, afirma padre Edson. Para ele, a disseminação da “indústria” que fomenta o uso de drogas, bebidas ou armas de fogo é tão ou mais organizada do que se pode imaginar. “Jesus, no Evangelho, diz que os filhos das trevas são mais inteligentes e bem articulados do que aqueles que querem propor a paz. É triste ver que nossa juventude é tão maltratada desta forma”, disse.
Mestre e doutor em educação, padre Edson não tem dúvidas de que a educação é fundamental para que esses jovens não se tornem estatísticas no Atlas da Violência e de outros índices.
Para ratificar isso, o sacerdote se recorda de um encontro que teve com o argentino Adolfo Pérez Esquivel, arquiteto, escultor e ativista de direitos humanos, que conquistou o Nobel da Paz de 1980. “Ele foi preso político e torturado e perguntei a ele: ‘são muitas as pessoas que entendem que as transformações sociais que desejamos passam pela luta armada, pela revolução, pela guerra civil. O senhor é partidário desta perspectiva?’. Ele respondeu simplesmente e claro: ‘não, experimentei na pele a violência e não quero para ninguém isso’. E aí a pergunta: ‘qual seria o caminho?’. E ele respondeu: ‘o caminho para as transformações que tanto desejamos e precisamos é a educação’”, recordou.
Tradição salesiana
A congregação salesiana tem em seu cerne o cuidado com os jovens. Dom Bosco, seu patrono, dedicou a vida a cuidar dos mais frágeis e entendia que a educação era a peça-chave para que não se perdessem no mundo. O santo compreendeu que a educação era o pilar fundamental para que esses jovens pudessem criar mecanismos de sobrevivência que não fossem meros paliativos.
“Os primeiros meninos batiam à porta de Dom Bosco que os acolhia. A primeira intuição que ele teve foi qualificar esses jovens, oferecer condições a eles pela educação, pela profissionalização, pela aquisição de competências e habilidades para que eles pudessem por si mesmos resolver seus problemas e sanar suas demandas”, conta padre Edson.
À frente de seu tempo, Dom Bosco criou as escolas profissionalizantes ― as oficinas profissionalizantes como eram conhecidas à época, nas quais formava profissionais como ferreiros, sapateiros e alfaiates, comuns naquele tempo. “As propostas de Dom Bosco eram calcadas em valores”, afirma o padre. “Esses valores devem ser inseridos de forma afetiva e o momento social que vivemos não favorece isto, porque vemos pessoas de extrema relevância social e política que são um mau exemplo às pessoas. Se os valores, assim como acreditava Dom Bosco, são assimilados de forma afetiva, cai naquele velho ditado: a palavra move, mas o exemplo arrasta”, pondera.
Inspiração
O exemplo de Dom Bosco inspira os jovens até hoje ― inclusive aqueles que querem ajudar o próximo. É o caso de Valesca Montenegro, que integra a equipe de comunicação nacional do Jovens Conectados, o site da Comissão da CNBB para a juventude. Ela trabalha em um centro para crianças e adolescentes num projeto social das redes salesianas que recebe menores da zona sul de São Paulo que estão em situação de vulnerabilidade social e diariamente enfrentam problemas com a violência, o tráfico e a desvalorização da família.
“Fazemos um trabalho de fortalecimento dos vínculos entre eles e as famílias por meio de reuniões comunitárias”, explica Valesca. “Em muitos casos, os pais são inexistentes e as mães são as chefes da família. Essas crianças vêm nos procurar porque querem se sentir amparadas, ouvidas. Muitas vezes, um abraço já resolve muita coisa”, reitera.
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Mas o trabalho da voluntária não para por aí. Além de todo o apoio moral, Valesca explica que o projeto ampara as crianças com oficinas de arte, dança, música e esporte. “Desta forma, elas se sentem valorizadas e capazes de fazer algo e possivelmente podem mudar a realidade em que se encontram”, assegura. “É um trabalho de formiguinha, mas graças ao serviço que presto à Pastoral Juvenil aprendi concretamente a ver a beleza da diversidade e ser o amor de Deus onde estou”, acrescenta a voluntária.
Nas palavras do padre Edson, há exemplos concretos de que problemas de delinquência juvenil foram superados quando a educação é posta em prática. Ele finaliza destacando o exemplo de perseverança de Dom Bosco. “Os grandes homens e mulheres da história se tornaram grandes porque em algum momento eles se decidiram fazer diferente, como o próprio Dom Bosco. Ele foi perseguido, injustiçado, mas perseverou no bem”, finaliza.