Em discurso

Dom Vicente expõe na ONU problemática da mineração do Brasil

Dom Vicente falou sobre as graves consequências da mineração e lembrou que muitas outras estão em risco

Da redação, com Arquidiocese de BH

Frei Rodrigo Peret e Dom Vicente Ferreira na ONU / Foto: Arquidiocese de BH

O membro da Comissão Especial para a Ecologia Integral e Mineração da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Vicente de Paula Ferreira, bispo auxiliar de Belo Horizonte, fez um discurso, nesta segunda-feira, 2, na 43ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização para as Nações Unidas (ONU) sobre o meio ambiente.

Desde o dia 25 de fevereiro até 11 de março, o bispo cumpre uma agenda na Europa, que incluiu uma visita ao Papa Francisco, na última sexta-feira, 28.

Em seu discurso à ONU, Dom Vicente contestou o relatório das Nações Unidas que considera boas as práticas do Brasil na preservação do meio ambiente.

Ele destacou que as populações não são consultadas no processo de licenciamento para a implantação de megaprojetos e pediu que o governo do Brasil ratifique o Acordo de Escazú, fornecendo informações, consultas e participação suficientes das comunidades e da sociedade nos processos de licenciamento.

Dom Vicente ressaltou também que os rompimentos das barragens em Brumadinho – há um ano – e em Mariana, há cinco anos – continuam produzindo efeitos nocivos nas comunidades e no meio ambiente, nada tendo sido feito para impedir outros eventos semelhantes.

Leia, abaixo, o discurso na íntegra:

Diálogo interativo com o relator especial sobre direitos humanos e meio ambiente
Março 2, 2020
Pronunciado por: Vicente de Paula Ferreira
Obrigado Sr. Vice-Presidente,

Congratulamo-nos com o relatório do relator especial, Sr. Boyle. Também concordamos que proteger o meio ambiente contribui para o cumprimento dos direitos humanos e isso contribui para salvaguardar nossa casa comum.

Embora o Brasil tenha sido listado no seu relatório como um exemplo de boas práticas, a realidade difere do que o país possui em sua legislação, particularmente no acesso a informações ambientais. As comunidades geralmente não são consultadas quando da concessão de licenças para megaprojetos ou essas licenças são concedidas sem seguir o procedimento legal.

Nesse sentido, pedimos ao governo do Brasil que ratifique o Acordo de Escazú* e forneça informações, consultas e participação suficientes das comunidades e da sociedade civil no processo de licenciamento de megaprojetos, principalmente de mineradoras.

Faz um ano desde a quebra da barragem de rejeitos em Brumadinho e cinco anos desde Mariana. Até agora, os dois desastres continuam produzindo efeitos nocivos nas comunidades e no meio ambiente locais e nada foi feito para impedir eventos semelhantes. Somente no estado de Minas Gerais, existem pelo menos 40 barragens com risco de colapso e grande risco de possíveis danos.

Não será possível realizar progressivamente o direito a um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável no Brasil se o governo não assumir suas obrigações internacionais, inclusive ao prevenir e garantir que as empresas sejam responsabilizadas e ao combater a impunidade como um impedimento para evitar que desastres criminosos aconteçam de novo e de novo.

Obrigado, Sr. Vice-Presidente,

*O Acordo de Escazú é o primeiro tratado ambiental de direitos humanos na América Latina e no Caribe. Foi aprovado em março de 2018 após uma negociação que durou cerca de seis anos. Desenvolve o Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992 sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que visa garantir o acesso à informação, a participação do cidadão e o acesso à justiça em questões ambientais. O Acordo de Escazú desenvolve esses três direitos e visa promover uma melhor governança dos recursos naturais na região. Vinte e quatro estados aprovaram seu texto final em março de 2018, uma cidade costarriquenha de Escazú, onde foi realizada a última das nove reuniões do Comitê de Negociação. O Brasil assinou, contundo não ratificou, o que o torna ineficaz, no país.

O Acordo de Escazú incorpora vários elementos inovadores. Primeiro, possui uma disposição específica sobre defensores de direitos humanos ambientais (DRHs) sem precedentes na região. Segundo, consagra uma abordagem baseada em direitos aos povos indígenas e populações vulneráveis, com disposições para favorecer o acesso à informação, a participação e o acesso à justiça por esses grupos. Terceiro, também responde ao espírito dos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Negócios e Direitos Humanos em relação às obrigações específicas das empresas de respeitar os direitos humanos no contexto de suas atividades.

43ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU / Foto: Arquidiocese de BH

Agenda na Europa

Na companhia de Dom Vicente, integram a comitiva de compromissos na Europa, o frei franciscano Rodrigo Peret, da Rede Igrejas e Mineração da Arquidiocese de Belo Horizonte e o padre Dario Bossi, missionário italiano provincial dos combonianos no Brasil, membro da Comissão de Ecologia Integral da CNBB.

Segundo os organizadores da viagem, trata-se de uma agenda para tratar da incidência e do trabalho que a Igreja Católica vem realizando após os impactos advindos do rompimento da barragem de Brumadinho em 25 de janeiro de 2019.

O rompimento da barragem é considerado como o maior desastre ambiental da mineração no Brasil. A barragem de rejeitos, cuja designação oficial era barragem da Mina do Feijão, classificada como de “baixo risco” e “alto potencial de danos”, era controlada pela Vale S.A. e estava localizada no ribeirão Ferro-Carvão, na região de Córrego do Feijão, no município brasileiro de Brumadinho, a 65 km de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

O rompimento resultou em um desastre de grandes proporções, considerado como um desastre industrial, humanitário e ambiental, com 259 mortos e 11 desaparecidos. O desastre pode ainda ser considerado o segundo maior desastre industrial do século e o maior acidente de trabalho do Brasil.

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