Brasil é o segundo país no mundo com maior número de casos de hanseníase; cura é possível com o diagnóstico precoce
Thiago Coutinho
Da redação
A Hanseníase é considerada, segundo especialistas, uma das doenças mais antigas da história da humanidade. Em todo o mundo, o Brasil ocupa o segundo lugar do país com mais vítimas da doença, perdendo apenas para a Índia, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) . O índice de cura, porém, é alto, especialmente quando a doença é descoberta em seus estágios iniciais.
No último domingo do mês de janeiro, celebra-se o Dia Mundial contra a Hanseníase. E no Brasil, o cuidado com a doença é lembrado por meio da campanha Janeiro Roxo.
“Trata-se de uma doença infectocontagiosa transmitida por uma bactéria chamada Mycobacterium leprae. A maioria da pessoa, dos seres humanos, é bastante resistente à doença. Quando entram em contato com ela, conseguem desenvolver imunidade e se tornam resistente à ela”, explica a médica Sandra Durães, coordenadora do departamento de Hanseníase da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). “Mas um pequeno percentual de pessoas pode adoecer”, reitera.
Como a hanseníase se manifesta
Esta bactéria, Mycobacterium leprae, tem predileção pela pele e nervos periféricos. Quando chega à pele, apresenta-se por meio de manchas de cor vermelha, rosa ou brancas. “Podem surgir ainda caroços na pele e infiltrações, que são áreas vermelhas elevadas. Estas lesões têm como característica fundamental alguma alteração na sensibilidade, seja ao frio, ao calor, dor ou tato. Geralmente, são áreas que os pacientes dizem sentir dormentes, que apresentam formigamento”, detalha a especialista.
Outros sintomas relacionados à doença incluem perda de pelos das sobrancelhas, sensação de nariz entupido e diminuição da sensibilidade das forças dos pés e nas mãos. “Isso acontece justamente pelo acometimento dos nervos periféricos”, esclarece Sandra. “A pele está acometida em 90% a 95% dos casos da Hanseníase. Em alguns poucos casos, pode haver apenas as lesões dos nervos periféricos”, afirma.
Maioria é resistente
Como dito no início, a maior parte da população é resistente à doença. No entanto, em pessoas suscetíveis, a Hanseníase se apresenta de formas distintas. “Temos, assim, dois tipos básicos de pacientes: aqueles com uma ótima resistência, poucas lesões na pele e com poucos nervos periféricos atingidos e pouca carga bacilar. E não são contagiantes. São os paciente paucibacilares”, esclarece a médica. E há o oposto, que são os pacientes com grande carga bacilar e diversas lesões na pele e nos demais nervos periféricos.
O tratamento para ambos é diferente. Naqueles com poucas lesões, o tratamento dura em média seis meses, administrado com antibióticos. “Já os com grande carga bacilar, o tratamento dura doze meses, feito nos postos de saúde, com visita mensal e determinada medicação. Os demais remédios são tomados em casa”, diz Sandra.
Esse tratamento é fornecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) de forma gratuita.
Uma doença histórica
A Hanseníase é tida como uma das doenças mais antigas do mundo. De acordo com a Biblioteca Virtual em Saúde, gerida pelo Ministério da Saúde, há relatos de que a moléstia já existia por volta de 6 a.C. Especialistas acreditam que tenha surgido Oriente e, de lá, tenha atingido outras partes do mundo por tribos nômades ou navegadores.
“É uma doença bíblica que carrega um grande estigma pelo seu alto potencial em causar incapacidades e deformidades físicas, especialmente por conta das lesões nos nervos periféricos”, avalia Sandra Durães.
“A partir do momento que o paciente não tem a capacidade de sentir o calor de uma panela quente ou uma pedra no sapato, ele vai se lesionar. Essa queimadura pode causar uma infecção, que pode chegar ao osso e isso causar uma osteomelite e a perda das extremidades dos dedos dos pés e das mãos”.
Tratamento da hanseníase
A cura se dá por meio de antibióticos. Uma vez ingeridos e administrados de maneira correta, o paciente se torna livre da doença e também não infecciona mais outras pessoas.
Por outro lado, o tratamento por meio de antibióticos não tem a capacidade de reverter o dano neural. “Muitas vezes o paciente chega para o tratamento com muitas alterações na sensibilidade e motoras. E essas alterações não são revertidas com o tratamento com antibiótico. Por isso, é crucial o diagnóstico precoce: quanto mais rapidamente o tratamento é instituído, menos sequelas o paciente terá”, assevera a médica.
Além disso, o tratamento atual dispensa que os doentes fiquem reclusos da sociedade — como era comum no passado. “Hoje o tratamento é muito mais eficaz e isso não é mais necessário. A partir do momento em que o paciente começa a ser tratado, com a primeira dose, ele já se torna não-contagiante. Não é necessário separar talheres, separar de casa ou quarto. Nada disso é necessário”, assegura Sandra Durães.
No entanto, as pessoas que estiveram próximas ao portador da doença antes do tratamento, precisam ser examinadas. “Para ver se não existe nenhum tipo de lesão que não notaram. Além disso, recebem uma dose da vacina BCG, a mesma utilizada na prevenção da tuberculose. Ela não impede que a doença surja, mas diminui esta possibilidade”, acrescenta.
O tempo de incubação da Hanseníase é bem longo. Ou seja, quando em contato com alguma pessoa infectada, se estiver suscetível ao vírus, a doença só se manifestará entre três e sete anos — ou até mais. “Por isso, as pessoas que tiveram contato com pacientes com Hanseníase, além do exame físico para identificar lesões precoces da doença e tomarem a vacina BCG, devem ser esclarecidas sobre este fato e ficar atentas a sinais da doença”, finaliza Sandra.